Estudo do meio ambiente e consequente transformação do direito de propriedade que após a Constituição Federal

Introdução

O Registro de Imóveis é uma instituição que surgiu como necessidade do Estado de controlar o direito de propriedade e como instrumento de segurança jurídica para o tráfego imobiliário. Em razão da evolução do estudo do meio ambiente e consequente transformação do direito de propriedade que após a Constituição Federal (CF) deve atender uma função social, tornou-se necessário também estudar essa nova característica do registro imobiliário brasileiro, principalmente na necessidade de sua adaptação às normas protetoras do meio ambiente e utilização de sua estrutura para tal finalidade.

Entendemos que a evolução do conceito de direito de propriedade atingiu e influenciou o sistema de transmissão da propriedade não somente no direito brasileiro, mas em todo o mundo. A influência da função social ao direito de propriedade é inegável; o exercício que era absoluto agora cede lugar ao cumprimento de uma função, e os aspectos decorrentes de obrigações urbanísticas e ambientais tornaram-se tão importantes quanto a própria propriedade.

A preocupação no estudo da possibilidade de utilizar a publicidade registrária também para questões ligadas à preservação do meio ambiente começou a ganhar notoriedade com o Expert córner report publicado em 1 de outubro de 2002, denominado El Registro de la Propriedad y Mercantil como instrumento al servicio de la sostenibilidad realizado pelo Colégio de Registradores da Espanha para a Agência Européia de Meio Ambiente”.[3]

No Brasil, vivemos situações de contraste, diversos espaços ecologicamente relevantes possuem publicidade registral há muitos anos, servindo como exemplo típico a reserva florestal legal. Concomitantemente, a publicidade registral é abandonada em outros segmentos, conferindo-se importância a outros meios de publicidade claramente débeis.

A função ambiental do Registro de Imóveis agora com a edição da Lei n. 12.651/2012 (novo Código Florestal) ganha uma importância das mais relevantes porque deve se comunicar com Cadastro Ambiental Rural – CAR e conferir publicidade para todos dos espaços protegidos, em especial da reserva florestal legal.

Mas a função ambiental do Registro de Imóveis não está circunscrita aos espaços ambientalmente protegidos, hodiernamente confere publicidade de áreas contaminadas e exige o licenciamento ambiental em todo o momento que registra atos que noticiam qualquer fonte de poluição, em especial os empreendimentos imobiliários.

O estudo da publicidade ambiental no Registro de Imóveis data de mais de uma década, já que o encontro nacional do IRIB em Alagoas de 2004 pode ser considerado um marco porque no evento referida função ambiental do registro foi exposta de forma compilada e direta por nós. Nós registradores de imóveis, como guardiões da propriedade, nos transformamos também – mesmos que reflexamente – em protetores do meio ambiente e aprendemos a nos orgulhar de espelhar todas as funções da propriedade imobiliária, em especial a ambiental, para a sociedade com eficiência, simplicidade e clareza.

É preocupação central do nosso estudo não adentrarmos de forma específica em questões de direito ambiental, colhendo apenas os conceitos necessários e essenciais para estudar a comunicação entre os subsistemas ambiental e registral. A comunicação do direito ambiental com o direito registral utiliza como ponto em comum a propriedade imobiliária, através dessa matriz o fluxo de informações deve se pautar. 

1 Meio Ambiente

1.1 Conceito

O estudo do meio ambiente é recente na civilização moderna, trata-se da primeira categoria de interesses metaindividuais a merecer atenção especial da sociedade; por consequência, do legislador pátrio. Durante sua existência, o homem não possuía a preocupação com os recursos naturais em razão da abundância desses.

Constatado o aumento da população mundial ocorrido em escala acelerada, mormente nos países do terceiro mundo, começou-se a perceber que o crescimento da população trazia consequências sérias às reservas de recursos naturais. Percebe-se, assim, que a preocupação com o meio ambiente surgiu como reação à devastação das reservas naturais, sentimento não conhecido pelo homem, mesmo porque isso ocorreu de forma mais acentuada no século XIX.

O alerta para a gravidade desses riscos foi dado em 1972, em Estocolmo, na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano promovida pela ONU e contando com a participação de 114 países. É notória também a preocupação do legislador brasileiro na época, em razão da elaboração dos Códigos Florestal (Lei Federal 4.771/65), de Caça (Lei 5.197/67), de Pesca (Dec.-lei 221/67) e de Mineração (Dec.-lei 227/67). A chamada Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei Federal 6.938, de 31 de agosto de 1981), em seu art. 3º, I, conceituou meio ambiente como “o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”.

A expressão meio ambiente contém sem dúvida um pleonasmo. Meio e ambiente são sinônimos porque “meio” é exatamente aquilo que envolve, ou seja, o “ambiente”, daí a razão de Paulo Affonso Lemes Machado, embora reconheça sua sonoridade, prefira utilizar a rubrica de Direito Ambiental em vez de Direito do Meio Ambiente. O conceito que mais nos agrada pela capacidade de síntese é o de Tycho Brahe Fernandes Neto. Ensina o professor que direito ambiental é o “conjunto de normas e princípios editados objetivando a manutenção de um perfeito equilíbrio nas relações do homem com o meio ambiente”. [4]

Ressalte-se, assim, a amplitude do conceito, o que levou a doutrina a subdividir em três o estudo do meio ambiente ou direito ambiental, denominando-os naturalartificial e cultural. Meio ambiente natural é o constituído pelo solo, pela água, pelo ar atmosférico, pela fauna e pela flora. Meio ambiente artificial é o ligado pelas edificações, equipamentos urbanos e comunitários, aproximando-se muito do direito urbanístico. Finalmente, o meio ambiente cultural é aquele integrado pelo patrimônio arqueológico, artístico, histórico, paisagístico e turístico. Interessa-nos, neste estudo, principalmente o meio ambiente natural e sua ligação com a propriedade imobiliária, especialmente seus efeitos no Registro de Imóveis e contribuição que o órgão pode outorgar.

É preciso consignar que a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 é a primeira Constituição brasileira em que a expressão “meio ambiente” é mencionada. As disposições sobre meio ambiente na atual CF estão inseridas em vários títulos e capítulos. O Título VIII (Da Ordem Social), em seu Capítulo VI, trata do meio ambiente, no art. 225 e seus seis parágrafos.

1.2 Competência

Na repartição de competência na área ambiental, a CF adotou os mesmos princípios para a competência em geral entre as entidades federativas, de forma que União, Estados, Distrito Federal e Municípios têm competência para a proteção ambiental e o combate à poluição em quaisquer de suas formas (art. 23), tratando-se, assim, de competência administrativa.

Com relação à competência legislativa, o art. 24 da Constituição declara competir à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar sobre florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição (inc. VI); sobre proteção ao patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e paisagístico (inc. VII); assim como sobre responsabilidade por dano ao meio ambiente, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico (inc. VIII).

À União cabe estabelecer normas gerais e de política geral do meio ambiente, o que ocorreu com a publicação da Lei 6.938/81. Os Estados não têm competência exclusiva em matéria de meio ambiente, possuem competência comum com a União, sendo que, para atender às peculiaridades próprias, poderão exercer a competência legislativa plena, desde que não exista lei federal sobre normas gerais (art. 24, § 3º). Nesse caso, não podem exorbitar da peculiaridade ou do interesse próprio do Estado e terá que se ajustar ao disposto em norma federal ambiental superveniente.

Por final, os Municípios ficam com competência mais no âmbito da execução de leis de proteção que no de legislar sobre a matéria, não impedindo que, dentro de sua competência, elaborem leis de proteção e combate à poluição (art. 30, I, da CF).

1.3 Publicidade ambiental ou princípio da informação

Declaração do Rio de Janeiro – de 1992 – em uma das frases do Princípio 10, afirma que “no nível nacional, cada indivíduo deve ter acesso adequado a informações relativas ao meio ambiente de que disponham as autoridades públicas, inclusive informações sobre materiais e atividades perigosas em suas comunidades”.  

Para compreensão do alcance e da importância da informação sobre meio ambiente, importante a explicação constante da Convenção sobre o Acesso à Informação, a Participação do Público no Processo Decisório e o Acesso à Justiça em Matéria de Meio Ambiente

A expressão ‘informação sobre meio ambiente’ designa toda informação disponível sob forma escrita, visual, oral ou eletrônica ou sob qualquer outra forma material, sobre:

a) o estado do meio ambiente, tais como o ar e a atmosfera, as águas, o solo, as terras, a paisagem e os sítios naturais, a diversidade biológica e seus componentes, compreendidos os OGMs, e a interação desses elementos;

b) fatores tais como as substâncias, a energia, o ruído e as radiações e atividades ou medidas, compreendidas as medidas administrativas, acordos relativos ao meio ambiente, políticas, leis, planos e programas que tenham, ou possam ter, incidência sobre os elementos do meio ambiente concernente à alínea a, supramencionada, e a análise custo/benefício e outras análises e hipóteses econômicas utilizadas no processo decisório em matéria de meio ambiente;

c) o estado de saúde do homem, sua segurança e suas condições de vida, assim como o estado dos sítios culturais e das construções na medida onde são, ou possam ser, alterados pelo estado dos elementos do meio ambiente ou, através desses elementos, pelos fatores, pelas atividades e medidas visadas na alínea b, supramencionada (art. 2º, item 3)[5].

Na Europa, Vicente José García-Hinojal López (apud TEIXIDÓ; SATONJA, 2008), Registrador espanhol, esclarece:

Em matéria de acesso à informação meio ambiental a norma que mais influenciou em sua configuração foi a Diretiva 90/313/CEE do Conselho que até o Convênio de Aarhus havia sido a única que atribuía no plano internacional direito à informação meio ambiental a todas as pessoas, com caráter geral. Este Convênio confere a qualquer pessoa física ou jurídica o direito de ter acesso à informação meio ambiental que se encontra no poder das autoridades.

En materia de acceso a la información medioambiental la norma que más há influido en su configuración ha sido la Directiva 90/313/CEE del Consejo ya que hasta el Convenio de Aarhus había sido la única que atribuía en el plano internacional derecho a la información medioambiental a todas las personas, con carácter general. Este Convenio atribuye a la persona física o jurídica el derecho a acceder a la información medioambiental que se encuentra en poder de las autoridades públicas.[6]

Levar ao Registro de Imóveis informações sobre o meio ambiente é objetivo de nosso estudo; é preciso, porém, que as informações disponibilizadas ao público em geral sejam claras e precisas para facilitar a compreensão. Outro cuidado que devemos desenvolver é o de fundamentar a publicidade na legislação vigente para justificar seu ingresso no fólio real, bem como a tomada de cuidados necessários junto aos órgãos ambientais para que as informações sejam confiáveis e de relevância jurídica.

art. 6º da Lei 6.938/81 criou o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA), integrado pelos órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, bem como as fundações instituídas pelo Poder Público, responsáveis pela proteção e melhoria da qualidade ambiental.

Lei 10.650, de 16 de abril de 2003, dispõe sobre o acesso público aos dados e às informações ambientais existentes nos órgãos e nas entidades integrantes do SISNAMA. O art. 2º da Lei prevê que:

[…] os órgãos e entidades da Administração Pública, direta, indireta e fundacional, integrantes do Sisnama, ficam obrigados a permitir o acesso público aos documentos, expedientes e processos administrativos que tratem de matéria ambiental e a fornecer todas as informações ambientais que estejam sob sua guarda, em meio escrito, visual, sonoro ou eletrônico.

Percebe-se que a intenção do legislador foi de outorgar e centralizar as informações sobre o meio ambiente de todo o País; contudo, por problemas estruturais e financeiros, o sistema praticamente não saiu do projeto: foi desperdiçada excelente oportunidade para integrar o Registro de Imóveis e as informações do SISNAMA. A estrutura do sistema registrário brasileiro, como iremos estudar, é nacional e já se encontra desenvolvida ou em desenvolvimento há mais de um século, de forma que seria menos oneroso aproveitar o Registro de Imóveis e suas características para disponibilizar a informação ambiental à população.

No Brasil, em Direito Ambiental impossível olvidar os ensinamentos de Paulo Affonso Lemes Machado, mormente pelo fato da informação ambiental ter sido sua tese de doutoramento na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sendo de total aplicação para o caso das áreas contaminadas o estudo realizado. Para o autor, a informação ambiental “deve ser veraz, contínua, tempestiva e completa”[7], destacando ou identificando as características da tecnicidadecompreensibilidade e rapidez.

Sobre a tecnicidade, leciona que a informação ambiental deve ser compreensível. “A informação necessita poder ser utilizada de imediato, sem que isso demande que os informados sejam altamente especializados no assunto”[8]. Concluindo o ambientalista, ressaltando que “a clareza deve coexistir com precisão, não se admitindo a incompletude da informação sob pretexto de ser didática”[9].

1.5 As instituições financeiras e o meio ambiente

As instituições financeiras também começaram a exigir Estudo de impacto ambiental (EIA), Relatório de Impacto ao Meio Ambiente (RIMA) e inscrição no Cadastro Ambiental Rural – CAR e outros estudos e documentos ambientais, para a aprovação de créditos. Referidas exigências estão baseadas em acordos internacionais de aplicação no Brasil, sobretudo após o Protocolo de Kyoto, Agenda 21, Convenção sobre a Diversidade Biológica. Contudo, não é somente a consciência socioambiental que está motivando as instituições financeiras, com a evolução da legislação ambiental, mormente nos aspectos penais e na responsabilidade civil que é objetiva, o passivo ambiental das empresas começa a preocupar porque pode ter influência no patrimônio empresarial.

No trabalho denominado A posição das instituições financeiras frente ao problema das agressões ecológicas, apresentado na 9ª SEMANA DE CONTABILIDADE DO BANCO CENTRAL DO BRASIL (09 e 10 de novembro de 2000), os professores do Departamento de Contabilidade da FEA-USP, Drs. L. Nelson Carvalho e Maisa de Souza Ribeiro, esclarecem que:

Ao incorporar a variável ambiental entre os critérios para a concessão de crédito para a comunidade empresarial como um todo; as instituições financeiras poderão exercer dois papéis fundamentais:
1. proteção do próprio patrimônio, pois diminui o risco de perdas em função de clientes cujas atividades e continuidade possam ser comprometidas por condutas ambientais inadequadas;
2. colabora para a preservação do meio ambiente:
a) ao tomar decisões que viabilizarão a modernização e adequação das tecnologias operacionais, contribuindo para a redução da poluição ambiental; ou
b) por decisões que conduzam a extinção de atividades que sejam verdadeiramente nocivas ao patrimônio ecológico.

Em 2002, foram divulgados os “Princípios do Equador” quando várias corporações bancárias se reuniram e divulgaram diretrizes para lidar com o crédito e meio ambiente, este documento utiliza como referência os padrões da própria Companhia Financeira Internacional (IFC) e do Banco Mundial para concessão de crédito, levando em conta critérios socioambientais. Atualmente 39,6% dos bancos participantes levam em consideração os aspectos socioambientais na concessão de crédito e já há bancos (8%) que realizam auditorias socioambientais em seus clientes.[10]

1.6 O princípio da proibição de retrocesso ambiental

Considerando uma tendência de abrandamento da legislação ambiental em todo o mundo em face de diversas justificativas como ameaças políticas de mitigar o rigor da norma de proteção; ameaças econômicas atribuindo à preservação o empecilho para um desenvolvimento econômico; e ameaça econômica também, já que a magnitude das normas em matéria ambiental constitui um conjunto complexo, dificilmente acessível aos não especialistas.

Assim, considerando o crescimento da tendência de mitigação da preservação ambiental já existente, “foi criado por um grupo de juristas, especialistas no tema, em agosto de 2010 no seio da Comissão de Direito Ambiental da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN). Seu objetivo é compartilhar, na esfera universal, as experiências e os argumentos jurídicos capazes de frear as ameaças de retrocesso do Direito Ambiental”[11].

Michel Prieur leciona que “em nome da soberania dos parlamentos, o tempo do direito recusa a ideia de um direito adquirido sobre as leis: “o que uma lei pode fazer, outra lei pode desfazer”. Não estaria aí, na seara ambiental, uma porta aberta ao retrocesso do direito, capaz de prejudicar as gerações presentes e futuras?”[12]

A Constituição brasileira de 1988 possui vários dispositivos sobre a proteção de meio ambiente, conferindo uma hierarquia jurídica e, muito embora não constem expressamente dos direitos e garantias fundamentais expressamente, a doutrina brasileira considera que os direitos ligados ao meio ambiente constituem, tanto no plano material como no plano formal, direitos fundamentais[13].

É preciso ressaltar que conforme o artigo 60, § 4º, da Constituição Federal, os direitos e garantias individuais estão inseridos na chamada “cláusula pétrea”, ou cláusula de intangibilidade constitucional. Esses direitos são considerados, assim, como direitos adquiridos[14].

Antonio Herman Benjamin leciona que “se mostra incompatível com a pós-modernidade, que enfatiza a dignidade da pessoa humana, a solidariedade e a segurança jurídica das conquistas da civilização, transformar direitos humanos das presentes gerações e garantias dos interesses dos nossos pósteros num ioiô legislativo, um acordeão desafinado e imprevisível, que ora se expande, ora se retrai”[15].

O princípio do não retrocesso ambiental na Constituição Brasileira também está previsto no art. 225 que disciplina que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

No Brasil o princípio do não retrocesso já foi admitido em alguns julgados com relação a aspectos sociais, origem imediata do princípio do não retrocesso ambiental[16]. Reconhecemos que se trata de um princípio em evolução, mas é possível reconhecer que a Constituição Federal oferece claros e fortes indicativos que o princípio do não retrocesso ambiental está implícito na mesma, comparando-se ainda que existem menos fundamentos na constituição francesa, origem doutrinária do princípio.

O princípio do não retrocesso ambiental já ganha seu espaço nos tribunais brasileiros, a Câmara Ambiental do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo entendeu que “a proibição do retrocesso atua (nas palavras do Min. Herman Benjamin) quando a legislação reduz o patamar de tutela legal do meio ambiente naquilo que afete em particular (a) os processos ecológicos essenciais; (b) os ecossistemas frágeis ou à beira de colapso e (c) as espécies ameaçadas de extinção”[17].

2 – propriedade imobiliária E SUA FUNÇÃO SOCIAL

2.1 Conceito

“What’s property?”. Esta é a primeira questão posta por JOSEPH SINGER, Professor da Faculdade de Direito de Harvard, ao iniciar sua obra “Property Law – Rules, Policies, and Practices”.[18]

A resposta não é tão simples[19], “a propriedade mais se sente do que se define, à luz dos critérios informativos da civilização romano-cristã”[20], tem sido estudada, ao longo dos anos de forma mais intensa em relação a seu aspecto estrutural (usar, gozar e dispor), olvidando-se seu aspecto funcional, assim são os estatutos civis do Brasil de 1916 (art. 524), Portugal (art. 1.305) e Espanha (art. 348). Nesta perspectiva, a propriedade também poderia ser estudada através de outro aspecto, que não integraria a sua estrutura, mas representaria a sua ideologia.

O civilista português Carvalho Fernandes ousou definir o direito de propriedade como “o direito real máximo, mediante o qual é assegurada a certa pessoa, com exclusividade, a generalidade dos poderes de aproveitamento global das utilidades de certa coisa”,[21] no entanto, obviamente a conceituação é alicerçada na ideia dos poderes que o titular do direito tem sobre a coisa.

Duas teorias fundamentais: teoria da pertença de cunho qualitativo e a teoria do senhorio ou do domínio que apresenta feição quantitativa. A primeira consubstancia uma situação de pertença de certa coisa a uma pessoa, criando-se assim uma relação de subordinação da coisa ao titular do direito; já a teoria do senhorio ou do domínio, diz-se quantitativa porque identifica o direito de propriedade como o mais vasto direito sobre uma coisa, que assim fica sujeita inteiramente ao titular do direito.

Pinto Duarte, outro renomado civilista português, prefere não entrar na problemática da conceituação do direito de propriedade, segundo ele “é muito difícil definir direito de propriedade. (…) Também nós prescindiremos de uma definição, preferindo, como ângulo de abordagem, a apresentação das suas características”.[22]

É preciso ressaltar, outrossim, que o caráter individual ou egoístico da propriedade não se restringia a referidos atributos, mas também à não utilização deles, ou seja, o proprietário possuía o direito de não usar, não usufruir e não alienar a propriedade.

O português Santos Justo salienta que a propriedade não reúne sempre todos os atributos a ela conferidos, o “gozo não é específico da propriedade; e, por outro, que pode haver proprietários sem o uso e a fruição e também sem o direito de disposição”.[23]

A clássica definição do direito de propriedade – ius utendi, fruendi et abutendi – não é encontrada nas fontes do Direito Romano, derivando ela, na verdade, dos intérpretes da Idade Média.[24]

Leciona Thomas Marky que a jurisprudência clássica do Direito Romano conceitua o Direito de propriedade como um poder jurídico absoluto e exclusivo sobre uma coisa corpórea[25]. No entanto, não existia um conceito de propriedade imobiliária unitária, o que existia era uma extensão do pátrio poder sobre pessoas e bens, assim, era a pátria potestas que justificava o poder sobre coisa.

A partir do final da República (períodos helenístico e clássico), passou-se a utilizar a expressão dominium para expressar a relação da pessoa com a coisa. Pode entender o dominium como uma senhoria sobre a coisa, cujas faculdades são indeterminadas.  Assim, o dominium consiste em uma série de faculdades potencialmente ilimitadas no seu exercício, para cada uma destas faculdades é dada a denominação de ius: ius utendi, ius abutendi, ius fruendi, ius alienandi.

Os contornos da propriedade imobiliária desde o período pós-clássico romano e idade média foi de certa forma obscuro, com a queda do império romano (476 d.C.) e invasão bárbara era em torno da posse que a mesma era definida. O feudalismo teve importância significativa e iria dominar por muitos anos a distribuição da terra na Europa.

A relação feudal basicamente consistia em um nexo pessoal vitalício (inclusive extensiva aos herdeiros varões) entre vassalo possuidor da terra e seu senhor. Afirma Figueiredo que a relação do agricultor com o seu senhor era de dominação e subordinação, cabendo ao vassalo cultivar as terras e ao senhor oferecer proteção.[26]

Arruda Alvim leciona afirmando o que “marcou, pois, a concepção da propriedade na época medieval, e o que podemos verificar desta breve exposição, foi a existência constante de dualidade de sujeitos. Havia aquele que podia dispor da terra e a cedia a outrem (fosse este quem pagasse o cânon, fosse o servo etc), mas a disponibilidade e titularidade efetivas do bem cabia sempre àquele que detinha o poder político, e, por implicação necessária, a titularidade jurídica. O direito dos outros, do direito deste detentor do poder político se originava e dele dependia”.[27]

Pode-se dizer que a propriedade no sistema feudal não tinha a característica exclusivista do direito romano e tinha contornos sociais porque permitia a exploração da terra por um número considerável e necessário de pessoal, o senhor feudal com o poder bélico e subordinação à respectiva coroa necessitava da mão de obra dos vassalos para manter seu exercício e sociedade feudal, aqueles por sua vez necessitavam de proteção contra as constantes invasões e incertezas da época.

Foi a ascensão do capitalismo com a necessidade de produção de bens e produtos além das necessidades locais, que começou a criar uma relação de independência dos trabalhadores da terra com os senhores feudais, gerando a independência dos mesmos, na medida em que não precisavam mais de proteção externa.

Fato que contribui muito para o fortalecimento do direito de propriedade na Europa foi a Revolução Gloriosa que ocorreu no Reino Unido entre 1685 e 1689, resultando na queda do Rei Jaime II do trono da Inglaterra e substituição por sua filha Maria II e pelo seu genro holandês Guilherme. O evento marcou a restrição dos poderes reais com relação à propriedade privada, como proibição de requisição e confisco e ainda com a possibilidade de proteção judicial pelos proprietários.

2.2 Função socioambiental da propriedade

Na verdade, a evolução da propriedade foi intensa no decorrer dos últimos dois séculos. Saiu de uma noção e perspectiva individualista, tal como estabelecida no Code Civil, enraizada no lassair-faire, para ganhar nos dias atuais um contorno novo, evidenciando a necessidade da propriedade atender mais às necessidades da coletividade e impor a seu titular uma gama de restrições ou limites, chegando a uma conceituação de poder restringido.

Na Suma Teológica, Santo Tomás de Aquino (1225-1274 apud ANTONCICH; CLASEN; MUNARRIZ, 1986) aceitou a existência da propriedade, mas não a considerava um direito natural, não admitindo expressamente a existência de uma função social; no entanto, é possível extrair alguns elementos que poderiam levar na admissão do princípio:

Usar uma coisa alheia subtraída ocultamente em caso de extrema necessidade não é um furto propriamente dito, pois tal necessidade torna nosso o que tomamos para sustentar nossa própria vida. No caso de uma necessidade semelhante pode-se também tomar clandestinamente a coisa alheia para socorrer o próximo indigente (2,2,66,7).[28]

Dentre os filósofos que buscam uma sustentação do instituto da propriedade como um direito natural, John Locke é indubitavelmente o mais importante. Sua teoria jusnaturalista cria uma solução criativa para o dilema da origem comum da propriedade, para ele a propriedade surge a partir do acréscimo trazido pelo trabalho e beneficia outras pessoas.[29] Essa teoria ajudará no conceito de função social criado por Augusto conte e desenvolvido por Leon Duguit.

Nos séculos XIX e XX, surge a ideia de função social da propriedade com a problemática conhecida hodiernamente: Leon Duguit, jurista francês, em sua obra Las transformaciones del derecho público y privado, depois de tratar de questões como o desaparecimento do sistema de direito público criado com base no conceito de poder público, foi um dos primeiros que concluiu que nem o homem nem a coletividade têm direitos, mas cada indivíduo tem uma certa função a cumprir em sociedade; uma determinada tarefa a executar.[30]

Figueiredo leciona que o conceito de função social oferecido por Duguit inspira-se na doutrina de Augusto Comte[31]. Em seu “Discurso sobre o Espírito Positivo”, Conte sustenta ser irrelevante a existência individual do homem, já que nosso desenvolvimento provém da sociedade e não dos indivíduos isoladamente considerados. Segundo o filósofo, “a ligação de cada um a todos, sob uma multidão de aspectos diferentes, de maneira a tornar involuntariamente familiar o íntimo sentimento de solidariedade social, convenientemente desdobrado para todos os tempos e todos os lugares”.[32] O modo mais eficaz de assegurar a felicidade privada é pela procura ativa do bem público, a qual exige, necessariamente, a repressão permanente dos impulsos pessoais que possam suscitar conflitos contínuos.

Não podemos esquecer, outrossim, que entre os romanos, quando já se pronunciava a criação de um conceito de propriedade, vários institutos denotavam preocupação social, como o omni agro deserto, instituto que permitia a aquisição da propriedade pela utilização das terras longínquas e fronteiriças, pelos agricultores que as tornassem produtivas; a própria compilação das XII Tábuas Romana de 451 a.C na Tábua Segunda tinha uma forte referência socioambiental: “9. Se alguém, sem razão, cortar árvores de outrem, que seja condenado a indenizar à razão de 25 asses por árvore cortada”.

Ocorre que, malgrado o conceito de propriedade ou os atributos a ela inerentes continue o mesmo, é inegável que o legislador brasileiro, como muitos de outros países, acabou por entender que a propriedade deve desempenhar outro papel no direito, atribuindo-lhe, assim, uma qualidade especial.

O Código Napoleônico de 1804 é expressão sinônima do caráter individual da propriedade. Em seu art. 544, definiu como “la proprieté le droit de jouir et disposer de choses de la manière de plus absolue”. O Código Civil italiano de 1865 seguindo a mesma tendência, dizia que “la proprietá è Il diritto di godere e disporre della cosa nela maniera piú abssoluta” (art. 436). O Código Civil Espanhol de 1889 nada inovou também, constando do art. 148 que “la propriedad es el derecho de gozar y disponer de uma cosa”.

Código Civil de 1916 não fugiu muito da influência do velho mundo no art. 524 dizendo que “a lei assegura ao proprietário o direito de usar, gozar e dispor de seus bens, e de reavê-los do poder de quem quer que injustamente os possua”.

Na segunda década do século XX, a Constituição Socialista do México de 1917 foi a primeira a trazer em seu texto referências à função social da propriedade, o que foi seguido por outros países.

É preciso ressaltar que a Constituição Alemã (Weimar) de 1919 é considerada por muitos como o primeiro texto constitucional a consagrar expressamente o princípio da função social da propriedade, o que foi repetido pela Constituição Alemã de 1949.

No Brasil, a evolução constitucional da função social da propriedade foi lenta. A Constituição do Império de 1824 representava um modelo liberal individualista; já a Carta de 1891 afirmava que o direito de propriedade “mantém-se em toda a sua plenitude, salva a desapropriação por necessidade ou utilidade pública, mediante indenização prévia” trouxe a possibilidade de desapropriação pelo “bem público” (art. 72, § 17); A constituição de 1934 traz diversas referências sociais da propriedade, principalmente podemos destacar o art. 113, 17), que afirma que a propriedade não poderia ser exercida contra o interesse social ou coletivo, o mesmo ocorrendo com a CF de 1937; a Carta de 1946 condicionava a propriedade ao bem estar social (art. 147).

A Constituição Federal de 1967 merece destaque, já que foi a primeira que fez menção à função social da propriedade. O artigo 157 afirma que a ordem econômica tem por fim realizar a justiça social, com base entre outros princípios, a função social da propriedade (inciso III). Permite a desapropriação por interesse social (§ 22, art. 150). A Emenda Constituição n. 1, de 17 de outubro de 1969, tinha redação semelhante à antecessora.

Foi com a CF de 1988 que se incorporou o conceito de função social da propriedade na forma em que concebemos hodiernamente. O art. 5º, inciso XXIII, no capítulo destinado aos direitos e garantias fundamentais, declara que “a propriedade atenderá a sua função social”. No artigo 170, inciso III, capítulo destinado à ordem econômica brasileira, indica a função social da propriedade com um princípio fundamental da economia.

O artigo 182 traz inovação ao prever a função social da cidade e que o plano diretor é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana.

O art. 186 no capítulo destinado à política agrícola e fundiária e da reforma agrária, preceitua que “a função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:

I – aproveitamento racional e adequado;

II – utilização adequada dos recursos naturais

disponíveis e preservação do meio ambiente;

III – observância das disposições que regulam as

relações de trabalho;

 IV – exploração que favoreça o bem-estar dos

       proprietários e dos trabalhadores”.

Finalmente, o artigo 225 declara que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.

O artigo 1.228 do Código Civil de 2002 manteve em seu caput a redação do estatuto civil anterior, afirmando que “o proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha”. Porém, em seu Parágrafo Primeiro, sob forte influência da Carta Maior, introduziu na legislação civil infraconstitucional regra inovadora e moderna:

§ 1o O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.

Importante não restringir a função socioambiental da propriedade a aspectos jungidos a mera restrição do direito de propriedade. A propriedade de hoje não é a mesma de outrora tão-somente por aspectos restritivos, justificados meramente pelo direito administrativo. É o que defende Edésio Fernandes ensinando que “não se pode mais reduzir a noção de função socioambiental da propriedade meramente à ideia de limitação administrativas externas ao exercício do direito, o que é muito do gosto dos administrativistas”[33].

O direito de propriedade está, assim, sofrendo influências outrora jamais observadas em nosso direito, refletindo movimentos do mundo fenomênico. E referidos reflexos não se restringem tão somente ao aspecto social, mas também ao econômico, estando nesse aspecto, no nosso entendimento, ou conceito ou caráter pós-moderno da propriedade imobiliária.

A propriedade não mais ostenta aquela concepção individualista do direito romano, reproduzida no Código Civil (CC) de 1916; cada vez mais forte está o seu sentido social, transformando-se em fator de progresso, de desenvolvimento e de bem-estar de todos.

Em conformidade com isso, a nova lei civil brasileira acabou por contemplar a função ambiental como elemento marcante do direito de propriedade, ao prescrever que tal direito ‘deve ser exercitado em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas’ (CC, art. 1.228, § 1º).[34]

Está se reconhecendo, assim, que o direito de propriedade pode – e deve – limitar-se em benefício de uma finalidade superior que mereça proteção; proteção que pode advir da lei ou por meio da consciência social. Esse fenômeno é atual em nosso direito, o CC de 1916 de inspiração liberal decorrente do Código Napoleônico não trazia a ideia de função social da propriedade como aduzimos.

Ocorre que, malgrado o conceito de propriedade continue o mesmo, inegável que o legislador brasileiro, como muitos de outros países, acabou por entender que a propriedade deve desempenhar outro papel no direito, atribuindo-lhe, assim, uma qualidade especial. Não se nega, outrossim, que referida qualidade é assaz subjetiva e de difícil definição por meio dos instrumentos legislativos, o que torna o operador do direito – principalmente os juízes – figura importante para se entender o verdadeiro alcance da função social da propriedade.

Observe-se que, ao atribuir à propriedade a exigência da observância de funções econômica e social, bem como de preservação do meio ambiente, a CF deu início a uma sistemática maior, inclusive com consequências ao próprio direito de propriedade. O professor de direito agrário Carlos Frederico Marés (2003) ensina que:

[…] a terra, nos sistemas jurídicos do bem-estar social deve cumprir uma função social que garanta os direitos dos trabalhadores, do meio ambiente e da fraternidade. A obrigação de fazê-la cumprir é do titular do direito de propriedade, que perde os direitos de proteção jurídica de seu título caso não cumpra, isto é, ao não cumprir não pode invocar os Poderes do Estado para proteger seu direito. Dito de outra forma, não há direito de propriedade para quem não faz a terra cumprir sua função social[35].

Nas palavras de Ignacio Pereña Pinedo,

[…] la función social de la propiedad es un concepto jurídico indeterminado, variable en el tiempo, y que deberá ser definido por el legislador […] es un concepto mucho más amplio que la simple privación del derecho […] configura el ejercicio y el contenido del derecho de propiedad.[36]

Parece-nos que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) no REsp 75.659-SP, no famoso julgamento do caso Favela Pullman, analisou a influência da função social da propriedade sobre as instituições de direito, in verbis a ementa:

O direito de propriedade, assegurado no art. 524 do CC anterior não é absoluto, ocorrendo a sua perda em face do abandono de terrenos de loteamento que não chegou a ser concretamente implantado, e que foi paulatinamente favelizado ao longo do tempo, com a desfiguração das frações e arruamento originariamente previstos, consolidada, no local, uma nova realidade social e urbanística, consubstanciando a hipótese prevista nos art. 589 c⁄c os arts. 77 e 78, da mesma Lei substantiva.

No caso, negou-se a procedência de uma ação reivindicatória em face do direito social de propriedade constante da CF. Trata-se, indubitavelmente, de precedente importante para o direito brasileiro, porque jamais havia enfrentado uma ineficácia pontual de aplicação de legislação ordinária em decorrência de aplicação direta de norma constante da CF, chamando-nos a atenção para essa nova característica da propriedade privada no Brasil.

Não podemos olvidar, assim, que a função social da propriedade ou propriedade-função social está incorporada em nosso direito de forma profunda e rompeu com tradição secular do direito privado. Isso se deu, primeiramente, como princípio basilar constitucional, comando geral primário para os aplicadores do direito; num segundo momento, como sanção ao desrespeito à não-observância da função social na propriedade imobiliária. Algumas dessas sanções já expressamente constantes do corpo da CF (arts. 182, 184 e 186), tanto que, para Eros Roberto Grau (1983), o princípio da função social da propriedade determinou profundas alterações estruturais da interioridade do conceito jurídico-positivo de propriedade.[37]

Viegas de Lima esclarece que “a função econômica da propriedade passa a ter novos contornos, não mais se admitindo a noção multissecular que desempenhou, sendo bem mais uma maneira ou modalidade de sujeição do bem a uma finalidade que transcenda as fronteiras de seu próprio titular e tenha um sentido coerente para a coletividade”. [38]

A propriedade imobiliária, após séculos tida como caráter absoluto, sofreu verdadeiro choque no início do Século XX com necessidade de adoção de sua função social, o que pode ter gerado certo desequilíbrio conceitual no seu tratamento prático, mas esse ponto de equilíbrio começa a se configurar no Século XXI e temos que a Constituição Federal do Brasil começou a despertar essa ideia, principalmente por incorporar – como outras constituições – a constitucionalização do direito civil.

A posição da função social da propriedade nos capítulos dos direitos e garantias fundamentais, ordem econômica e política agrária e fundiária é o indicativo mais contundente de que o desenvolvimento econômico e a função socioambiental da propriedade devem sempre ser interpretadas conjuntamente, tratando-se do mesmo fenômeno e impossível a dissocialização dos conceitos.

Perlingieri  esclarece que “na realidade, a função social não é autônoma, mas sim parte essencial da garantia e do reconhecimento da propriedade privada, a razão da própria tutela da apropriação privada dos bens”[39], a preocupação do civilista italiano é que a função social esvazie o conteúdo mínimo da propriedade, ou seja, a propriedade privada não pode ser esvaziada de todo conteúdo e reduzida à categoria de propriedade formal, não se pode esgotar a fruição da propriedade em razão de conceitos funcionais comunitários, “a função social não pode em caso algum contrastar com o conteúdo mínimo: função social e conteúdo mínimo são aspectos complementares e justificadores da propriedade”.[40]

Parece-nos que a solução não poderia ser diferente e impossível não lembrar dos ensinamentos de Aristóteles. Segundo o filósofo grego, o caminho a ser traçado para a busca do equilíbrio é o da mediania, o ponto de harmonia necessário para se fugir dos extremos:

Ora, de tudo que é contínuo e divisível é possível tomar a parte maior ou a menor, ou uma parte igual e essas partes podem ser maiores, menores e iguais seja relativamente à própria coisa ou relativamente a nós, a parte igual sendo uma mediania entre o excesso e a deficiência. Por mediania da coisa quero dizer um ponto equidistante dos dois extremos, o que é exatamente o mesmo para todos os seres humanos; o que é exatamente o mesmo para todos os seres humanos; pela mediania relativa a nós entendo aquela quantidade que não é nem excessivamente o mesmo para todos os seres humanos.[41]

É o que chamamos de meio ambiente sustável. A função social da propriedade deve ser aplicada e interpretada tendo por fundamento o desenvolvimento econômico, deve existir uma compatibilização dos conceitos e se estabelecer uma harmonia entre crescimento econômico e agrícola e meio ambiente.

2.3 Propriedade imobiliária e o novo Código Florestal

O Código Florestal reforçou a ideia constante do Código Civil (art. 1.228, § 1o), de que o direito de propriedade deve ser exercício com observação de sua finalidade social, devendo ser preservados “a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas”. Em seu artigo 2º está definido que a propriedade deve ser exercida com as limitações que a legislação estabelecer. Embora do ponto de vista jurídico a técnica legislativa não tenha sido das melhores, uma vez que a função ambiental da propriedade é um conceito mais amplo que o de mera limitação, o simples fato de atribuir à propriedade imobiliária uma afetação ambiental deve ser considerado uma evolução para o direito de propriedade.

O § 2º do art. 2º dispõe que “as obrigações previstas nesta Lei têm natureza real e são transmitidas ao sucessor, de qualquer natureza, no caso de transferência de domínio ou posse do imóvel rural.” Indubitavelmente, trata-se de dispositivo dos mais relevantes do Código Florestal e deve ser alvo de intenso debate jurídico, já que sempre existiu certa indefinição na natureza jurídica das obrigações ambientais. A regra é repetida na seção II, que trata do regime de proteção das áreas preservação permanente (art. 7º, § 2º), obrigando o sucessor da área rural a recompor a vegetação.

Ao estipular que as obrigações ambientais têm natureza real quis dizer o legislador tratar-se de obrigações propter rem, acessórias do direito real ou de propriedade. Fernando Noronha leciona que “elas impõem a quem seja proprietário de uma coisa, ou titular de outro direito real de gozo sobre ela (ou às vezes até de uma mera situação possessória) o dever de realizar uma prestação, necessária para a harmonização do exercício do seu direito real com o de outro direito real, de pessoa diversa, incidente sobre a mesma coisa, ou sobre uma coisa vizinha”[42].

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por meio de sua Câmara Especial do Meio Ambiente, consagrou o entendimento daquele órgão especializado de que a reserva florestal legal tem a natureza jurídica de obrigação propter rem e adere ao domínio, possuindo, inclusive, proteção da CF. Assim, a obrigação da delimitação, demarcação e averbação da RLF é do atual proprietário do imóvel e não do Estado[43]. O Conselho Superior da Magistratura de São Paulo, recentemente, interpretando o artigo 1.345 do Código Civil, reconheceu que as obrigações condominiais possuem a natureza de obrigações propter rem[44].

As obrigações ambientais são decorrentes dos princípios da restauração, recuperação e reparação do meio ambienteprevistos no art. 225 da Constituição Federal. A reparação, em especial, está no § 3º do artigo 225 e a regra do § 2º, do art. 2º, do Código Florestal tornou clara a transmissibilidade do dever ambiental para adquirentes do imóvel, que não poderão alegar desconhecimento da responsabilidade ambiental. A Lei n. 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, disciplina expressamente que o poluidor e o predador têm a obrigação de recuperar e/ou indenizar os danos causados (art. 4º, VII). No entanto, não havia regra específica atribuindo às obrigações ambientais o caráter real, aliás, não mais natural do ponto de vista lógico-jurídico já que a responsabilidade civil ambiental é objetiva (art. 14, § 1º, da referida Lei 6.938/81).

3 Registro de Imóveis

3.1 Conceito e evolução histórica

A propriedade imobiliária é o objeto do Registro de Imóveis. Os direitos a ela inerentes são controlados pelo sistema registrário e a compreensão do reflexo da evolução da propriedade é a compreensão também do Registro de Imóvel moderno. O direito de propriedade que o Registro de Imóveis garantia há mais de um século no Brasil não é o mesmo de hoje, as relações jurídicas imobiliárias tornaram-se complexas com a necessidade do cumprimento de uma função ambiental e social.

O Registro de Imóveis como órgão pacificador de conflitos – instituto destinado à garantia da segurança jurídica do tráfego imobiliário, bem como de exercer um filtro jurídico dos títulos que ingressam no fólio real – surge no direito de propriedade como importante ferramenta para estabilizar os negócios e atos jurídicos que envolvam imóveis, exercendo, nesse ponto, função essencial para a sociedade moderna.

No âmbito do Direito Civil, o Registro de Imóveis, tradicionalmente, figura e é estudado no livro do Direito das Coisas, mas sua gênese são os negócios jurídicos, principalmente os contratos, pois é a etapa final para a geração dos efeitos de uma compra e venda imobiliária. A propriedade imobiliária (transmissão derivada) somente se aperfeiçoa com a publicidade registral. A importância da publicidade na transferência e no gravame do domínio e dos direitos reais é evidente. A maior ou menor seguridade do tráfego jurídico econômico está em função da publicidade e, por consequência, nos efeitos gerados por ela.

É dentro dessa certeza que o desenvolvimento do crédito territorial é objetivo de índole econômica desejável em uma sociedade bem organizada. O registro no Registro de Imóveis fornece a todos os demais ramos do direito a certeza, instabilidade e publicidade necessária para o desenvolvimento de relações outras que demandam comunicação com a propriedade imobiliária (partilha de bens nas sucessões, penhora ou arresto, cadastro tributário).

A origem do Registro de Imóveis possui antecedentes no antigo Egito e Grécia clássica, contudo, foi no século XVIII que começou a se desenvolver à medida que as transações imobiliárias foram ganhando importância. O Estado se viu obrigado a entrar na regulação do mercado oferecendo um mecanismo de segurança que garantisse as transações.

A princípio, na descoberta do Brasil, o Rei de Portugal adquiriu o título originário da posse, dividindo o novo território em capitanias hereditárias governadas por donatários, que cediam parcialmente seus direitos possessórios aos moradores das capitanias por meio de cartas de sesmaria[45]. As sesmarias eram concedidas, primeiro pelos donatários das capitanias hereditárias, depois pelo governo geral, mais tarde pela Coroa de Portugal. Dessa forma, não havia propriedade nos moldes em que conhecemos hoje, era em torno da posse que giravam todas as relações econômicas.

O regime das sesmarias durou até a independência do Brasil (1822), e somente em 1850, com a Lei 601 e seu Regulamento 1.318, de 1854, a posse foi legitimada sendo que todas as posses que fossem levadas ao livro da Paróquia Católica (Registro do Vigário), eram separadas do domínio público, tendo caráter obrigatório o registro das posses dos possuidores de terras devolutas.  A propriedade, nessa época, não era transmitida pelo contrato, mas pela tradição, que é a entrega real ou simbólica da coisa, sendo o registro do vigário um controle essencialmente possessório.

Em 1843 surgiu a Lei Orçamentária 317, que criou o registro de hipotecas, objetivando tornar a terra base para o crédito; porém, ensina-nos Afrânio de Carvalho que “o registro de hipotecas não deu os resultados esperados por lhe faltarem os requisitos de especialidade e publicidade”.[46]

Em 1864 surgiu a Lei 1.237 que criou o Registro Geral, denominada por muitos juristas como o embrião do Registro de Imóveis. A Lei substitui a tradição pela transcrição como modo de transferência, continuando o contrato a gerar efeitos obrigacionais. Ressalte-se, porém, que esse registro não era prova de propriedade, nem mesmo como presunção relativa, sendo que o autor precisava prová-la por outras vias como a reivindicatória. Em 1890 a Lei 1.237 foi substituída pelo Dec. 169-A e seu Regulamento, Dec. 370, contudo, substancialmente, nada foi alterado.

Com o advento do CC de 1916, o Registro Geral foi substituído pelo Registro de Imóveis, mantendo-se a transcrição, entretanto, com uma mudança substancial, foi lhe dada nova roupagem, resultando em prova da propriedade juris tantum, ou seja, admitindo prova em contrário. O Código trata da matéria nos arts. 856 e seguintes.

Com o Regulamento da Lei 4.827, de 1924, consubstanciado no Dec. 18.542, de 1928, foi introduzido no sistema registrário o princípio da continuidade, exigindo-se, para qualquer transcrição ou inscrição, o registro do título anterior.

O Regulamento subsequente, n. 4.857, de 1939, nos ensina Afrânio de Carvalho, corrigiu a terminologia do ordenamento anterior, separando os atos sujeitos à transcrição e inscrição. Os primeiros referentes aos atos de transmissão da propriedade; os segundos à constituição de ônus reais.

Em 1973 surge a Lei 6.015, que reuniu, em diploma legal, todos os princípios norteadores do Registro de Imóveis, aperfeiçoando uns e criando outros, de sorte que, de certa forma, revolucionou o sistema de transmissão de propriedade brasileiro. Isso se deu, principalmente, no que tange aos livros, pois, além de reduzir a quantidade, centralizou um livro principal no imóvel, criando a figura da matrícula,[47] representa a individualidade do imóvel, sua situação geográfica e perfeita descrição, sofrendo alterações objetivas e subjetivas por meio da averbação, sempre com um mesmo número de ordem, facilitando incrivelmente as pesquisas e expedição de certidões.

3.2 Função socioambiental do Registro de Imóveis

A CF ao instituir em cláusula pétrea a função social da propriedade (art. 5º, XXIII), ao estabelecer a função social das cidades (art. 182) e declarando que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225), atribuiu ao Registro de Imóveis características que outrora não possuía. Dentre elas, está a necessidade de incorporação do conceito de função social da propriedade e do meio ambiente, percepção claramente observada pelo legislador no Estatuto da Cidade e na legislação ambiental. Nesse aspecto, o Registro de Imóveis tem sido utilizado estrategicamente para potencializar a função social da propriedade. Na regularização fundiária (Lei n. 11.977/2009) tem exercido papel importantíssimo para a materialização dos direitos de moradia, inclusive controlando a aquisição pela usucapião administrativa ou tabular. Com relação à publicidade inerente ao Registro de Imóveis, é inegável o avanço nos últimos anos.

Mas não é somente na publicidade dos espaços territoriais especialmente protegidos que o Registro de Imóveis pode ajudar o meio ambiente. Várias são as situações que podemos nos valer do instituto, ou melhor, da estrutura do Registro de Imóveis para garantir o respeito e a reparação do meio ambiente, o que será observado no decorrer do estudo.

Podemos conceituar o Registro de Imóveis como

[…] órgão auxiliar do direito civil destinado ao assentamento de títulos públicos e privados, outorgando-lhes oponibilidade a terceiros, com ampla publicidade e destinado ao controle, eficácia, segurança e autenticidade das relações jurídicas envolvendo imóveis, garantindo-lhes presunção relativa da prova da propriedade.[48]

Esse é conceito tradicional do Registro de Imóveis; contudo, hodiernamente não exerce somente a função de guardião do direito da propriedade, mas também a novel missão de guardião da função social da propriedade, nesta incluída a ambiental. Cabe observar que a facilidade natural de concentração das informações imobiliárias e o fato de se tratar de órgão constitutivo da propriedade por meio do registro levaram o Registro de Imóveis, no decorrer dos anos, a exercer funções atípicas como fiscalizar o recolhimento de tributos (imposto predial e territorial urbano, imposto de transmissão de bens imóveis, imposto territorial rural, entre outros).

3.3 Estrutura do Registro de Imóvel em favor do meio ambiente

Abaixo relacionamos algumas características do Registro de Imóveis brasileiro que pode ser útil para o desenvolvimento da disponibilidade de informações ambientais:

a) O Registro de Imóveis é um órgão que exerce serviço público (art. 236 da CF)

O art. 236 da CF dispõe que “os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público”. O art. 3º da Lei 8.935/94, que regulamentou referido dispositivo constitucional, por seu turno, define: “Notário, ou tabelião, e oficial de registro, ou registrador, são profissionais do direito, dotados de fé pública, a quem é delegado o exercício da atividade notarial e de registro”.

O registrador imobiliário por desempenhar função pública e ser órgão delegado do Estado é detentor de fé-pública, possuindo seus atos presunção de veracidade, o que legitima sua atuação para publicizar informações ambientais em seus livros, agindo em conjunto com a Administração Pública.

b) Os Registros de Imóveis são organizados territorialmente

Uma das maiores vantagens do Registro de Imóveis é sua organização territorial, porque acaba por facilitar a obtenção da informação para a beneficiária direta que é população local. Praticamente todas as comarcas do País possuem um cartório de Registro de Imóveis, o que permite um acesso fácil à informação registral e, por consequência, à ambiental também.

Observa-se que a informação ambiental pode ser oriunda dos três entes federativos; dificilmente, existe correspondência entre as unidades de administração ambiental e os respectivos municípios e comarcas, o que corrobora com a ideia de facilidade da utilização da estrutura do Registro de Imóveis.

No estudo elaborado na Espanha, percebe-se claramente que a informatização é a base para disponibilizar o acesso à informação de forma rápida e eficaz. Todos os registros de propriedade do país estão ligados em rede de Internet e Intranet, além de possuírem softwares de visualização das propriedades que estão georreferenciadas, inclusive com fotos via satélite. Assim, é preciso que o registrador imobiliário brasileiro tenha noção da importância da informatização do cartório, que servirá como forma eficaz de divulgação do serviço disponibilizado. Facilitará muito a troca de informações entre os órgãos ambientais e Registro de Imóveis se existir uma rede entre os cartórios.

É preciso desenvolver a ideia de que, somente com a informatização e uma rede entre os registros imobiliários do País, os serviços poderão ser prestados de forma ágil, eficiente e uniforme. A informatização também é necessária para a segurança do tráfego imobiliário e ajudará a facilitar as pesquisas imobiliárias, maior dificuldade dos usuários e da Administração Pública.

A Associação dos Registradores Imobiliários de São Paulo (ARISP), por meio de trabalho inovador que começou com os cartórios da Capital do Estado e avança para as demais regiões, estabeleceu sistema de comunicação eficiente chamado Ofício Eletrônico, no qual se estabelecem uma rede com base de dados mínima e interconexão com a Administração Pública, tudo isso com a segurança do sistema de certificação digital decorrente da Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil) criada pela MedProv 2.200-2, de 24 de agosto de 2001.

No Estado de São Paulo através do Provimento nº 36/2012, cujos detalhes serão estudados no capítulo destinado à reserva florestal legal, foi criado o mecanismo tecnológico necessário para a existência de um tráfico de fluxo de informações entre o cadastro ambiental e os Registros de Imóveis.

c) O Registro de Imóveis possui relação com todos os demais órgãos da Administração

Por ser um órgão que desempenha serviço público, o Registro de Imóveis possui forte vínculo com a Administração, em vários municípios é comum encontrar convênio entre as unidades de registro com as prefeituras citando como exemplo o que ocorreu na comarca da Capital do Estado de São Paulo onde existe forte intercâmbio de informações entre os órgãos.

Os Ofícios Imobiliários também possuem relação direta com a Secretaria da Receita Federal nas Declarações sobre Operações Imobiliárias (DOI) (no art. 8º da Lei 10.426, de 24 de abril de 2002) que são realizadas mensalmente pela internet e Secretaria do Patrimônio da União (SPU) (art. 3º-A do Dec.-lei 2.398/87) no caso de atos praticados em imóveis da União.

d) O Registro de Imóveis oferece serviços feitos por profissionais de alta qualificação técnica após aprovação em concurso de prova e de títulos (art. 3º da Lei 8.935/94)

Os registradores imobiliários são profissionais do direito aprovados em concurso de prova e de títulos, o que, somado à experiência e trabalho dos institutos de estudo, os legitima para trabalhar não somente com relação ao direito de propriedade, mas também às respectivas limitações ambientais.

e) O Registro de Imóveis está conectado com o Sistema Geodésico Brasileiro (SGP) (Lei 10.267/2001)

A Lei 10.267, de 28 de agosto de 2001 alterou a Lei 6.015/73 e criou uma nova forma descritiva de propriedade imobiliária chamada de georreferenciamento, que utiliza coordenadas geográficas fixadas com o auxílio de satélites.

Com relação ao meio ambiente, inegável a importância do georreferenciamento, porque os espaços territoriais especialmente protegidos possuirão a precisão necessária para facilitar a fiscalização e identificação do proprietário para a imposição de obrigações civis, penais e administrativas, além, é claro, de expressar com exatidão cadastral a situação jurídica do imóvel. Por essa razão, entendemos que, no futuro, será impossível afastar o georreferenciamento para a especialização da reserva florestal legal, reserva particular do patrimônio natural e demais espaços ambientalmente protegidos. Malgrado não conste expressamente da Lei 10.267/2001, bem como de seu regulamento, a necessidade de georreferenciamento para essas áreas trata-se de consequência lógica e inevitável.

Problema sério a ser enfrentado é o fluxo de informações que deve ocorrer entre o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) e os Registros de Imóveis. No momento, a matéria é regulamentada pelos Decs. 4.449, de 30 de outubro de 2005, e 5.570, de 31 de outubro de 2005, e não existe interação eficaz e democrática entre os órgãos, principalmente da autarquia federal que não envia qualquer informação aos cartórios que promovem comunicação mensal de mudanças de titularidades dos imóveis.

Com a existência de coordenadas geográficas, tornar-se-ia fácil para o registrador imobiliário a elaboração de um mosaico gráfico dos imóveis rurais de sua circunscrição. Existem vários programas gratuitos na internet que podem auxiliar o Registro de Imóveis nesta tarefa, sendo referida ferramenta de utilidade extraordinária para a visualização gráfica da matrícula, auxiliando as buscas de forma rápida e precisa.

Com inspiração no sistema desenvolvido pelo Colégio de Registradores da Espanha, implantamos no Registro de Imóveis de Araçatuba, Estado de São Paulo, um programa de visualização gráfica das matrículas georreferenciadas ou retificadas consensualmente, que tem demonstrado sucesso absoluto e fonte de pesquisas não somente pelo Registro de Imóveis, mas também por profissionais da área de agrimensura ou engenharia.

Como salientamos, o Colégio de Registradores da Espanha desenvolve ambicioso trabalho de vinculação gráfica de propriedades imobiliárias a uma base gráfica cadastral. No entanto, de forma totalmente distinta do modelo brasileiro. A Espanha possui um sistema cadastral das propriedades imobiliárias bem elaborado e desenvolvido; os registradores possuem as imagens de satélite vinculadas ao cadastro e de acordo com os atos praticados no Registro ou por meio de ofício, validam a vinculação da matrícula (registro) ao cadastro.

Finalmente, sobre a necessidade da utilização de bases gráficas vinculadas ao Registro de Imóveis, importante o trabalho de Jorge Requejo Liberal:

Percebemos, assim, que a estrutura do Registro de Imóveis é adequada e ideal como fonte de reforço da publicidade ambiental, que deve ocorrer naturalmente e livre de preconceitos pelos operadores do direito. O Registro de Imóveis é utilizado pela Administração como órgão auxiliar para o cumprimento de obrigações tributárias; hodiernamente, no entanto, a finalidade é outra, qual seja a social, justificando a utilização de seus livros para reforçar a publicidade ambiental.

3.4 Competência

Somente à União cabe legislar sobre registros públicos (art. 22, XXV, da CF). Trata-se, no nosso entendimento, do principal problema para a interligação entre meio ambiente e Registro de Imóveis porque existe a possibilidade de três entes políticos criarem mecanismos ou institutos de proteção ao meio ambiente; contudo, somente a União pode legislar para prever a possibilidade de ingresso de títulos no Registro de Imóveis.

3.5 Princípios do Registro de Imóveis utilizados no direito ambiental

A segurança jurídica requer uma certeza nas regras do direito, exigindo sua publicidade. Pensando na segurança nas transações de bens imóveis, qualquer informação que possa limitar o direito de propriedade deve constar do fólio real sob pena de abalar o sistema de transmissão de propriedade. Na proteção do meio ambiente torna-se impossível não se restringir ou regular uso da propriedade, porém, a publicidade das restrições não está perfeitamente delimitada em nosso direito, merecendo estudo nesse sentido para que a segurança jurídica, pilar de nosso direito, não seja ameaçada.

Nesse sentido são os ensinamentos do Registrador espanhol Mariano Va Aguaviva, na introdução do Expert córner reportpublicado em 1 de outubro de 2002, denominado El Registro de la Propriedad y Mercantil como instrumento al servicio de la sostenibilidad realizado pelo Colégio de Registradores da Espanha para a Agência Europea de Meio Ambiente:

Es de interés general y la sociedad debe exigir que tales situaciones sean publicadas no sólo por el principio de seguridad jurídica general, sino además por la matéria específica, medio ambiente, que precisa de especial atención y protección ‘un alto nível de protección y de mejora de la calidad Del medio ambiente’, artículo 1.2 del Tratado CE basado en el principio de cautela y acción preventiva, artículo 174.2 del Tratado CE, que ineludiblemente requiere de una precisa información y publicidad con efectos jurídicos y que puede obtenerse mediante el Registro de la Propiedad.[49]

É cediço que o Registro de Imóveis possui princípios jurídicos sólidos e que não poderão dar espaço a regras que abalem sua estrutura, de forma que para tornar efetiva a publicidade ambiental, devemos nos valer dos mecanismos já vigentes no sistema registrário. Tomado esse cuidado, analisaremos alguns princípios registrários.

3.5.1 Princípio da publicidade

A publicidade registral é tida como um dos tesouros mais preciosos do amadurecimento do espírito jurídico, uma nova forma de ser do direito de propriedade sobre o qual se assentam o sistema financeiro, a tutela do crédito e a segurança das transações imobiliárias[50]. Ensina Balbino Filho que “a publicidade é a alma dos registros públicos. É a oportunidade que o legislador quer dar ao povo de conhecer tudo que lhe interessa a respeito de determinados atos. Deixa a par de todo o movimento de pessoas e bens”[51]. Um sistema de publicidade eficaz, como defendia Ruy Barbosa, é a base de uma economia forte, porque ajuda a circulação natural dos bens[52].

A maior ou menor segurança do tráfego jurídico econômico está em função da publicidade, o mesmo que o desenvolvimento do crédito habitacional, que são objetivos de índole econômica desejáveis em uma comunidade bem organizada[53].

A publicidade é uma das características do Registro de Imóveis. Não se pode admitir que um registro tenha eficácia “erga omnes” (contra todos) e ao mesmo tempo seja negada informação ao público em geral. No Registro de Imóveis, a publicidade dos atos por ele praticados é garantida não somente pela própria Lei 6.015/73, como também por norma constitucional (artigo 5.º, inciso XXXIII, CF), devendo ser fornecida certidão para qualquer parte que a solicite, independentemente de identificação[54].

Para nós, quem melhor conceitua publicidade registral é Garcia Garcia. Para ele, “publicidade registral é a exteriorização continuada e organizada de situações jurídicas de transcendência real para produzir cognoscibilidade geral erga omnes e com certos efeitos jurídicos substantivos sobre a situação publicada”[55]. A exteriorização se contrapõe à clandestinidade, mas não se trata de mera aparência, é uma situação aparente qualificada com os efeitos gerados sobre o próprio direito registral no caso do Brasil. O caráter de continuidade se refere à perenidade dos assentos registrários que são conservados, atualmente inclusive de forma eletrônica.

As informações são organizadas e contínuas, formando um verdadeiro estado civil do imóvel. As situações jurídicas publicizadas no Registro de Imóveis são de transcendência real, na maioria das vezes constituindo o próprio direito real e, quando não, nos casos de aquisições originárias ou decorrentes de sucessão, é necessária a publicidade registral para que o atributo da disponibilidade seja potencializado e exteriorizado.

Trata-se de cognoscibilidade, não de conhecimento efetivo. Não se trata de publicar para produzir um conhecimento, mas possibilitar que exista, ou seja, tornar possível esse conhecimento, devendo o acesso à informação ser facilitado por todas as formas, principalmente nos dias de hoje por meio eletrônico. Finalmente, a publicidade tem como consequência a produção de efeitos jurídicos substantivos e materiais sobre a situação publicada, despendendo, obviamente, do sistema registral de cada país.

Com relação à finalidade da publicidade registral, é possível elencar quatro finalidades principais: a segurança jurídica dos direitos e do tráfego imobiliário, porque através da publicidade e da aparência gerada pelo registro resulta numa base jurídica sólida para que o mercado se desenvolva; fomento do crédito territorial, já que com um sistema registral público e que garanta às instituições financeiras estabilidade e confiabilidade dos atos de registro, fica mais fácil a liberação dos créditos, sendo a situação jurídica imobiliária séria, não demandando maiores pesquisas de títulos dominiais, potencializando, então, a redução de juros; evitação de usura e fraude: essa finalidade é justificada pelo fato de a publicidade ser operada e controlada por profissionais de direito concursados, garantindo higidez das bases imobiliárias e controle na segurança contra fraudes; e, por fim, tem uma finalidade cautelar, já que, com o sistema de publicidade registral se cumpre, no âmbito da propriedade e direitos reais sobre imóveis, uma função preventiva ou cautelar, evitando que se proliferem excessivamente as ações, tendo por objeto a discussão de títulos e o próprio registro[56].

O autor português Carlos Ferreira de Almeida qualifica “os registros públicos como os meios mais perfeitos e evoluídos da publicidade, igualando-os mesmo ao conceito técnico-jurídico de publicidade”.[57]

Embora reconheçamos que integra a publicidade a configuração ou imputação dos efeitos jurídicos decorrente do registro, entendemos que se trata de uma consequência lógica imediata da publicidade gerada, mas é preciso afastar a ideia errônea de que a publicidade em si já configura os efeitos, o que deve ser analisado e dissecado em momento ulterior com o estudo dos princípios inerentes aos efeitos gerados pela inscrição do negócio jurídico correspondente. No caso são três: princípios da legitimação, fé-pública registral e inatacabilidade decorrente do registro torrens. Carvalho cometeu o erro que mencionamos, atribuindo diretamente à publicidade os efeitos[58], o mesmo ocorrendo com Marcelo Salaroli de Oliveira[59]. Carlos Ferreira de Almeida classifica a publicidade registral, segundo seus efeitos, por meio de três vertentes: a) publicidade-notícia (sem particulares efeitos no ato publicado); b) publicidade declarativa (necessária para que os fatos sejam eficazes em relação a terceiros); c) publicidade constitutiva (indispensável para que os fatos produzam quaisquer efeitos)[60].

O Registro de Imóveis brasileiro, como é cediço, confere a seus atos publicidades distintas, quer para a averbação, quer para o registro em sentido estrito. Para não adentrarmos em espécies de publicidade que não utilizaremos no presente trabalho, restringiremos o estudo apenas à publicidade-notícia.

A publicidade utilizada no direito ambiental é a publicidade-notícia que apresenta pouca eficácia perante terceiros, não apresentando qualquer efeito sobre a eficácia do fato registrado. O legislador conferiu ao Registro de Imóveis na grande maioria das vezes, em matéria ambiental, o reforço de uma publicidade já criada ou definida em outros meios como a reserva florestal legal, áreas contaminadas e área de proteção e recuperação de mananciais.

Muitas restrições administrativas, agora definidas como espaços territoriais especialmente protegidos, já possuem publicidade decorrente da própria lei que as constituiu, porém, para a segurança jurídica e cumprimento de obrigações decorrentes da limitação, seria aconselhável não se confiar somente na publicidade legal, mas também na publicidade imobiliária, para dar conhecimento e vincular definitivamente futuros adquirentes. O homem médio não possui o hábito de leitura de textos legislativos, ainda mais dos três entes políticos, de forma que o sistema jurídico não pode se valer tão-somente dessa publicidade ilusória ou fictícia.

3.5.2 PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE

De origem doutrinária, esse princípio foi emprestado dos direitos reais de garantia na referência à especialização da hipoteca. Afrânio de Carvalho, com a clareza que lhe é peculiar, afirma que “o princípio de especialidade significa que toda inscrição deve recair sobre um objeto precisamente individuado.” [61]

Assim, o requisito registral da especialidade do imóvel, vertido no fraseado clássico do direito, significa a sua descrição como corpo certo, a sua representação escrita como individualidade autônoma, como o seu modo de ser físico, que o torna inconfundível e, portanto heterogêneo em relação a qualquer outro. O corpo certo imobiliário ocupa um lugar determinado no espaço, que é o abrangido por seu contorno, dentro do qual se pode encontrar maior ou menor área, contanto que não sejam ultrapassadas as raias definidoras da entidade territorial.[62]

O art. 176 da Lei 6.015/73 é a expressão do princípio da especialidade, objetivamente exige a identificação do imóvel com todas as suas características e confrontações, localização, área e denominação, se rural ou logradouro e número, se urbano, e sua designação cadastral, se houver; subjetivamente existe a qualificação e identificação completa dos titulares de direito real, principalmente nome, estado civil (e regime de bens), registro geral ou filiação, cadastro fiscal para fins tributários e domicílio.

A Lei 10.267, de 28 de agosto de 2001 alterou a Lei 6.015/73 e criou uma nova forma descritiva de propriedade imobiliária chamada de georreferenciamento, que utiliza coordenadas geográficas fixadas com o auxílio de satélites para os imóveis rústicos ou rurais, exigindo a identificação dos imóveis rurais por meio desse sistema que será obtido a partir de memorial descritivo, assinado por profissional habilitado e com a devida Anotação de Responsabilidade Técnica – ART, contendo as coordenadas dos vértices definidores dos limites dos imóveis rurais, georreferenciadas ao Sistema Geodésico Brasileiro e com precisão posicional a ser fixada pelo INCRA (§ 3º do art. 176). Assim, deu-se início a uma interconexão entre cadastro e registro, inédita no cenário mundial. O registro, além de tecnicamente descrito, corresponderá exatamente à figura geométrica fática.

Uma das principais funções ambientais do Registro de Imóveis é dar publicidade registral erga omnes dos espaços territoriais especialmente protegidos, dentre eles podemos destacar as reservas florestais legais, reservas particulares do patrimônio natural e servidões ambientais. A grande maioria dos espaços protegidos tem a natureza jurídica da limitação administrativa ou ambiental, existe uma restrição à utilização da propriedade imobiliária em seus atributos plenos[63]. A publicidade registral não é constitutiva, é no órgão ambiental que existe a criação. O Registro de Imóveis, como salientamos, opera como reforço de uma publicidade já criada ou definida em outros meios. Importante lembrar que muitas restrições administrativas, agora definidas como espaços territoriais especialmente protegidos, já possuem publicidade decorrente da própria lei que as constituiu. Porém, para segurança jurídica e cumprimento de obrigações decorrentes da limitação, seria aconselhável não se confiar somente na publicidade legal, mas também na publicidade imobiliária, para dar conhecimento e vincular definitivamente futuros adquirentes.

Assim considerando, o Oficial de Registro de Imóveis deve entender que a finalidade da publicidade registral ambiental é espelhar as restrições ambientais inerentes ao direito de propriedade da forma mais exata possível. Mas para que isso ocorra como veremos a comunicação entre registro e cadastro deve ser eficaz. Obviamente surgirão hipóteses em que a especialidade rígida ou exata não será possível, demandando quase uma publicidade mínima da restrição ambiental, quase que existencial, para que num futuro próximo a publicidade completa possa ser atingida.

Sabemos que várias são as formas como os imóveis foram descritos desde a criação do Registro de Imóveis e, na grande maioria das vezes, nem mesmo a descrição existe ou, ainda, com divisas imprecisas e frágeis, tornando-se difícil localizar ou especializar a reserva. É claro que o advento da Lei 10.267/2001, que criou o georreferenciamento, resolverá paulatinamente o problema das descrições dos imóveis rurais. No entanto, nessa transição deverá a reserva ser especializada na forma do regulamento, devendo o Oficial esforçar-se para estabelecer um ponto de amarração entre reserva (descrição georreferenciada) e descrição registraria (azimutes, latitude e longitude, rumos magnéticos etc), lembrando que a lei não determina a averbação da Reserva Particular e sim seu gravame, justificando-se uma aparente mitigação do princípio da especialidade objetiva. Nesse sentido a jurisprudência administrativa da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de São Paulo (PROCESSO Nº 2012/77684 – TANABI – Parecer 206/2012-E, publicada em 14.08.2012)[64].

Nenhuma ofensa ou prejuízo ao princípio da especialidade ocorre na hipótese. Além da averbação não ser constitutiva, quando do término dos prazos constante do art. 9º Decreto nº 4.449, de 30 de outubro de 2002, todos os imóveis rurais do Brasil serão necessariamente georreferenciados, bastando quando do procedimento de retificação de registro resultante (art. 213 da Lei nº 6.015/73, o Oficial de Registro de Imóveis exigir a identificação da Reserva Particular na planta apresentada.

Exigir uma coincidência na forma descritiva entre Reserva Particular e perímetro do imóvel com certificação pelo INCRA e respectiva retificação (art. 213 da Lei nº 6.015/73) seria transformar a apregoada rigidez formal do sistema registrário em dogma que redundaria em negação do direito ambiental e do próprio direito real, punindo as deficiências anteriores com soluções inadequadas e exigindo perfeição ainda não atingida. Recordando as palavras do Des. Márcio Martins Bonilha, “a razoabilidade há de pautar a conduta de todos os que atuam na área, principalmente registral”[65].

3.6 Cadastro e Registro

Muito importante quando estivermos tratando de meio ambiente e Registro de Imóveis é ter em mente a diferenciação entre estes dois institutos para que não seja criada confusão, prejudicando a verdadeira função de cada um. Com efeito, quando falamos em cadastro, estamos nos referindo ao controle administrativo necessário e criado pela Administração com finalidade precípua de arrecadação de impostos, ou cumprimento de funções administrativas e ambientais. Nesse controle, apenas se utilizam informações constantes de obrigações outras, mas com o objetivo de controle fiscal.

No Registro, porém, malgrado exista também um controle, sua finalidade é totalmente distinta da cadastral. O Registro é o guardião do direito de propriedade, dos detentores de referido direito, sua extensão e efeitos. No Brasil, é constitutivo de direitos que nascem dentro do Registro de Imóveis que exerce a função de controle do tráfico imobiliário.

No entanto, cadastro e registro possuem forte conexão no momento que a Administração precisa utilizar as informações constantes dos livros do Registro de Imóveis para criar ou alimentar sua base cadastral; isso é facilmente observado no cadastro fiscal dos municípios que necessitam da informação registral para promover o lançamento do imposto predial e territorial urbano. O Registro de Imóveis também necessita de informações cadastrais para conferir à publicidade registral maior para manter uma simetria com os dados dos cadastros tributário e ambiental.

No direito ambiental, a ligação entre cadastro e registro é mais íntima ainda. Primeiro, porque a grande maioria das informações ambientais consta do cadastro dos mais diversos órgãos da Administração das três esferas políticas (União, Estados-membros e Municípios). Segundo, porque as informações cadastrais transcendem muitas vezes o cadastro para o registro na medida em que alteram, significativamente, o direito de propriedade, restringindo-o de forma drástica em alguns casos. As áreas de preservação permanente são um exemplo, possuem previsão e localização constantes de lei e cadastros públicos; no entanto, quem adquire imóvel com referida área não poderá aproveitá-la economicamente. O mesmo ocorre com as áreas contaminadas que constam do cadastro e agora possuem publicidade registral: o proprietário deverá remediar a área antes de aproveitá-la, descontaminação essa que poderá custar muitas vezes mais que o valor da própria propriedade de acordo com a contaminação.

O problema é que o Brasil não possuía vocação cadastral, não existindo uniformização dos cadastros fiscais de seu território, poucos municípios possuem informações fiscais confiáveis e de fácil localização, o que acabou prejudicando ainda mais a confusão do Registro de Imóveis como órgão que exercia referida função.

Afirma Roca Sastre apud José Francisco Fernández García (2002) que

[…] el Catastro y el Registro de la Propiedad son instituciones autônomas que nacen con distinta naturaleza y finalidad y se sirven de técnicas o instrumentos igualmente diversos. El Catastro es una institución jurídica de Derecho público, configurada a partir de un inventario o registro de bienes inmuebles de naturaleza administrativa y aplicación multifuncional (fiscal, urbanística, expropiatoria etc.),que se organiza en forma se base de datos, en la que los bienes inmuebles figuran determinados mediante su descripción y expresión gráfica y son objeto de evaluación o estimación econômica. El Registro, en canbio, es en esencia una institución de Derecho privado destinada a proteger el tráfico jurídico inmobiliário mediante la publicidad de los actos de constitución, transmisión, modificación y extinción de los derechos reales sobre fincas, con efectos de naturaleza jurídico-substantiva, consistentes especialmente en la legitimación y protección de las titularidades inscritas y de los terceros adquirentes.[66]

Assim, a diferenciação entre os institutos é importante para que não haja confusão conceitual e funcional entre cadastro e registro, possibilitando-nos desenvolver a tese da utilização do Registro de Imóveis também para reforçar a publicidade ambiental.

Com o advento do Código Florestal de 2012 foi criado o Cadastro Ambiental Rural – CAR (art. 29 da Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012), no entanto, com fortes erros jurídicos e conceitos que podem levar à confusão com certas questões relativas ao registro. No Estado de São Paulo através das Normas de Serviço do Corregedoria Geral da Justiça (Provimento nº 58/89) procurou-se, como veremos, estabelecer uma comunicação com fluxo de informações relevantes entre cadastro e registro e corrigir as imperfeições legislativas. A problemática da confusão entre cadastro e registro será tratada de forma mais aprofundada quando da análise do espaço territorial mais relevante que é a reserva florestal legal.

3.7 Taxatividade dos atos registrários e efeito da concentração

Lei 6.015/73 dividiu os atos praticados no Registro de Imóveis, em especial na matrícula do imóvel, em dois grandes grupos: registro e averbação. O primeiro envolve direitos e ônus reais; o segundo, atos relativos à mutação objetiva ou subjetiva da matrícula, conforme se observa de seu artigo 167. Tanto a doutrina como a jurisprudência já firmaram entendimento no sentido de que referido rol dos atos de registro estrito senso é taxativo[67] (numerus clausus), somente podendo ser ampliado por vontade legislativa.

O registrador imobiliário João Pedro Lamana Paiva defende que nenhum fato jurígeno ou ato jurídico que diga respeito à situação jurídica do imóvel ou às mutações subjetivas pode ficar indiferente à inscrição na matrícula. Além dos atos traslativos de propriedade, das instituições de direitos reais, a ela devem acorrer os atos judiciais, os atos que restringem a propriedade, os atos constritivos (penhoras, arrestos, sequestros, embargos), mesmo de caráter acautelatório, as declarações de indisponibilidade, as ações pessoais reipersecutórias e as reais, os decretos de utilidade pública, as imissões nas expropriações, os decretos de quebra, os tombamentos, comodatos, as servidões administrativas, os protestos contra a alienação de bem, os arrendamentos, as parcerias, enfim, todos os atos e fatos que possam implicar a alteração jurídica da coisa, mesmo em caráter secundário, mas que possa ser oponível, sem a necessidade de se buscar alhures informações outras, o que conspiraria contra a dinâmica da vida[68].

Segundo o conceituado registrador, na 2.ª Jornada Ibero-Americana de Derecho Registral, efetivada em Cuba, de 16 a 19 de maio de 2001, a delegação brasileira deu especial ênfase ao princípio da concentração, merecendo destaque na relatoria final, onde se fez consignar a seguinte passagem: “Estudiar la propuesta del Delegado brasileño con relación al principio de la concentración de los actos administrativos y judiciales de manera que estén contenidos en el folio real a fin de poseer una verdadera historia de la finca”[69].

A ideia lançada precisa ser desenvolvida, ou melhor amadurecida, pois atrai para o Registro de Imóveis qualquer informação relevante do imóvel, jurídica e até fática, mesmo que para finalidade meramente declaratória. O princípio ainda não foi totalmente aceito e difundido, pois é tratado como efeito ou característica do Registro de Imóveis, já que se trata de vocação natural do órgão a publicidade de fatos jurídicos ligados à propriedade, efeito esse corroborado em virtude da territorialidade, de forma que entendemos impossível afastar a discussão da taxatividade dos atos registrários.

Destarte, deixar ao arbítrio do registrador imobiliário ou demais órgãos operadores do direito o entendimento de fato relevante juridicamente para se dar publicidade por meio de averbação é temeroso para a segurança jurídica e deve ser afastado de pronto. Adverte Marta Valls Teixidó e Mercedes Tormo Satonja que “no debemos tampoco convertir nuestros Registros en un conglomerado de informaciones que no tengan verdadera trascendencia. Se trata de incorporar al Registro únicamente la información que sea útil y además de la forma más clara posible y con una duración determinada según los casos para facilitar su cancelación”[70].

O sistema de registros públicos brasileiro, e em especial o Registro de Imóveis, tem-se tornado exemplo para o mundo, principalmente por sua seriedade e eficácia, de sorte que o efeito da concentração deve ser aplicado somente em casos em que a publicidade é necessária, especialmente em situações que possam trazer alguma limitação ou restrição ao direito de propriedade. Nesse propósito, questões ligadas ao meio ambiente se enquadram perfeitamente, pois além de ordem pública estão protegidas pela CF. O princípio da publicidade ambiental também corrobora a possibilidade de o Registro de Imóveis averbar determinadas informações. Foi esse princípio que trouxe ao Registro de Imóveis a possibilidade de averbação da reserva legal para imóveis rurais e do ato definitivo de tombamento de bens imóveis[71].

Com efeito, a palavra princípio em sua raiz latina, significa “aquilo que se torna primeiro” (primum capere), designando começo, ponto de partida. Segundo José Cretella Júnior, “são proposições básicas, fundamentais, típicas, que condicionam todas as estruturas subseqüentes”.[72] Por essa razão, entendemos que a concentração é de suma importância para a evolução e desenvolvimento do Registro de Imóveis no Brasil, mas não como repositório de qualquer informação na matrícula do Registro de Imóveis. O Registro de Imóveis na verdade não concentra informações, mas reflete os atributos do direito de propriedade que atualmente deve respeitar contornos socioambientais e urbanísticos. Publicizar informações relativas ao direito de propriedade sempre foi a função do Registro de Imóveis, devemos entender tudo isso como uma evolução do direito de propriedade e refletida de forma eficaz no fólio real.

Sobre a taxatividade dos atos registrários, pelo brilhantismo das ideias, oportuno transcrever a lição de Dr. Ricardo Henry Marques Dip:

No que concerne à terceira proposição – os mesmos direitos reais, sabidamente, são elencados no direito brasileiro em numerus clausus –, concede-se juxta modum. É certo que se adotou no direito pátrio o critério da taxatividade dos direitos reais, mas cabe ao intérprete dizer quais dos direitos alinhados são reais e quais não o são, o que, de conseguinte, afasta um critério de oficialidade literal (a direta doutrina do sens clair normative).

A proposta de conclusão sub examine – os fatos suscetíveis de registro estão igualmente previstos de modo taxativo na Lei de Registros Públicos – não se infere das premissas. Desde o plano estritamente lógico-formal não se pode extrair da taxatividade dos direitos reais uma correlata enumeração exaustiva dos atos suscetíveis de registração predial. Apropositam-se a isso alguns tantos fundamentos. Primeiro, o de que o registro imobiliário, como visto, destina-se a acolher títulos não-referentes a direitos reais. Segundo, o de que a taxatividade dos direitos reais não implica restrição consequente dos títulos relativos a esses direitos: ter-se-á notado acaso que, na mescla de uma terminologia criticável, o art. 167 da vigente Lei de Registros Públicos, tratando do registro em sentido estrito, não se refere expressamente à propriedade? Mais além: não se diz que espécie de título permitiria o registro – por sinal, declarativo – de aquisição imobiliária por aluvião (arts. 530, II, 536, III, e 538 do CC).

Isso não é nenhuma defectividade da normativa registral, mas próprio de um sistema processual lato sensu, que, por seu caráter fundamentalmente instrumentário, se proporciona mediante uma formulação de subsídio à realização do direito material. Negar que se possa registrar um título no ofício imobiliário porque não o prevê expressamente inscritível a regulativa específica ou lei extravagante é, em síntese, desprezar o caráter instrumental do registro e, no fim e ao cabo, denegar a realização de um direito que, recognoscível na ordem substantiva, não poderia já efetuar-se. Seria, guardadas as distinções, o mesmo que dizer que o locador tem direito a reaver o imóvel de um locatário inadimplente, e negar-lhe toda possibilidade de manejar uma ação de despejo[73].

Sérgio Jacomino esclarece que

[…] na verdade o objeto do registro são fatos jurídicos que de algum modo influem sobre esses direitos. Os direitos em si considerados são realidades cuja existência, na esmagadora maioria dos casos, pressupõe o próprio registro; são realidades consequentes ou do fenômeno registral (art. 676 do CC) ou de fatos típicos referidos na lei (art. 530 do CC.)[74]

O direito ambiental é prova inequívoca da não-taxatividade dos atos registráveis, porque, como foi consignado no presente estudo, os Estados e Municípios também estão autorizados constitucionalmente a legislar sobre meio ambiente – observados os limites constitucionais – e, por conseguinte, criar materialmente institutos, inclusive fixando a necessidade de publicidade no Registro de Imóveis. Assim, a publicidade de institutos protetores do direito ambiental deve ocorrer no Registro de Imóveis não somente pela adoção do princípio da concentração, mas também pela aceitação da não-taxatividade dos atos registrários e principalmente em razão da permissão constitucional material de Estados e Municípios legislarem sobre a matéria.

O sistema de registros públicos brasileiro, e em especial o Registro de Imóveis, tem-se tornado exemplo para o mundo, principalmente por sua seriedade e eficácia, de sorte que o efeito da concentração deve ser aplicado somente em casos que a publicidade é necessária, especialmente em situações que possam trazer alguma limitação ou restrição ao direito de propriedade. Nesse propósito, questões ligadas ao meio ambiente se enquadram perfeitamente, pois além de ordem pública estão protegidas pela CF. O princípio da publicidade ambiental também corrobora a possibilidade de o Registro de Imóveis averbar determinadas informações. Foi esse princípio que trouxe ao Registro de Imóveis a possibilidade de averbação da reserva legal para imóveis rurais e do ato definitivo de tombamento de bens imóveis.[75]

No âmbito registral a informação ambiental ganha cada vez mais relevância, tanto que vem ganhando, também, importância em seu aspecto negativo. A Corregedoria-Geral da Justiça de São Paulo decidiu que “a menção à inexistência de reserva legal de compensação, aproveitando a averbação de inscrição do CAR, mostra-se adequada, como forma de reduzir o risco de descumprimento das regras e, principalmente, alcançar o escopo último da norma legal, isto é, a preservação ambiental”[76].

Assim, entendemos que os atos registráveis (lato senso) não são taxativos, malgrado os direitos sejam numerus clausus, aplicando-se o efeito da concentração para interpretar o art. 246 da Lei 6.015/73, permitindo a averbação de qualquer ato que altere o registro, outorgando publicidade para casos não expressamente autorizados pela Lei 6.015/73; mas que, de qualquer forma, mesmo reflexamente, possam limitar o direito de propriedade ou ainda de grande relevância para o direito inscrito, justificando o ingresso por meio de averbação de institutos decorrentes do direito ambiental, estabelecendo-se uma fusão entre as publicidades ambiental e registral.[77]

Nesse sentido, já se pronunciou a CG do Estado de São Paulo consagrando a não taxatividade do rol do art. 167, II, da Lei 6.015/73, quando analisou a averbação da reserva legal (Processo CG 53873 – decisão proferida em 30 de janeiro de 1980) e áreas contaminadas (Processo CG 167/2005).

Observe-se, outrossim, que o Brasil subscreveu e ratificou o texto da Convenção sobre Diversidade Biológica, assinada durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente realizada na cidade do Rio de Janeiro em 1992 (Dec. Legislativo 2, de 3 de fevereiro de 1994). Nessa oportunidade, houve o compromisso de disponibilizar as informações ambientais de todas as formas possíveis à população, e os tratados e acordos internacionais passaram a integrar os direitos e as garantias fundamentais constitucionais e são normas de aplicação imediata ou auto-executáveis (§§ 2º e 3º do art. 5º da CF).

4 Espaços territoriais especialmente protegidos

A princípio, é preciso esclarecer que o objeto do estudo é autorizar a publicidade de espaços territoriais protegidos ou de relevância ambiental, de forma que serão afastados quase todos os grandes ecossistemas ou biomas brasileiros, dos quais a Floresta Amazônica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato-Grossense e a Zona Costeira que expressamente fazem parte do patrimônio nacional (art. 225, § 4º, da CF), excetuando a Mata Atlântica que estudaremos em capítulo próprio.

Os administrativistas foram os primeiros a estudar as limitações do direito de propriedade, utilizamos os critérios e nomenclaturas de Hely Lopes Meirelles, para o saudoso professor, intervenção na propriedade privada é “todo ato do Poder Público que compulsoriamente retira ou restringe direitos dominiais privados ou sujeita o uso de bens particulares a uma destinação de interesse públicos”[78]. Seguindo intervenção na propriedade privada como gênero, teríamos como espécies as desapropriações, as servidões administrativas, as requisições, as ocupações temporárias e as limitações administrativas.

Referida classificação não basta para o direito ambiental na medida em que existe conformação de referidas restrições ao próprio conceito de direito de propriedade. Embora não possamos confundir ou restringir as limitações à propriedade decorrentes do direito ambiental à função social ambiental e sim, exigir uma coerência ou conformidade, preferimos utilizar a classificação ambientais para compreender as intervenções na propriedade decorrentes do direito ambiental. Nesse propósito, devido aos critérios elucidativos e didáticos utilizados pelo professor Édis Milaré, serão adotados seus conceitos e suas classificações de espaços territoriais especialmente protegidos.[79] Segundo o conceituado autor,

[…] espaços territoriais especialmente protegidos são espaços geográficos, públicos ou privados, dotados de atributos ambientais relevantes, que, por desempenharem papel estratégico na proteção da diversidade biológica existente no território nacional, requerem sua sujeição, pela lei, a um regime de interesse público, através da limitação ou vedação do uso dos recursos ambientais da natureza pelas atividades econômicas[80].

Na grande maioria das vezes, a natureza jurídica dos espaços territoriais especialmente protegidos se confunde com a limitação administrativa que:

[…] é toda imposição geral, gratuita, unilateral e de ordem pública condicionadora do exercício de direitos ou de atividades particulares às exigências do bem-estar social[81].

Não obstante, o conceito daquela é muito mais abrangente e completo porque, além das propriedades particulares, também engloba as áreas públicas e outros institutos como a servidão administrativa que impõe um ônus ao proprietário de suportar a proteção.

Essa é a definição de José Afonso da Silva:

Espaços territoriais especialmente protegidos são áreas geográficas públicas ou privadas (porção do território nacional) dotadas de atributos ambientais que requeiram sua sujeição, pela lei, a um regime jurídico de interesse público que implique sua relativa imodificabilidade e sua utilização sustentada, tendo em vista a preservação e proteção da integridade de amostras de todas as diversidades de ecossistemas, a proteção ao processo evolutivo das espécies, a preservação e proteção dos recursos naturais.[82]

Mas não serão todos os espaços territoriais especialmente protegidos que serão estudados, nos ensinamentos de Jose Siméon,

[…] las limitaciones que nos interesan son aquellas que tocan, pues, al contenido de la propriedad, afectando a sus usos (clasificación Del suelo a causa Del planamiento, zonas protegidas), confiririendo determinados derechos (derechos de emisión), o iniciando o ejecutando medidas correctoras de proteción medioambiental.[83]

Assim, podemos materializar quatro categoriais fundamentais de espaços territoriais especialmente protegidos, quais sejam: as Áreas de Proteção Especial (APE), a Área de Preservação Permanente (APP), a Reserva Legal (RL) e as Unidades de Conservação (UC). Posteriormente, analisaremos outros espaços protegidos relevantes para o direito ambiental brasileiro tais como a servidão florestal, terras indígenas, florestas públicas e limitações ambientais provisórias.

4.1 Áreas de Proteção Especial

A finalidade desses espaços é a prevenção contra a lesão a bens e valores estratégicos, principalmente decorrentes da urbanização. Assim, as áreas estão definidas, a princípio, no contexto de parcelamento de solo para implantação de loteamento. Na Lei 6.766/79, encontramos vários desses espaços, o art. 13, I, define áreas de interesse especial, “tais como as de proteção aos mananciais ou ao patrimônio cultural, histórico, paisagístico e arqueológico, assim definidas por legislação estadual ou federal”. O art. 3º, III, não permite o parcelamento “em áreas de preservação ecológica ou naquelas onde a poluição impeça condições sanitárias suportáveis, até a sua correção”. Estudaremos a publicidade no Registro de Imóveis das áreas de proteção e recuperação dos mananciais e das áreas contaminadas (poluição).

4.1.1 Áreas de Proteção e Recuperação aos Mananciais (APRM)

Manancial é qualquer corpo d’água, superficial ou subterrâneo, utilizado para abastecimento humano, industrial, animal ou irrigação. A Lei Estadual de São Paulo 9.866/97 considera mananciais as águas interiores subterrâneas, superficiais, fluentes, emergentes ou depósito, efetiva ou potencialmente utilizáveis para abastecimento público (§ único do art. 1º). Referida lei criou as APRM estabelecendo diretrizes e normas para a proteção e recuperação das bacias hidrográficas dos mananciais.

Trata-se de limitação administrativa porque o uso das APRM é legalmente protegido e restrito; restrição essa que engloba a infra-estrutura sanitária, o controle e o monitoramento da qualidade ambiental. Não se confundem, porém, com as áreas de proteção permanente, coincidindo quase sempre em razão da exigência de faixas ao longo de rios, lagos e represas e outros cursos d’água. Trata-se de limitação mais abrangente, cuja maior finalidade é a preservação das reservas hídricas, podendo abranger uma área muito maior, necessária à preservação do ecossistema, garantindo a integridade dos recursos hídricos. A Lei paulista, sem dúvida, é provida de evidente avanço ambiental. A razão é justificada porque São Paulo é o Estado em que as áreas de mananciais sofreram maiores danos em virtude do crescimento urbano desordenado.

As APRM, suas Áreas de Intervenção e respectivas diretrizes e normas ambientais e urbanísticas de interesse regional serão criadas por lei estadual, cabendo aos municípios incorporar as diretrizes e normas ambientais e urbanísticas de interesse para a preservação, conservação e recuperação dos mananciais, definidas pela lei específica da APRM (arts. 18 e 19 da Lei Estadual 9.866/97). Cada lei da APRM estabelecerá as restrições necessárias à proteção ou conservação da área.

Com relação à publicidade das APRM a Lei foi ousada, in verbis:

Art. 28. O licenciamento de construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos, usos e atividades em APRM por qualquer órgão público estadual ou municipal dependerá de apresentação prévia de certidão do registro de imóvel que mencione a averbação das restrições estabelecidas nas leis específicas para cada APRM

§ 1º As certidões de matrícula ou registro que forem expedidas pelos Cartórios de Registro de Imóveis deverão conter, expressamente, as restrições ambientais que incidem sobre a área objeto da matrícula ou registro, sob pena de responsabilidade funcional do servidor.

§ 2º A lei específica de cada APRM deverá indicar o órgão da administração pública responsável pela expedição de certidão que aponte as restrições a serem averbadas.

§ 3º Caberá ao órgão público normalizador de cada lei específica da APRM comunicar aos respectivos Cartórios de Registro de Imóveis as restrições contidas em cada lei. [grifo do autor]

A especialização das APRM é mais complexa que a da RLF porque a descrição será fornecida pelo órgão competente de toda a área protegida, de sorte que a análise do registrador imobiliário será difícil. Seria conveniente que o órgão consignasse expressamente quais as matrículas ou transcrições atingidas pela proteção ambiental, lançando, o oficial, a averbação e relatando a existência de área de proteção e recuperação a manancial conforme lei estadual, mapa e memorial descritivo arquivado no cartório, e, ainda, observando que muitas vezes a proteção recai sobre lençol freático e sua localização é dificultada geograficamente.[84] Dessa forma, malgrado a especialização das APRM seja possível, não se trata de regra absoluta e indispensável, sendo mais relevante a publicidade das restrições decorrentes da instituição da área do que sua própria demarcação.

O Conselho Superior da Magistratura do Estado de São Paulo na ApCív 575-6/5, da Comarca de São Bernardo do Campo, de 29 de janeiro de 2007, entendeu de suma importância o conhecimento pelo Registro de Imóveis das restrições ambientais decorrentes da área de proteção ao manancial para a correta observância na qualificação dos documentos a ele submetidos.[85] Trata-se, sem dúvida, de informação importantíssima não somente pela necessidade da publicidade ambiental, mas também para o registrador imobiliário que deverá impedir o parcelamento da área em razão do art. 3º, V, da Lei 6.766/79; ou, ainda, exigir licença de instalação da Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (CETESB), no caso de São Paulo, no simples desdobro de lote, já que existe orientação administrativa no sentido da dispensa da licença no desdobro de poucos lotes.[86] [87]

4.1.2 ÁREAS CONTAMINADAS (AC)

Para compreender o conceito de Área Contaminada (AC), deve-se, inicialmente, estudar o conceito de poluição. A Lei de Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981) dá uma abrangente definição de poluição:

A degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente:

a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população;

b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas;

c) afetem desfavoravelmente a biota;

d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente;

e) lancem materiais ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos (art. 3º, III).

Assim, sucintamente, as AC são espaços geográficos que foram poluídos com qualquer tipo de substância ou resíduo.

No Estado de São Paulo foi publicada a Lei nº 13.577, de 08 de julho de 2009 que dispõe sobre o gerenciamento de áreas contaminadas no Estado e traz conceitos importantes além, é claro, de segurança jurídica para o cadastro de áreas contaminadas que anteriormente era alicerçado em leis genéricas de poluição do solo, vejamos:

“Área Contaminada: área, terreno, local, instalação, edificação ou benfeitoria que contenha quantidades ou concentrações de matéria em condições que causem ou possam causar danos à saúde humana, ao meio ambiente ou a outro bem a proteger;

Área Contaminada sob Investigação: área contaminada na qual estão sendo realizados procedimentos para determinar a extensão da contaminação e os receptores afetados;

Área com Potencial de Contaminação: área, terreno, local, instalação, edificação ou benfeitoria onde são ou foram desenvolvidas atividades que, por suas características, possam acumular quantidades ou concentrações de matéria em condições que a tornem contaminada;

Área Remediada para o Uso Declarado: área, terreno, local, instalação, edificação ou benfeitoria anteriormente contaminada que, depois de submetida à remediação, tem restabelecido o nível de risco aceitável à saúde humana, considerado o uso declarado;

Área Suspeita de Contaminação: área, terreno, local, instalação, edificação ou benfeitoria com indícios de ser uma área contaminada;

Cadastro de Áreas Contaminadas: conjunto de informações referentes aos empreendimentos e atividades que apresentam potencial de contaminação e às áreas suspeitas de contaminação e contaminadas, distribuídas em classes de acordo com a etapa do processo de identificação e remediação da contaminação em que se encontram;

Remediação de área contaminada: adoção de medidas para a eliminação ou redução dos riscos em níveis aceitáveis para o uso declarado”;

Observamos, a princípio, que o Cadastro de Áreas Contaminadas é amplo, extenso, contendo informação não somente sobre a área contaminada propriamente dita, mas também sobre áreas suspeitas e potencialmente contaminadas.

Ingressa no Registro de Imóveis tão-somente as áreas efetivamente contaminadas segundo o art. 24, “classificada a área como Área Contaminada, o órgão ambiental competente adotará as seguintes providências:

– cadastrar a área no Cadastro de Áreas Contaminadas como uma Área Contaminada;

II – informar os órgãos de saúde, quando houver riscos à saúde humana;

III – determinar ao responsável legal pela área contaminada que proceda, no prazo de até 5 (cinco) dias, à averbação da informação da contaminação da área na respectiva matrícula imobiliária;

IV – notificar os órgãos públicos estaduais envolvidos, as Prefeituras Municipais e os demais interessados;

V – notificar o órgão responsável por outorgas de direito de uso de águas subterrâneas na área sob influência da área contaminada, para que promova o cancelamento ou ajustes nos atos de outorga;

VI – iniciar os procedimentos para remediação da área contaminada em sintonia com as ações emergenciais já em curso;

VII – exigir do responsável legal pela área a apresentação de Plano de Remediação.

Parágrafo único – Na impossibilidade de identificação ou localização do responsável legal pela área contaminada, ou em sua omissão, deverá o órgão ambiental competente oficiar ao Cartório de Registro de Imóveis com vistas a que seja divulgada, conjuntamente com as demais informações referentes à matrícula do imóvel, a contaminação da área”.

Lei Complementar do Estado do Rio Grande do Norte 272, de 3 de março de 2004, considera AC

[…] toda porção territorial que contenha quantidades ou concentrações de resíduos, substâncias ou produtos em condições tais que causem ou possam causar danos à saúde humana ou ao meio ambiente.

Dec. 42.319, de 21 de agosto de 2002, da Prefeitura do Município de São Paulo (art. 2º) define que AC é

[…] aquela onde comprovadamente há poluição causada por quaisquer substâncias ou resíduos que nela tenham sido depositados, acumulados, armazenados, enterrados ou infiltrados, e que causa impacto negativo à saúde humana e ao meio ambiente.

Diversas são as leis que tratam da poluição. Dentre as principais, podemos relacionar as seguintes: a citada Lei Federal 6.938/81 (Política Nacional do Meio Ambiente); Leis Estaduais (SP) 9.509/97 (Política Estadual do Meio Ambiente), 997/1997 (controle de poluição); 6.134/88 (preservação dos depósitos naturais de águas subterrâneas); 898/75 (uso do solo para proteção dos mananciais); 7.663/91 (política de recursos hídricos); 7.750/92 (política de saneamento); 9.999/98 (uso de zonas industriais sob o critério de contaminação de solo). No Estado de São Paulo, o Dec. 8.468/76 que regulamentou a Lei 997/76, nos arts. 5º e 6º, estabelece a atuação da CETESB para o problema de áreas contaminadas, considerando-as como um fator nocivo ao meio ambiente, e citando a integração na esfera municipal.

A Lei de Parcelamento de Solo (6.766/79) não permite o parcelamento em áreas poluídas:

Art. 3º […]

§ único. Não será permitido o parcelamento do solo:

[…]

II – em terrenos que tenham sido aterrados com material nocivo à saúde pública, sem que sejam previamente saneados;

[…]

V – em áreas de preservação ecológica ou naquelas onde a poluição impeça condições sanitárias suportáveis, até a sua correção.

Para se obter uma ideia da dimensão do problema, em todo o Estado de São Paulo, em outubro de 2003 eram catalogadas 726 áreas contaminadas, ou suspeitas de contaminação, segundo informação da CETESB,em novembro de 2007 esse número era de 2.272 e em dezembro de 2013 totalizava 4.771 as áreas[88] e em dezembro de 2017, 5.942[89].

A publicidade das áreas contaminadas ocorre de forma contrária dos demais institutos estudados, nos quais se busca que o conhecimento a terceiros ajude na preservação dos espaços especialmente protegidos; neste caso está se dando publicidade do que não deveria acontecer com uma propriedade, ou seja, a poluição.

Levar ao Registro de Imóveis às áreas contaminadas pode impedir que aconteçam casos como um muito divulgado na imprensa, ocorrido em São Paulo no Condomínio Barão de Mauá. A Cofap jogou seus resíduos industriais num aterro clandestino entre 1960 e 1980. Na década seguinte, a Construtora SQG ergueu um condomínio onde vivem quatro mil pessoas. A contaminação do subsolo por resíduos cancerígenos e gases inflamáveis veio à tona no final de 1990, quando uma caixa-d água explodiu, matando uma pessoa.[90]

O órgão natural para a publicidade das AC, indubitavelmente, é o Registro de Imóveis, pelas referidas áreas configurarem fator relevante para a propriedade, já que limitam seu regular uso, sem falar no potencial risco de adquirentes dessas áreas em razão de desconhecimento do problema. Paulo Affonso Leme Machado ensina que “a averbação das informações no Registro Público tem também um caráter de higidez dos contratos, pois pretende afastar a ignorância ambiental dos que queiram contratar relativamente a um determinado imóvel”[91].

A Espanha foi o primeiro país a utilizar o Registro de Imóveis para outorgar publicidade para as AC. Com o Real Dec. 9/2005 foi possível a publicidade de AC por meio de três formas, todas pelas notas marginais (averbações) que correspondem à mera publicidade-notícia:

I – áreas potencialmente contaminadas: dando publicidade de declarações constantes das escrituras públicas envolvendo empresas cujo objeto social inclui atividade potencialmente contaminante;

II – investigação de áreas contaminadas:quando a autoridade ambiental solicita certidão (certificación) de imóvel em processo de investigação, o registrador lançará em nota marginal a expedição da certidão que deu início ao processo investigatório; e

III – áreas contaminadas: resolução administrativa da autoridade ambiental declarando o solo como contaminado.

O Brasil, seguindo exemplo espanhol, também permitiu a publicidade das áreas contaminadas no Registro de Imóveis. Foi publicada, no dia 12 de junho de 2006, Decisão Normativa da CG do Estado São Paulo 167/2005 disciplinando a possibilidade de averbação enunciativa ou de mera notícia, no Estado, de termo ou declaração de AC oficialmente emitidos pela CETESB.[92]

Os critérios estabelecidos na decisão normativa para a averbação das áreas comprovadamente contaminadas são objetivos e conferem segurança para a publicidade dessas áreas, dependendo inclusive de notificação dos proprietários e detentores de direito real, além da prévia identificação do imóvel e sua correspondência com matrícula ou transcrição.

A decisão autorizou a publicidade registral de áreas contaminadas por substâncias tóxicas e perigosas para a saúde humana, silenciando com relação às substâncias contaminantes. Entendemos que o ideal é que as substâncias que contaminam o solo devem ser incluídas, não somente no termo de AC, mas também na consequente averbação; é preciso conferir a maior publicidade possível ao ato. O que não pode ocorrer – e isso contraria a certeza necessária de que os atos registrários devem conter – é ser enviada ao fólio real informação de mera suspeita de contaminação, imprecisa e vaga. Importante consignar que a notícia das substâncias contaminadas somente será possível quando a área contaminada estiver contaminada, o que pode não ser possível quando estiver sob investigação.

Importante ressaltar, outrossim, que o ato normativo fixou e identificou a responsabilidade pelo fornecimento das informações que é – e não poderia ser diferente – do órgão ambiental respectivo. Ao Registro de Imóveis cabe tão-somente publicizar as informações identificadas e delimitadas no cadastro ambiental da autoridade ambiental, que deve tomar todas as providências e cautelas possíveis para somente enviar a notícia quando todos os procedimentos técnicos forem utilizados para a constatação inequívoca.

No Estado de São Paulo a publicidade ambiental das áreas contaminadas sofreu nova regulamentação normativa. Em razão de previsão específica do Capítulo XX das Normas de Serviço, existe a previsão de averbação de informação de classificação da área, pela CETESB, como Área Contaminada sob Investigação (ACI); informação de classificação da área, pela CETESB, como Área Contaminada com Risco Confirmado (ACRi); e informação de classificação da área, pela CETESB, como Área Reabilitada para o Uso Declarado (AR)[93]. A averbação de qualquer das hipóteses de áreas contaminadas poderá ser realizada de forma gratuita pela CETESB ou qualquer pessoa[94] [95].

Os requisitos constantes da decisão 167/2005 não constam mais das normas de serviço, sendo atualmente reguladas inteiramente pelas Normas de Serviço (Provimento 58/89), o que se exige é que a informação chegue de forma inequívoca ao Registro de Imóveis, tanto que qualquer pessoa do povo pode procedê-la. Assim, uma certidão do órgão ambiental constando a contaminação basta para a publicidade, inclusive com previsão de troca de informações eletrônicas. Não é necessário do ponto de vista normativo que o proprietário seja previamente notificado, mesmo porque a publicidade ocorrerá erga omnes com a averbação da área contaminada.

Embora a averbação das áreas contaminadas seja uma experiência recente nos direitos registral e ambiental brasileiro, impossível não conjecturar tamanha a utilidade da publicidade, em conferir referido efeito a outras espécies de contaminação. A contaminação por ruído é um exemplo típico; é sabido que o Estado limita utilizando de seu poder de polícia, a emissão de ruídos até um nível aceitável e que não prejudique a saúde humana, não obstante, existem exceções legais em determinadas regiões em que o ruído é admitido em favor de um interesse público maior como o transporte público, por exemplo. Nessas hipóteses, os imóveis situados em regiões próximas a aeroportos e vias férreas (metro) são submetidos a um elevado nível de ruído que afeta, por consequências fáticas, seu valor econômico, merecendo indubitavelmente publicidade registral.

Existem outras hipóteses em que a averbação também seria útil a potenciais compradores, como locais contaminados por moléstia (doenças graves) e até odor, como locais próximos a tratamento de esgoto, usinas de álcool, matadouros etc.

Finalmente, sobre as consequências da publicidade de áreas contaminadas no Registro de Imóveis, ressaltamos que as mesmas não geram incerteza ou perda do valor econômico da propriedade, mas sim maior segurança para o tráfego imobiliário, ou nas palavras de Francisco de Asís Palácios, Registrador de Priego de Córdoba, Espanha, no XV Congresso Internacional de Direito Registral (CINDER), realizado em 2005 em Fortaleza:

O proprietário pode não se interessar na publicidade se estiver vendendo um imóvel contaminado, mas com certeza fará questão de ter conhecimento dessa circunstância quando for comprador.

4.2 Área de preservação permanente (APP)

Consideram-se de preservação permanente, segundo o Código Florestal, a área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas (artigo 3º, inciso II).

São florestas e demais formas de vegetação que não podem ser removidas, tendo em vista a sua localização. Define o Código Florestal as áreas de preservação permanente (art. 4º): I – as faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e intermitente, excluídos os efêmeros, desde a borda da calha do leito regular, em largura mínima de a) 30 (trinta) metros, para os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de largura; b) 50 (cinquenta) metros, para os cursos d’água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura; c) 100 (cem) metros, para os cursos d’água que tenham de 50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura; d) 200 (duzentos) metros, para os cursos d’água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura; e) 500 (quinhentos) metros, para os cursos d’água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros; II – as áreas no entorno dos lagos e lagoas naturais, em faixa com largura mínima de: a) 100 (cem) metros, em zonas rurais, exceto para o corpo d’água com até 20 (vinte) hectares de superfície, cuja faixa marginal será de 50 (cinquenta) metros; b) 30 (trinta) metros, em zonas urbanas; III – as áreas no entorno dos reservatórios d’água artificiais, decorrentes de barramento ou represamento de cursos d’água naturais, na faixa definida na licença ambiental do empreendimento; IV – as áreas no entorno das nascentes e dos olhos d’água perenes, qualquer que seja sua situação topográfica, no raio mínimo de 50 (cinquenta) metros[96];  V – as encostas ou partes destas com declividade superior a 45°, equivalente a 100% (cem por cento) na linha de maior declive; VI – as restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues; VII – os manguezais, em toda a sua extensão; VIII – as bordas dos tabuleiros ou chapadas, até a linha de ruptura do relevo, em faixa nunca inferior a 100 (cem) metros em projeções horizontais; IX – no topo de morros, montes, montanhas e serras, com altura mínima de 100 (cem) metros e inclinação média maior que 25°, as áreas delimitadas a partir da curva de nível correspondente a 2/3 (dois terços) da altura mínima da elevação sempre em relação à base, sendo esta definida pelo plano horizontal determinado por planície ou espelho d’água adjacente ou, nos relevos ondulados, pela cota do ponto de sela mais próximo da elevação; X – as áreas em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros, qualquer que seja a vegetação; XI – em veredas, a faixa marginal, em projeção horizontal, com largura mínima de 50 (cinquenta) metros, a partir do espaço permanentemente brejoso e encharcado.

A natureza jurídica da APP é de limitação administrativa, não pode ser manejada de forma a sofrer cortes rasos, pois deixaria de cumprir sua missão específica. A supressão da APP deve respeitar os limites impostos no Código Florestal, ou seja, somente poderá ser autorizada em caso de utilidade pública ou de interesse social, devidamente caracterizados e motivados em procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto, dependerá de autorização do órgão ambiental estadual competente[97].

Problema reiteradamente enfrentado pelos registradores imobiliários e órgãos públicos é a criação de loteamentos ou condomínios nas margens de represas, rios e demais cursos d’água. Particularmente, na comarca de Araçatuba, em razão do represamento do Rio Tietê para a construção da Usina hidrelétrica de Três Irmãos, esse problema tem se tornado crônico porque existem loteamentos irregulares implantados em área de preservação permanente, ou seja, construídos no limite de cem metros da quota máxima de inundação da represa.

Paulo Affonso Leme Machado, na sistemática do Código Florestal anterior, com muita propriedade, ensinava que

[…] a menos que haja clara e insofismável revogação do Código Florestal para casos especiais, todas as desvirtuações mencionadas podem e devem ser nulificadas, ou pelo Poder Público ou por ação popular a ser utilizada por qualquer cidadão.[98]

São dois os principais argumentos para a não-observância da faixa de cem metros para essas áreas: o primeiro seria que o Município, por lei, integrou a área ao perímetro urbano ou em área de expansão urbana. Isso não pode ser acatado porque, além da resolução do CONAMA previa a hipótese, exige requisitos para assim ser considerada a área e possibilitar a redução para trinta metros a faixa da APP, sem falar que o Código Tributário Nacional também exige requisitos para a cobrança de Imposto Predial e consequente transformação do perímetro da área (art. 32). O segundo argumento seria que as áreas estão desmatadas, mas também se trata de frágil argumento porque o art. 18 do Código Florestal passado previa que:

[…] nas terras de propriedade privada, onde seja necessário o florestamento ou o reflorestamento de preservação permanente, o Poder Público Federal poderá fazê-lo sem desapropriá-las, se não o fizer o proprietário.

O art. 62 da Lei n. 12.651/2012 (novo Código Florestal) estabelece que se houver contratos de concessão ou autorização assinados, anteriormente à Medida Provisória no 2.166-67, de 24 de agosto de 2001, a faixa da Área de Preservação Permanente será a distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima “maximorum”. Referida alteração permitirá num primeiro momento a regularização de inúmeros empreendimentos, uma vez que reduz significativamente a incidência da faixa da área de preservação permanente.

Para se ter uma ideia da alteração legislativa, utilizamos como exemplo o que ocorre com a Usina Três Irmãos na região de Araçatuba-São Paulo. A cota máxima normal de operação é de 328,00m e a cota maxima maximorum é de 328,40m[99]. Portanto, a faixa de área de preservação permanente seria muito pequena.

É preciso ainda observar que o inciso III do art. 4º do Código Florestal traz regra muito genérica ao informar que “as áreas no entorno dos reservatórios d’água artificiais, na faixa definida na licença ambiental do empreendimento, observado o disposto nos §§ 1o e 2o”, bem como observar o art. 4º, § 2o que determina que “no entorno dos reservatórios artificiais situados em áreas rurais com até 20 (vinte) hectares de superfície, a área de preservação permanente terá, no mínimo, 15 (quinze) metros”.

Finalmente o art. 5º obriga a desapropriação das áreas de preservação permanente, na implantação de reservatório d’água artificial destinado a geração de energia ou abastecimento público, conforme estabelecido no licenciamento ambiental, “observando-se a faixa mínima de 30 (trinta) metros e máxima de 100 (cem) metros em área rural, e a faixa mínima de 15 (quinze) metros e máxima de 30 (trinta) metros em área urbana. (Redação dada pela Medida Provisória nº 571, de 2012).

Parece-nos que, ao fixar uma data limite (24 de agosto de 2001), o legislador criou uma regra excepcional, permitindo uma sensível mudança das áreas de preservação permanente nos represamentos até então realizados. O art. 65 permite a regularização de empreendimentos com ocupação em APP, em áreas urbanas consolidadas que não estejam em área de risco.

4.2.1 Importância registral da APP

O art. 3º, III, da Lei 6.766/79 não permite o parcelamento “em áreas de preservação ecológica”. É preciso consignar que a expressão “área de preservação ecológica” se refere a todos os espaços territoriais especialmente protegidos pelas legislações federal e estaduais, neles incluídas as áreas de preservação permanente. Mas a regra não deve ser interpretada com rigor absoluto; não se pode admitir que um lote seja projetado quase que totalmente em APP porque a finalidade do mesmo é a construção e estaria incompatível com a preservação, mas será possível o parcelamento da área (loteamento, desmembramento ou desdobro) em imóvel que possua APP se o lote for atingido em pequena extensão pela limitação administrativa. Caso contrário, bastaria um córrego, lago ou outro curso d’água na área a ser loteada para inviabilizar o empreendimento.

Essas áreas independem do registro, pois a lei, além de lhes dar publicidade, indica com relativa clareza a sua localização. Não obstante, inegável a importância de sua especialização no Registro de Imóveis como caráter didático, já que o proprietário e futuros proprietários teriam ciência da restrição, reforçando a ideia contida na legislação ambiental aumentando-lhes a consciência ecológica. Outra utilidade em se proceder à averbação da APP seria a facilidade do registrador imobiliário constatar uma exclusão no cômputo, em eventual especialização de RLF por vedação expressa do Código Florestal.

Existe facilidade de localização já que a própria lei já apresenta algumas referências, principalmente em margens de cursos d’água. Mas a averbação poderá ser realizada a nosso ver com a apresentação de planta e memorial descritivo subscrito por profissional habilitado (engenheiros florestais ou agronômicos, por exemplo) com o respectivo recolhimento de anotação de responsabilidade técnica (ART) para se ter certeza da especiação.

As APPs serão definidas e especializadas no Cadastro Ambiental Rural – CAR, de forma que uma vez efetivada a inscrição bastará a reprodução no Registro de Imóveis nos mesmo moldes que ocorre com a reserva florestal legal.  

Mas está na legislação tributária uma razão motivadora do interesse dos proprietários em especializar as áreas de preservação permanente. A Lei 9.393, de 19 de dezembro de 1993 – que dispõe sobre o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR) – declara que a APP é excluída do cálculo do imposto (art. 10, § 1º, II, a), e sua especialização no Registro de Imóveis facilitaria a isenção ou não incidência.

Em virtude da expressa indicação da legislação ambiental das APP, fácil sua constatação pelos órgãos públicos; incluído o Registro de Imóveis. Em razão do procedimento de retificação de área agora ser presidido pelo registrador imobiliário (Lei 10.931/2004), este poderá instruir os profissionais técnicos a demarcarem na planta e computarem a APP do imóvel retificando, consignando, inclusive, referida informação na planta.

O Conselho Superior da Magistratura do Estado de São Paulo, em acórdão passado nos autos da ApCív 659-6/9, da Comarca de Brotas, de 22 de fevereiro de 2007, entendeu ser necessária a participação de Secretaria do Meio Ambiente em procedimento de desmembramento e retificação de imóvel localizado na margem de represa e dentro de área de preservação permanente, no entanto, em razão das restrições decorrentes da lei de proteção a manancial[100].

As áreas de preservação permanente configuram um espaço territorial especialmente protegido de máxima proteção. Os casos de intervenção e supressão de vegetação são raros e eram tratados, excepcionalmente, pela Resolução 369 (CONAMA), de 28 de março de 2006, nas hipóteses de utilidade pública, interesse social ou baixo impacto ambiental; esses aspectos possibilitam a intervenção ou supressão de vegetação em APP. A publicidade de referidas áreas pode ser vista como essencial para o Registro de Imóveis e população em geral, deveria ser tratado com prioridade e acessar o fólio real antes mesmo das reservas legais florestais, pela importância ambiente e até econômica que representam.

4.3 Reserva Florestal LEGAL (RFL)

4.3.1 Conceito. Evolução histórica. Base legal.

O advento da Lei 12.651/2012 apresentou uma nova definição de reserva florestal legal, tentando conciliar o instituto com o desenvolvimento econômico e sustentabilidade: Reserva Legal: área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, delimitada nos termos do art. 12, com a função de assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção de fauna silvestre e da flora nativa (art. 3º, III).

A regra é que toda a propriedade imobiliária rural tenha a reserva florestal legal. Conforme o art. 12, “Todo imóvel rural deve manter área com cobertura de vegetação nativa, a título de Reserva Legal, sem prejuízo da aplicação das normas sobre as Áreas de Preservação Permanente, observados os seguintes percentuais mínimos em relação à área do imóvel, excetuados os casos previstos no art. 68 desta Lei:      

I – localizado na Amazônia Legal:

a) 80% (oitenta por cento), no imóvel situado em área de florestas;

b) 35% (trinta e cinco por cento), no imóvel situado em área de cerrado;

c) 20% (vinte por cento), no imóvel situado em área de campos gerais;

II – localizado nas demais regiões do País: 20% (vinte por cento)”.

As exceções são os imóveis rurais de até quatro módulos fiscais, com déficit de reserva em 22/07/2008 (art. 67 do Código Florestal) e imóveis rurais com reserva delimitada segundo a lei do tempo (art. 68, caput, da lei 12.651/2012).

Interessa-nos, no âmbito de nosso estudo, apenas fixarmos a atenção na publicidade registral das reservas florestais legais, deixando para a doutrina especializada os debates sobre o instituto na seara do direito ambiental, porém, é interessante conhecer alguns aspectos históricos.

Tem origem já antiga em nosso direito. No estudo do histórico da RLF são as instruções redigidas por José Bonifácio de Andrada e Silva em 1821, como proposta de nova legislação sobre terras do Patriarca da Independência no exercício da vice-presidente da Junta Governativa de São Paulo, demonstrando sensível preocupação ambiental rara à época:

V – Em todas as vendas que se fizerem e sesmarias que se derem, porá a condição que os donos e sesmeiros deixem, para matos e arvoredos, a sexta parte do terreno, que nunca poderá ser derrubada e queimada sem que se faça nova plantação de bosques, para que nunca faltem as lenhas e madeiras necessárias.

Posteriormente, em 1934, com a publicação de nosso primeiro Código Florestal (Dec. 23.793, de 23 de janeiro de 1934), foi determinado que todas as propriedades imobiliárias do País devessem reservar 25% das florestas. A RLF foi repetida no Código Florestal de 1965 (Lei 4.771, de 15 de setembro de 1965) e atualmente é regulada pela MedProv 2.166-67/2001, lembrando que a EC 32, de 11 de setembro de 2001, no art. 2º, estabeleceu que

[…] as medidas provisórias editadas em data anterior à da publicação desta emenda continuam em vigor até que medida provisória ulterior as revogue explicitamente ou até deliberação definitiva do Congresso Nacional.

O que levou parte da doutrina a chamá-las de “super” medidas provisórias. A área necessária para a configuração da RLF de cada imóvel depende da região do Brasil que se encontra situada, variando entre 20 (sudeste, sul) e 80% (região amazônica).

4.3.2 Reserva florestal legal no Código Florestal de 1965 (Lei nº 4.771)

Antes da promulgação do novo Código Florestal, o legislador expressamente conferia duas formas de publicidade para a reserva florestal legal: a legal, que é a presunção de que a reserva existe na porcentagem estabelecida; e a registral, que configura a sua exata localização e permite um reforço da publicidade e potencialidade exploratória da área rural. A área de RLF era averbada na matrícula do imóvel, no registro de imóveis respectivo, sendo vedada a alteração de sua destinação, nos casos de transmissão, a qualquer título, de desmembramento ou de retificação da área, com as exceções previstas neste Código[101].

A existência da RLF precedia à averbação e especialização no Registro de Imóveis. Uma vez aprovado o projeto no órgão ambiental estadual, o proprietário já ficava vinculado na conservação, preservação ou regeneração do espaço florestal[102].

O Registro de Imóveis operava como reforço de uma publicidade já criada ou definida em outros meios. Importante lembrar que muitas restrições administrativas, agora definidas como espaços territoriais especialmente protegidos[103], já possuem publicidade decorrente da própria lei que as constituiu. Porém, para segurança jurídica e cumprimento de obrigações decorrentes da limitação, seria aconselhável não se confiar somente na publicidade legal, mas também na publicidade imobiliária, para dar conhecimento e vincular definitivamente futuros adquirentes.

A vinculação entre cadastro ambiental e registro, operada no Brasil, recebeu inúmeros elogios em congressos internacionais e passou a ser modelo copiado na Espanha e Portugal, países que, embora não tenham uma previsão legal específica de publicidade registral, entendem ser imprescindível que a informação ambientalmente relevante em face do direito de propriedade, receba publicidade registral[104].

4.3.3 Natureza jurídica

Em razão de expressa disposição contida nos arts 12 e 17 da Lei 12.651/2012, trata-se de limitação administrativa propter rem, é criada no âmbito do Cadastro Ambiental Rural – CAR pela autoridade ambiental. Edis Miláre ensina que o “comando legal de se destinar certo percentual de uma propriedade, para fins de conservação e proteção da cobertura vegetal, caracteriza-se como uma obrigação geral, gratuita, imperativa, unilateral e de ordem pública, a indicar seu enquadramento no conceito de limitação administrativa[105].

4.3.4 NOVO CÓDIGO FLORESTAL – CADASTRO AMBIENTAL RURAL – CAR E RESERVA FLORESTAL LEGAL.

Primeiramente, é preciso considerar como o novo Código Florestal está disciplinando a reserva florestal legal. O Cadastro Ambiental Rural – CAR indubitavelmente configura uma das principais novidades no Código Florestal ao criar no âmbito do Sistema Nacional de Informação sobre Meio Ambiente – SINIMA, e é “registro público eletrônico de âmbito nacional, obrigatório para todos os imóveis rurais, com a finalidade de integrar as informações ambientais das propriedades e posses rurais, compondo base de dados para controle, monitoramento, planejamento ambiental e econômico e combate ao desmatamento” (art. 29).

A inscrição do imóvel rural no CAR deverá ser feita, preferencialmente, no órgão ambiental municipal ou estadual que, nos termos do regulamento, exigirá do possuidor ou proprietário.

O cadastro exclui, expressamente, eventual reconhecimento do direito de propriedade (§ 2º, art. 29), o que não poderia ser diferente em razão da atribuição constitucional prevista no art. 236 da Constituição Federal, mas, numa primeira impressão, rompe a vinculação entre cadastro e registro constante do Código Florestal anterior (§ 8º do art. 16 do Código Florestal, redação dada pela MedProv 2.166-67/2001).

O artigo 18 do novo Código Florestal determina que a área de Reserva Legal deverá ser registrada no órgão ambiental competente por meio de inscrição no CAR. Já o § 4o do referido art. 18 disciplina que “o registro da Reserva Legal no CAR desobriga a averbação no Cartório de Registro de Imóveis, sendo que, no período entre a data da publicação desta Lei e o registro no CAR, o proprietário ou possuidor rural que desejar fazer a averbação terá direito à gratuidade deste ato”.

Uma das maiores características do cadastro ambiental e tem sido alvo de inúmeras críticas de ambientalistas, tem a ver com a sua natureza jurídica. O cadastro tem natureza meramente declaratória e permanente (art. 6º do Decreto Federal nº 7.830/2012) sendo que, enquanto não houver manifestação do órgão ambiental com relação a eventuais pendências ou inconsistências nas informações declaradas, será considerada efetivada e escorreita a inscrição do imóvel no CAR para todos os efeitos legais (§ 2º do art. 7º do Decreto Federal nº 7.830/2012). Trata-se do ponto de vista da proteção ambiental de fenônomeno de grande preocupação porque valida uma informação inicial até a análise ou apuração da autoridade ambiental que demanda necessariamente de grande investimento em tecnologia, treinamento e contratação de profissionais especializados. Não se trata de afastar a boa-fé que é inerente ao mercado como um todo, mas reconher que a obrigação ambiental é sensível ao ponto de não admitir precariedades ou provisoriedades, não podemos utilizar o método declaratório do imposto de renda brasileiro para um cadastro que tem por objeto gerir, controlar e fiscalizar informações ambientais.

4.3.5 A PUBLICIDADE DA RESERVA FLORESTAL LEGAL PERMANECE NA LEI Nº 6.015/73 DE FORMA FACULTATIVA AO PROPRIETÁRIO?

Questão interessante é a permanência na Lei nº 6.015/73 (Lei de Registros Públicos), da direta possibilidade de averbação da reserva florestal legal (art. 167, II, 22). A Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012, não revogou expressamente o dispositivo da Lei de Registros Públicos nem promoveu qualquer alteração, diferentemente de outros diplomas legais, como as leis ns. 4.771/19656.938/1981, 7.754/1989 e 11.428/2006.

Interessante foi o que ocorreu com a conversão da Medida Provisória nº 571, de 25 de maio de 2012, na Lei nº 12.727, de 13 de outubro de 2012, que através do art. 83 revogava expressamente o item 22 do inciso II do art. 167 da Lei no 6.015, de 31 de dezembro de 1973, no entanto, o mesmo recebeu veto presidencial cujas razões valem ser transcritas:

“O artigo introduz a revogação de um dispositivo pertencente ao próprio diploma legal no qual está contido, violando os princípios de boa técnica legislativa e dificultando a compreensão exata do seu alcance. Ademais, ao propor a revogação do item 22 do inciso II do art. 167 da Lei no 6.015, de 31 de dezembro de 1973, dispensa a averbação da Reserva Legal sem que haja ainda um sistema substituto que permita ao poder público controlar o cumprimento das obrigações legais referentes ao tema, ao contrário do que ocorre no próprio art. 18, § 4o, da Lei no 12.651.”

O dispositivo legislativo é revogado – a teor do que dispõe o art. 2º, § 1º, da Lei de Introdução ao Código Civil –, quando é incompatível com a nova lei ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior. Ora, o novo Código Florestal não tratou totalmente da matéria, principalmente de publicidade dos espaços territoriais especialmente protegidos, o que é disciplinado por competência constitucional através de legislação própria, no caso, a Lei nº 6.015/73. No que diz respeito à incompatibilidade, também não verificamos sua incidência porque, como vimos, cadastro e registro possuem funções distintas e o que houve foi o rompimento obrigatório da publicidade até então operada e a criação de uma nova sistemática, qual seja, da publicidade registral facultativa da reserva florestal legal. A incompatibilidade deverá ser formal, de tal maneira que a execução da nova lei seja “impossível sem destruir a antiga”[106].

Com muita clareza, Maria Helena Diniz averba que as leis não se revogam por presunção. É preciso que exista uma antinomia gritante; “havendo dúvida, dever-se-á entender que as leis conflitantes são compatíveis, uma vez que a revogação tácita não se presume”[107]. É o que pregava Carlos Maximiliano ao afirmar que a “incompatibilidade implícita entre duas expressões de direito não se presume; na dúvida, se considerará uma norma conciliável com a outra”.[108]

Aliás, mesmo se não existisse expressa previsão de averbação da reserva florestal legal no Registro de Imóveis, é assunto pacífico no direito registral brasileiro a não taxatividade dos atos de averbação previstos no art. 167, inciso II, da Lei nº 6.015/73, o que é considerado decorrência do efeito ou princípio da concentração[109]. Os atos registráveis (lato sensu) não são taxativos, malgrado os direitos sejam numerus clausus, aplicando-se o efeito da concentração para interpretar o art. 246 da Lei 6.015/73, permitindo a averbação de qualquer ato que altere o registro, outorgando publicidade para casos não expressamente autorizados pela Lei 6.015/73; mas que, de qualquer forma, mesmo reflexamente, possam limitar o direito de propriedade ou ainda de grande relevância para o direito inscrito, justificando o ingresso por meio de averbação de institutos decorrentes do direito ambiental, estabelecendo-se uma fusão entre as publicidades ambiental e registral.[110] Nesse sentido, já se pronunciou a CG do Estado de São Paulo consagrando a não taxatividade do rol do art. 167, II, da Lei 6.015/73, quando analisou a averbação da reserva legal (Processo CG 53873 – decisão proferida em 30 de janeiro de 1980) e áreas contaminadas (Processo CG 167/2005)”[111]. Edis Milaré também entende que “nada obsta – sendo mesmo recomendável – venha a reserva legal a ser averbada no Cartório do Registro de Imóveis[112].

A jurisprudência, administrativa e judicial, vem decidindo reiteradamente que a averbação da reserva legal florestal é facultativa, já que a matriz ambiental está centralizada no Cadastro Ambiental Rural, o que concordamos face a sistemática adotada[113]

O Conselho Superior da Magistratura de São Paulo decidiu recentemente que “a desobrigação positivada no art. 18, § 4.º, da Lei n.º 12.651/2012 não se contenta com a mera inscrição do bem imóvel rural no CAR. Não basta a comprovação de sua realização; é necessário que se demonstre a especialização da reserva legal. Por isso, compete ao Oficial, ao realizar o juízo de qualificação registral, apurar se a inscrição cadastral indicou, em atenção ao inc. III do § 1.º do art. 29 da Lei n.º 12.651/2012[114] ou, conforme a dimensão do imóvel, ao art. 53 do Código Florestal[115], a localização da reserva legal florestal. Sua falta, consequentemente, justificará a recusa do título, orientada pelo princípio da legalidade”(Apelação nº 1000891-63.2015.8.26.0362, da Comarca de Mogi-Guaçu, 02/06/2016).

Permanece, assim, a obrigatoriedade do Oficial de Registro de Imóveis, no âmbito da qualificação registral, verificar se existe lançamento da reserva legal no Cadastro Ambiental Rural – CAR. Em São Paulo, através de Termo de Cooperação Técnica assinado em 07 de novembro de 2013, Associação dos Registradores Imobiliários do Estado de São Paulo – ARISP, Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São Paulo e Companhia Ambiental do Estado de São Paulo – CETESB, com a anuência da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo, permitiu o acesso ao CAR de todos os cartórios de Registro de Imóveis do estado, o que facilita muito o controle registral-ambiental.

4.3.6 Cadastro Ambiental público ou oculto?

É impossível proteger bem o que é de todos através do segredo[116]

Paulo Affonso Leme Machado.

O art. 29 da Lei nº 12.651, de 2012, declara que o Cadastro Ambiental Rural – CAR é um “registro público eletrônico” no entanto não é garantida ou explicitada a forma que será público. Por tratar-se de meio eletrônico a publicidade já se tornaria precária, já que a internet, por si não tem alcance a toda a população brasileira, principalmente a rural. Outra falha é a inexistência de publicidade indireta através de certidão, inclusive do próprio cadastro. Não há como o interessado proceder qualquer tipo de pesquisa no CAR, sendo que no próprio sítio do sistema não há menção de tratar de cadastro público[117], sendo possível somente a pesquisa da situação cadastral.

O Decreto nº 7.830, de 17 de outubro de 2012, retira a expressão “público” da definição do CAR, in verbis:  Cadastro Ambiental Rural – CAR – registro eletrônico de abrangência nacional junto ao órgão ambiental competente, no âmbito do Sistema Nacional de Informação sobre Meio Ambiente – SINIMA, obrigatório para todos os imóveis rurais, com a finalidade de integrar as  informações ambientais das propriedades e posses rurais, compondo base de dados para  controle, monitoramento, planejamento ambiental e econômico e combate ao desmatamento”.

O Cadastro Ambiental Rural – CAR nasce com forte vício de criação já que o acesso à informação pública é uma garantia constitucional que não pode ser olvidada por ser direito fundamental (Art. 5º, XXXIII)[118]. Não consta da legislação, nem ao mesmo decreto regulamentador, a possibilidade de publicidade das informações ambientais inscritas para todos os cidadãos. Não se pode hoje acessar o CAR e verificar se determinada propriedade tem a reserva florestal constituída, o cidadão não pode fiscalizar. A publicidade é expressão sinônima de transparência, a clandestinidade que se projeta à reserva florestal legal só interessa para quem não pretende nem ao menos cumprir a reserva legal florestal. É princípio de meio ambiente o acesso à informação irrestrita. Paulo Affonso Leme Machado entende que o CAR “tem dimensão jurídica especial, pois é um registro público”[119], no entanto, o cadastro já implantado em todo o território nacional padece de publicidade por qualquer cidadão e, o mais relevante, até para o Ministério Público.

A própria Instrução Normativa 2/2014 do Ministério do Meio Ambiente reconhece a restrição ao cadastro ambiental, in verbis: “Art. 12. As informações de natureza pública de que trata o inciso V do art. 3o do Decreto no 7.830, de 2012, a serem disponibilizadas pelo SICAR, será limitada”.

As informações ambientais são de uso comum do povo e todos tem direito de fiscalizar. Somente a averbação da reserva florestal legal pelo Cartório de Registro de Imóveis pode sanar a falha contida na legislação. Caso contrário, a retirada da averbação da reserva é sutileza legislativa que aparentemente busca cercar a reserva florestal legal de elementos que irão esvaziá-la substancialmente, aliás, essa técnica já foi usada amplamente na idade média para o cerco ou sítio de cidades e castelos (poliocértica)[120].

O problema da falta de publicidade do Cadastro Ambiental Rural é de difícil solução se a publicidade registral não for utilizada, porque somente o Registro de Imóveis possui os indicadores necessários para oferecer ferramentas de pesquisa úteis para o cidadão que desejar ter acesso às informações ambientais, tais como os indicadores real e pessoal, além de vinculação ao sistema geodésico nacional através de montagem do mosaico registral com imagens de satélite.

4.3.7 PROVIMENTOS NºS 36/2013 E 09/2016 DO ESTADO DE SÃO PAULO (NORMAS DE SERVIÇO DA CORREGEDORIA-GERAL DA JUSTIÇA).

O Provimento nº 36/2013, de 07 de novembro de 2013, bem como sua atualização (Provimento nº 09/2016) procurou conciliar a legislação e jurisprudência em vigor, notadamente o novo Código Florestal com a Lei de Registros Públicos, em especial, a necessidade de averbação e especialização de reserva florestal legal em atos de retificação de registro consagrada no Superior Tribunal de Justiça. De certa forma a alteração normativa de São Paulo acabou por conferir interpretação que deu um sentido para o Código Florestal vigente, reconhecendo o Registro de Imóveis como espelho das informações contidas no cadastro ambiental.

Dessa forma, foi utilizada a ferramenta do cadastro ambiental (CAR-SICAR) para o cumprimento da necessidade de especialização e retificação de reserva florestal legal nas retificações de registro, acrescentando-se, ainda, na necessidade de inscrição ambiental nas modificações das figuras geodésicas dos imóveis como desmembramento e unificações de imóveis, bem como em servidões de passagem que poderiam se sobrepor em áreas ambientais protegidas.

Importante também consignar que a Associação dos Registradores Imobiliários – ARISP, a Secretaria Estadual do Meio Ambiente e a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo – CETESB, formalizaram também, com a anuência da Egrégia Corregedoria-Geral da Justiça, o Termo de Cooperação Técnica para viabilizar o fluxo de informações entre o Cadastro Ambiental Rural (CAR) e os Registros de Imóveis de São Paulo. Com a implantação do referido termo de cooperação, todos os registros de imóveis do Estado terão acesso aos cadastros ambientais e a autoridade terá acesso às respectivas matrículas, visando estabelecer um fluxo de informações para que exista uma comunicação e interação entre cadastro e registro. 

Em São Paulo existe a previsão expressa de averbação do número de inscrição do imóvel rural no Cadastro Ambiental Rural – CAR (item 38, 11, b), cuja obrigatoriedade de exigência pelo Oficial de Registro de Imóveis ficará condicionada ao decurso do prazo estabelecido no § 3.º do artigo 29 da Lei n.º 12.651, de 25 de maio de 2012, ou seja, até 31 de dezembro de 2017, prorrogado pelos Decretos n. 9.257/2017 e 9.395/2018 até 31 de dezembro de 2018 (item 12.5). A averbação poderá ser realizada a requerimento de qualquer pessoa por ser tratar de bem de uso comum do povo.

Interessante e ágil a solução contida no item 12.5.1: “A averbação será feita de ofício pelo Oficial do Registro de Imóveis, sem cobrança de emolumentos, quando do primeiro registro e por meio do Serviço de Registro Eletrônico de Imóveis (SREI), assim que implantados os mecanismos de fluxo de informações entre a Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo (SMA), a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) e a Associação dos Registradores Imobiliários de São Paulo (Arisp), definidos no Acordo de Cooperação Técnica que entre si celebraram”.

Através da sistemática aplicada em São Paulo o Registro de Imóveis acabou por ter consagrada sua função ambiental de forma eficiente porque espelha ou reproduz as informações contidas no Cadastro Ambiental de forma célere, sustentável e eficiente sem maiores formalidades que poderiam interromper o fluxo do direito de propriedade.

A comunicação entre o Registro de Imóveis e o cadastro ambiental ocorre através do chamado espelhamento recíproco, o registro oferece informações do direito de propriedade ao CAR que por sua vez fornece ao registro as informações relevantes da propriedade imobiliária. Um não interfere na função do outro como deve ocorrer para que o fluxo de informações seja confiável e célere.

Prestigiando ainda o entendimento fixado pelo Superior Tribunal de Justiça[121] e Corregedoria Geral de Justiça de São Paulo[122], independentemente do prazo final para a implantação do Cadastro Ambiental previsto no Código Florestal, a averbação da inscrição do CAR é necessária nas “retificações de registro, os desmembramentos, unificações, outros atos registrais modificativos da figura geodésica dos imóveis e o registro de servidões de passagem”, devendo a averbação da especialização da reserva florestal legal ser realizada em ato contínuo, tendo sido criada regra de transição para facilitar a averbação enquanto o sistema eletrônico de comunicação entre Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Cartórios de Registro de Imóveis não estiver operacional[123].

Importante lembrar que o cadastro ambiental tem natureza meramente declaratória e permanente (art. 6º do Decreto Federal nº 7.830/2012) sendo que, enquanto não houver manifestação do órgão ambiental com relação a eventuais pendências ou inconsistências nas informações declaradas, será considerada efetivada e escorreita a inscrição do imóvel no CAR para todos os efeitos legais (§ 2º do art. 7º do Decreto Federal nº 7.830/2012). Assim, para que as informações contidas na matrícula do imóvel tenham eficácia esperada pela publicidade erga omnes, é de toda conveniência que a descrição da reserva florestal legal ingresse no Registro de Imóveis somente quando a mesma for validada ou confirmada pela autoridade ambiente respectiva. Não se pode admitir a publicidade de informações precárias e provisórias, o que abalaria o sistema registrário em razão da não observância do princípio da segurança jurídica.

Assim, para qualquer ato de registro (estrito ou lato sensu), o Oficial de Registro de Imóveis deve exigir uma propostade reserva diretamente no cadastro ambiental, já que a mesma será analisada e validada pela autoridade ambiental em momento oportuno. Consigamos expressamente o termo proposta porque a natureza jurídica do cadastro ambiental é declaratória e as informações serão submetidas ao crivo da autoridade ambiental. Somente após a informação ser confirmada que poderá sofrer publicidade no registro imobiliário.

Em recente decisão, confirmando nosso entendimento, a Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo, entendeu que a averbação da descrição da reserva florestal “só pode ocorrer após o cadastro no SICAR-SP e aprovação dos órgãos de meio ambiente. E, após a edição do mencionado Decreto, haverá, ainda, a necessidade de adesão ao PRA”[124] (PROCESSO Nº 2013/100877).

É possível também a averbação da informação de adesão do interessado ao Programa de Regularização Ambiental (PRA) de posses e propriedades rurais (item 125, d, das Normas de São Paulo). A averbação da especialização da reserva florestal legal, ou seja, da demarcação do perímetro da parcela, não é prova de que na referida área existe uma cobertura florestal. Com efeito, é possível que na área exista uma cobertura florestal menor do que a indicada no art. 12 do Código Florestal e esteja em recuperação conforme o Programa de Regularização Ambiental – PRA, existindo, assim, um passivo ambiental cuja obrigação tem natureza propter rem e acompanha a propriedade imobiliária. Na medida do possível, referida informação é de toda relevância para futuros adquirentes.

4.3.8. Conceito de imóvel rural conforme o novo Código Florestal.

Ao disciplinar o imóvel rural, o novo Código Florestal deixou de expressamente definir qual conceito de imóvel atribuir para fins de cálculo e cômputo dos espaços territoriais especialmente protegidos.

O Código Florestal revogado tinha como base a matriz imobiliária, ou seja, a matrícula, de forma que todos os cálculos relativos ao cômputo da reserva legal florestal tinham como referência a especialidade constante do Registro de Imóveis.

A Instrução Normativa 2, de 5 de maio de 2014, do Ministério de Meio Ambiente, que regulamentou o Cadastro Ambiental Rural – CAR no âmbito nacional entende que deve ser utilizado o conceito constante da Lei de Reforma Agrária (8.625/93) como parâmetro, de forma que as especializações de espaços ambientais no Registro de Imóveis devem ser adaptar a essa realidade porque existiu rompimento com a base anterior.

Entende-se, conforme art. 2º, inciso I, da referida IN n. 2/2014, “ imóvel rural: o prédio rústico de área contínua, qualquer que seja sua localização, que se destine ou possa se destinar à exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal, florestal ou agroindustrial, conforme disposto no inciso I do art. 4ֻº da Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993”.

Assim, abandonou-se o critério geográfico para o de exploração, também utilizado pelo Estatuto da Terra (Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964) e Lei nº 4.947, de 6 de abril de 1966, não podendo os cartórios de Registro de Imóveis exigir uma inscrição do CAR/SICAR para cada matrícula já que poderá ocorrer de um cadastro ambiental conter várias matrículas imobiliárias.

Embora tenha utilizado o mesmo critério para conceituar a propriedade imobiliária, a lei não vinculou o CCIR (Certificado de Cadastro Imobiliário Rural) ao Cadastro Ambiental Rural (CAR), o que nos parece mais uma grande falha da legislação porque existirá uma grande assimetria informativa, já que em tese, é possível a divergência entre matrícula imobiliária e cadastros rural e ambiental.

Em São Paulo, no mesmo sentido, existe expressa observância nas Normas de Serviço do Extrajudicial da Corregedoria Geral da Justiça[125].

4.3.9 Exigibilidade

Obrigatoriedade do CAR

A exigibilidade da especialização da reserva florestal legal segue a sorte da obrigatoriedade para que o Cadastro Ambiental Rural seja realizado. O art. 18 da Lei 12.651/2012, prevê a necessidade de registro da reserva florestal legal no órgão ambiente competente, através do Cadastro Ambiental Rural – CAR. Em atenção ao disposto no § 3º do art. 29, da Lei 12.651, de 2012, “a inscrição no CAR será obrigatória para todas as propriedades e posses rurais, devendo ser requerida até 31 de dezembro de 2017, prorrogável por mais 1 (um) ano por ato do Chefe do Poder Executivo.” (nova redação pela Lei nº 13.295, de 14 de junho de 2016).

Em 29 de dezembro de 2017 foi emitido o Decreto nº 9.257, prorrogando o prazo para a inscrição do CAR para 31 de maio de 2018. Em 30 de maio de 2018 (decreto nº 9.395), novamente o prazo foi prorrogado, desta vez para 31 de dezembro de 2018, data em que se tornou obrigatória a exigência da inscrição no CAR na qualificação registral de imóveis rurais.

Modificação da figura geodésica do imóvel

Não obstante o prazo para a obrigatoriedade de inscrição no CAR, vigora normativamente no Estado de São Paulo o entendimento de que a reserva florestal legal deve ser exigida quando da retificação de registro[126]. Referida orientação normativa teve como fundamento a modificação de entendimento do Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial nº 218.781 (2002/0146843-9), j. 09.12.2009, ainda sob o Código Florestal revogado. No entanto, disciplinou ainda que enquanto não criado o cadastro ambiental rural (CAR) vigorará a necessidade de averbação da reserva florestal legal nas hipóteses de retificação de registro.

Outro fundamento da decisão decorre do próprio princípio da especialidade[127] e do próprio direito de propriedade. Nas retificações de registro existe a especialização do perímetro do imóvel e a reserva florestal legal integra o imóvel em sua essência, devendo também ser especializada suas parcelas. Não podemos olvidar que o imóvel é formado também de parcelas ou (subáreas) internas que integram o mesmo. A Parcela é uma fração (subárea) de um imóvel com regime jurídico único.

Em interessante acórdão do Conselho Superior da Magistratura de São Paulo, analisando a relação do direito de propriedade, foi consignado que a “a reserva legal florestal, nessa linha, revela-se, por força de lei, condição para a propriedade rural cumprir sua função social, sua função socioambiental. É pressuposto da legitimidade do direito de propriedade rural. Consoante o art. 186, I e II, da CF, o aproveitamento racional e adequado do imóvel rural, a utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e a preservação do meio ambiente são requisitos indispensáveis, ao lado de outros, previstos nos seus incs. III e IV, para o cumprimento da função social da propriedade rural”[128].

Com relação à especialidade, interessante e oportuno transcrever trecho das conclusões da Carta de Araraquara que resultou do 19º Encontro Regional de Oficiais de Registros de Imóveis GEO-ARARAQUARA” realizado pelo IRIB de 9 a 11 de julho de 2004[129]:

O imóvel, segundo este conceito, é dividido em tantas partes (parcelas) quantas forem as áreas com regimes jurídicos diferentes. Estas podem ser áreas de domínio, de posse, áreas públicas (como estradas, rios, lagos), ou áreas de restrições como reservas legais, de preservação, servidões administrativas ou legais, etc. Um imóvel é formado por uma ou várias parcelas, mas uma parcela nunca é dividida em vários imóveis. A parcela é subárea do imóvel, nunca o contrário.

A partir do levantamento das “parcelas” poder-se-ão modelar unidades territoriais para os mais diversos fins econômicos, administrativos ou legais com as mais diversas definições do “imóvel”, por exemplo para o Registro de Imóveis (a matrícula registrada com uma definição (…) imóvel é unidade contínua de domínio e para o Incra imóvel é unidade econômica.

Ora, se todo imóvel rural é formado pela parcela rural da reserva legal, nada mais natural que quando do levantamento técnico do perímetro do mesmo, seja também especializada sua parcela de reserva florestal legal. Obviamente referida parcela necessita ser aprovada pela Secretaria Estadual do Meio Ambiente, contudo, a providência seria facilitada já que para promoção da respectiva retificação é necessária a contratação de profissional habilitado para descrever através de coordenadas georreferenciadas ou topografia, metodologia ordinária para descrever o perímetro do imóvel.

Assim, malgrado não exista expressamente a obrigação legal do momento oportuno para a especialização da reserva florestal legal no Registro de Imóveis e afastada a possibilidade de vinculação de qualquer ato de registro estrito, principalmente decorrente de transmissão[130], é difícil não aceitar a necessidade de identificação geodésica da parcela interna legal do imóvel que é a reserva florestal legal quando da readequação descritiva do perímetro que necessariamente ocorre nas retificações de registro promovidas em decorrência do art. 213 da Lei 6.015/73.

Usucapião

O Superior Tribunal de Justiça, em precedente recente, reconheceu que a delimitação da reserva legal florestal, no CAR, apresenta-se como condição para o registro da sentença de usucapião: de acordo com o decidido, a “nova lei não pretendeu reduzir a eficácia da norma ambiental, pretendeu tão somente alterar o órgão responsável pelo ‘registro’ da reserva legal, que antes era o Cartório de Registro de Imóveis, e agora passou a ser o órgão ambiental responsável pelo CAR.”[131]. Entendimento este que foi ratificado pelo Conselho Superior da Magistratura de São Paulo[132].

Exigibilidade da reserva florestal legal em atos de registro.

O advento do novo Código Florestal fixou expressamente as hipóteses em que a inscrição no cadastro ambiental rural deve ocorrer, e, por consequência o lançamento da reserva florestal ou, ainda, adesão ao programa de regularização ambiental – PRA.

A matriz ambiental, como afirmamos, foi transferida do Registro de Imóveis para o cadastro ambiental rural, de forma que o Registro de imóveis, atualmente, apenas reflete, em seus livros, o conteúdo do cadastro, não tem controle mais sobre a existência e criação dos espaços territoriais protegidos. O art. 18 da Lei n. 12.651, de 25 de maio de 2012, dispõe que a área de Reserva Legal deverá ser inscrita no órgão ambiental competente por meio de inscrição no CAR, “sendo vedada a alteração de sua destinação, nos casos de transmissão, a qualquer título, ou de desmembramento”, não consta do texto legal que em referidos atos, inclusive, transmissões, deve existir lançamento no Cadastro Ambiental.

O que não pode ocorrer é transformar o Registro de Imóveis em órgão saneador da ineficiência estatal na fiscalização ambiental e criar uma interpretação contra legem para que se exigir a prévia inscrição e lançamento da reserva legal em qualquer ato de registro. Veja que o prazo para inscrição no CAR já foi prorrogado diversas vezes, por decreto e alteração legislativa, comprovando a dificuldade das autoridades ambientais nessa nova sistemática de fiscalização ambiental.

4.3.10 Especialização/Demarcação

A especialização ou identificação da reserva florestal legal é realizada primeiramente de forma eletrônica no CAR, e de forma reflexa no Registro de Imóveis. A matriz ambiental é o cadastro ambiental rural e não mais o Registro de Imóveis sendo assim, facultativa.

A especialização ou demarcação da reserva legal no Registro de Imóveis sempre foi dificultosa. A RLF – como outras áreas especialmente protegidas – precisam utilizar o princípio da especialidade para localização geodésica da área no imóvel. Narciso Orlandi Neto leciona que

[…] o grande problema da averbação é a especialização da reserva, assim entendida a identificação da área instituída como unidade inconfundível, localizada e localizável dentro do imóvel de que faz parte.[133]

Com efeito, várias são as formas como os imóveis foram descritos desde a criação do Registro de Imóveis e, na grande maioria das vezes, nem mesmo a descrição existe ou, ainda, com divisas imprecisas e frágeis, tornando-se impossível localizar ou especializar a reserva. É claro que o advento da Lei 10.267/2001, que criou o georreferenciamento, resolverá paulatinamente o problema das descrições dos imóveis rurais. No entanto, nessa transição deverá a reserva ser especializada da forma que consta a descrição da matrícula ou transcrição, seja rumo magnético, azimute ou georreferenciamento com coordenadas UTM. O registrador imobiliário deve então esforçar-se para estabelecer um ponto de amarração entre reserva e descrição registrária, mesmo porque, ao contrário da servidão, não se trata de direito real e, sim, de limitações administrativas, não sendo a averbação constitutiva.

Se a reserva for toda interna, encravada, o proprietário descreverá as divisas tecnicamente, mas procurará localizá-la no todo, isto é, fará referência aos principais pontos da descrição que consta do Registro.

A averbação deve ser feita de forma reflexa no Registro de Imóveis através de acesso direto ao CAR. Pode acontecer de a planta não permitir a identificação do mesmo imóvel da matrícula (ou transcrição), principalmente no caso de descrições antigas e descuidadas. Mas a planta não integra a matrícula. Servirá ela para localizar a reserva dentro do todo e ajudar o oficial a controlar a disponibilidade quantitativa e qualitativa do imóvel.[134]

Na legislação anterior, em virtude da averbação não ser constitutiva e existir independentemente do ingresso no fólio real, não deve o registrador imobiliário aplicar com rigor o princípio da especialidade. Nesse sentido é a jurisprudência administrativa da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de São Paulo (PROCESSO Nº 2012/77684 – TANABI – Parecer 206/2012-E, publicada em 14.08.2012)[135].

Resumindo, no âmbito da qualificação registral, o Oficial deve checar, nas hipóteses em que a reserva legal é exigível, se a mesma está especializada no CAR, é a principal função ambiental do Registro de Imóveis. Posteriormente, uma vez aprovada ou validada pelo órgão ambiental, deve transportar referida informação para a matrícula do imóvel, se possível referido transporte de acordo com a compatibilidade descritiva.

Quando a reserva legal for aprovada pelo órgão ambiental a averbação no Registro de Imóveis pode ocorrer através de comunicação eletrônica das informações do CAR, através de checagem pelo Oficial quando do próximo ato de registro a ser realizado, ou ainda quando retificação/georreferenciamento.

Assim, deve-se não confundir a especialidade da reserva legal lançada no cadastro ambiental com a especialidade registral. Optou o legislador, bem ou mal, que o Registro de Imóveis não deve publicar diretamente referidos espaços ambientalmente protegidos. Mas o fato da averbação da especialização registral não existir mais não significa que na desobrigação de, no âmbito da qualificação registral, o Oficial fiscalizar se a reserva florestal legal está lançada no CAR. Trata-se de cumprimento do princípio da legalidade. Uma vez o cadastro ambiental sendo obrigatório.

Nesse sentido acórdão do Conselho Superior da Magistratura de São Paulo:

“Nada obstante, a desobrigação positivada no art. 18, § 4.º, da Lei n.º 12.651/2012, não se contenta com a mera inscrição do bem imóvel rural no CAR. Não basta a comprovação de sua realização; é necessário que se demonstre a especialização da reserva legal. Por isso, compete ao Oficial, ao realizar o juízo de qualificação registral, apurar se a inscrição cadastral indicou, em atenção ao inc. III do § 1.º do art. 29 da Lei n.º 12.651/2012 ou, conforme a dimensão do imóvel, ao art. 53 do Código Florestal, a localização da reserva legal florestal. Sua falta, consequentemente, justificará a recusa do título, orientada pelo princípio da legalidade (Acórdão DJ nº 1025597-86.2015.8.26.0564 – Apelação Cível 
Data inclusão: 15/12/2016).

Finalmente, é preciso distinguir a especialização da reserva florestal legal que é realizada no âmbito eletrônico do Cadastro Ambiental Rural – CAR da efetiva existência de floresta no imóvel. Com efeito, o grau de desenvolvimento florestal não deve ser fiscalizado pelo Oficial de Registro de Imóveis, mas o lançamento e definição da mesma continua sob a competência do registro imobiliário em razão, como dissemos, do princípio da legalidade. Dispõe a Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012, que os imóveis que não possuam reserva florestal mínima devem reflorestar ou aderir ao programa de regularização ambiental previsto no art. 59. Referida adesão, para nós, não deve ser fiscalizada pelo Oficial de Registro de Imóveis porque extrapola o âmbito da qualificação registral.

O Oficial de Registro de Imóveis deve, assim, checar se a reserva florestal lançada no CAR corresponde ao mínimo exigido por lei, ou seja, se corresponde à porcentagem estabelecida no art. 68 do Código Florestal. Não correspondendo, deve desqualificar o título para a demarcação da reserva (com ou sem floresta nativa). A Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo recentemente confirmou que não basta apenas o mero cadastro no sistema, é preciso que exista lançamento da reserva legal respectiva nos moldes exigidos pela legislação[136].

A jurisprudência do STJ é forte no sentido de que a obrigação propter rem de demarcação da reserva florestal existe independentemente de haver área florestal ou vegetação nativa na propriedade (REsp 865.309/MG, Rel. Min.  Castro  Meira,  Segunda  Turma,  julgado  em 23.9.2008, DJe de 23.10.2008;  REsp  867.085/PR.  Ministro  João  Otávio  de  Noronha, Segunda  Turma.  DJ  27/11/2007  p.  293,  e  REsp  821.083/MG, Rel. Ministro  Luiz  Fux,  Primeira  Turma,  julgado em 25.3.2008, DJe de 9.4.2008).

O ato praticado pelo Registro de Imóveis é a averbação da inscrição do imóvel no Cadastro Rural Ambiental – CAR bem como a informação de lançamento da especialização da reserva florestal acompanhado do status da análise do órgão ambiental que pode estar inscrita, em retificação ou validada. Lembrando que as informações ambientais possuem presunção de veracidade até análise posterior. A Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo (Recurso Administrativo n° 100164S-9L2017.S.26.0037, de 10 de julho de 2017), seguindo o entendimento, decidiu que a mera averbação do número do cadastro ambiental rural não supre a necessidade da publicidade registral, devendo constar os lançamentos existentes como reserva legal e ou compensação.

4.3.11 Dispensabilidade de reserva florestal legal em áreas rurais menores que quatro módulos fiscais (art. 67 do Código Florestal)

Dispõe o art. 67 do novo Código Florestal que “nos imóveis rurais que detinham, em 22 de julho de 2008, área de até 4 (quatro) módulos fiscais e que possuam remanescente de vegetação nativa em percentuais inferiores ao previsto no art. 12, a Reserva Legal será constituída com a área ocupada com a vegetação nativa existente em 22 de julho de 2008, vedadas novas conversões para uso alternativo do solo”.

O art. 67 do Código Florestal fala em remanescente de vegetação e não total ausência, de sorte que a doutrina e jurisprudência devem interpretar referido dispositivo[137]. Édis Milaré entende que a razoabilidade deve prevalecer na interpretação, não sendo justificada a dispensa para áreas com mínimo de vegetação mesmo que quase zero e ausência total (Direito do ambiente.  9º edição revista, atualizada e ampliada. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2014, p. 1306. Leonardo Papp entende que a isenção necessita de cobertura florestal mínima, como requisito do regime especial do art. 67. PAPP, Leonardo. Comentários ao novo Código Florestal Brasileiro (Lei 12.651/12). Campinas: Millennium, 2012, p. 252. 

O módulo fiscal está previsto no art. 50, § 2º, da Lei 4.504, de 30/11/64 (utilizado para a composição do Imposto Territorial Rural), e calculado na forma do art. 4 do Decreto nº 84.685, de 06 de maio de 1980. Pela tabela constante da Instrução Especial Incra nº 20, de 1980, o módulo fiscal pode variar de cinco (5) a cem (100) hectares, ou seja, dependendo também da região do país, assim, imóveis entre vinte (20) e quatrocentos (400) hectares estariam dispensados de possuir reserva florestal legal caso tenha ocorrido desmatamento até 22 de julho de 2008 (data fixada pela lei). Considerando que a grande maioria das propriedades rurais, principalmente no sudeste e sul do país, possuem menos de três módulos é possível ter uma ideia da perda ambiental ocorrida.

No Estado de São Paulo, a questão infelizmente foi resolvida através da Lei nº 15.684, de 14 de janeiro de 2015, que no artigo 32 assim disciplina:

“Nas propriedades ou posses rurais que detinham, em 22 de julho de 2008, área de até 4 (quatro) módulos fiscais e que possuíam remanescente de vegetação nativa em percentuais inferiores ao previsto no artigo 12 da Lei Federal nº 12.651, de 25 de maio de 2012, a Reserva Legal será constituída com a área ocupada com a vegetação nativa existente em 22 de julho de 2008, vedadas novas conversões para uso alternativo do solo”. No § 3º do referido artigo expressamente dispõe que “nos imóveis sem remanescente de vegetação nativa na data de 22 de julho de 2008, fica o proprietário ou possuidor desobrigado de recompor”.

Assim, infelizmente, privilegiou-se quem desmatou desrespeitando-se o Código Florestal revogado e puniu quem de forma diligente cumpriu a legislação ambiental da época, o que poderá trazer ao Estado de Direito um problema social inclusive para cumprir a atual legislação.

Interessante do ponto de vista ambiental, que na elaboração do texto do novo Código Florestal foi considerado um alerta que fizemos, em reportagem do jornal Folha de S. Paulo[138], referente ao crescimento da demanda de pedidos de desmembramento de imóveis rurais com o objetivo de enquadrá-los na medida mínima (quatro módulos) para configurar a dispensabilidade de manutenção ou regeneração de reserva florestal. O § 1º do art. 12 prevê: “Em caso de fracionamento do imóvel rural, a qualquer título, inclusive para assentamentos pelo Programa de Reforma Agrária, será considerada, para fins do disposto do caput, a área do imóvel antes do fracionamento”. Assim, é importante que o Oficial de Registro de Imóveis considere a área existente em 22 de julho de 2008 para fins da análise dos quatro módulos fiscais constantes do art. 67 do Código Florestal.

O Registro de Imóveis quando confere publicidade da reserva florestal legal não fiscaliza a existência de cobertura florestal, não é função inerente à qualificação registral. A função ambiental do Registro de Imóveis de espaços protegidos é circunscrita tão somente em espelhar informações ambientais contidas e criadas no Cadastro Ambiental, a obrigação ambiental não é criada com o registro que apenas potencializa a publicidade ambiental, tornando-se pública e com acesso a todos. Nas hipóteses em que o Registro de Imóveis se vale das informações contidas no CAR-SICAR e que verifica uma ausência de reserva florestal legal, deve o Oficial se atentar na razão da propriedade imobiliária estar dispensada da reserva florestal legal e arquivar referida documentação (justificativa do profissional responsável e proprietário), isso porque o órgão ambiental irá validar ou não as informações cadastrais e promover a checagem necessária e competente.

Recentemente, a Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São Paulo, juntamente com a Associação dos Registradores Imobiliários do Estado de São Paulo – ARISP, emitiu nota técnica[139] a respeito da análise do Oficial de Registro de Imóveis com relação às exceções contidas nos arts. 67 e 68 do Código Florestal, recomendando que se seja aceita declaração do proprietário nesse sentido, deixando-se ao órgão ambiental referida confirmação e controle, o que é de toda relevância já que existe o chamado espelhamento entre cadastro e registro. O órgão ambiental, confirmando que o imóvel necessita de reserva legal irá compelir o proprietário a especializá-lo no CAR e Oficial de Registro de Imóveis teria acesso à informação por meio eletrônico.  

4.3.12 Possibilidade de inclusão da área de preservação permanente na reserva florestal legal

Pelo novo Código Florestal é admitido o cômputo das áreas de preservação permanente no cálculo do percentual da reserva legal do imóvel (art. 15), desde que o benefício previsto não implique a conversão de novas áreas para o uso alternativo do solo; a área a ser computada esteja conservada ou em processo de recuperação, conforme comprovação do proprietário ao órgão estadual integrante do Sisnama; e o proprietário ou possuidor tenha requerido inclusão do imóvel no Cadastro Ambiental Rural – CAR, observando ainda que o regime de proteção da APP não se altera, ou seja, o regime jurídico aplicado às áreas de preservação permanente não será o da reserva florestal legal (§ 1º do art. 15).

4.3.13 Reserva florestal legal urbana

O Código Florestal passado não disciplinava o destino da reserva florestal legal, se o imóvel rural passasse a integrar a área urbana ou a área de expansão urbana, o que era muito debatido pela doutrina e por autoridades ambientais. Felizmente, o novo diploma, no artigo 19, determina que a “inserção do imóvel rural em perímetro urbano definido mediante lei municipal não desobriga o proprietário ou posseiro da manutenção da área de Reserva Legal, que só será extinta concomitantemente ao registro do parcelamento do solo para fins urbanos aprovado segundo a legislação específica e consoante as diretrizes do plano diretor”.

O artigo 25 ainda prevê, como instrumento do poder público municipal para o estabelecimento de áreas verdes urbanas, a possibilidade de transformação das reservas legais em áreas verdes, o que necessariamente deverá constar do plano diretor, ferramenta legal adequada para tratar da função social das cidades.

4.3.14 Reserva florestal legal voluntária

O § 2o, art. 15, dispõe sobre a reserva florestal voluntária, ou seja, o excedente florestal existente na propriedade rural. Assim, toda área conservada que ultrapasse o mínimo exigido pela lei poderá ser utilizada para constituição de servidão ambiental ou Cota de Reserva Ambiental.

Questão interessante é saber o destino das reservas legais florestais especializadas e averbadas no Registro de Imóveis antes da promulgação do novo Código Florestal e que estejam abaixo dos quatro módulos passíveis de exigibilidade. Tecnicamente é possível conjecturar que as reservas legais florestais podem ser desmatadas porque não existe mais a exigibilidade, o mesmo ocorrendo com as áreas de preservação permanente não computadas em reservas legais, o que atualmente é permitido (art. 15). No entanto, não há previsão expressa no Código Florestal vigente a respeito da afetação definitiva ou não de referidas áreas, conforme art. 225, § 1°, inciso III, da Constituição Federal.

4.3.15 Área verde urbana

A área verde urbana, prevista de forma genérica na Lei 6.766/79, agora é disciplinada expressa e detalhadamente. Segundo o art. 3º, inciso XX, consiste em “espaços, públicos ou privados, com predomínio de vegetação, preferencialmente nativa, natural ou recuperada, previstos no Plano Diretor, nas Leis de Zoneamento Urbano e Uso do Solo do Município, indisponíveis para construção de moradias, destinados aos propósitos de recreação, lazer, melhoria da qualidade ambiental urbana, proteção dos recursos hídricos, manutenção ou melhoria paisagística, proteção de bens e manifestações culturais”.

4.3.16 Compensação

O art. 66, da Lei nº 12.651, de 2012, “o proprietário ou possuidor de imóvel rural que detinha, em 22 de julho de 2008, área de Reserva Legal em extensão inferior ao estabelecido no art. 12, poderá regularizar sua situação, independentemente da adesão ao programa de regularização ambiental (PRA), adotando as seguintes alternativas, isolada ou conjuntamente: I – recompor a Reserva Legal; II – permitir a regeneração natural da vegetação na área de Reserva Legal;  III – compensar a Reserva Legal. 

O Código Florestal de 2012, nos termos do art. 66, § 6o, inciso II, permite a compensação de reserva florestal legal em áreas do mesmo bioma, ou seja, áreas que representam como um conjunto de diferentes ecossistemas, com relativo nível de homogeneidade, são biomas conhecidos a mata atlântica, o cerrado, pantanal etc. O Supremo Tribunal Federal em julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC 42, julgamento de 28 de fevereiro de 2018), por maioria por maioria, conferiu interpretação conforme a Constituição ao art. 48, § 2º, do Código Florestal, para permitir compensação apenas entre áreas com identidade ecológica

Dispõe ainda o estatuto florestal que “na hipótese de compensação de Reserva Legal, a servidão ambiental deve ser averbada na matrícula de todos os imóveis envolvidos” (§ 5o , art. 9o-A da Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981. Não consta que toda a compensação será averbada, somente as decorrentes de servidão ambiental, mais uma falha do legislador, mas entendemos que qualquer hipótese deve receber publicidade registral, assim como ocorre com a reserva florestal legal.

A primeira forma de regularização de área sem cobertura florestal adequada é a adesão ao Programa de Regularização Ambiental – PRA previsto no art. 59 do Estatuto Florestal, que exige requerimento formal do proprietário, prévia inscrição no CAR, assinatura de termo de compromisso com o órgão ambiental que deverá homologar o procedimento até final reparação, tudo dependendo obviamente da regulamentação pela legislação estadual respectiva[140].

A compensação de reserva florestal pode ser definida diretamente no PRA e constar do termo de compromisso que deverá necessariamente ser inscrito no Cadastral Ambiental Rural porque este centraliza por definição legal todas as informações de interesse ambiental. O sistema de matriz ambiental deve prevalecer de sorte que o instrumento adequado para o Registro de Imóveis averbar nas respectivas matrículas é o documento eletrônico (CAR), não devendo ser averbado o termo de compromisso diretamente decorrente de PRA[141]. Uma vez inserido o termo de compromisso no CAR poderá a circunstância ser averbada no Registro de Imóveis.

O vínculo do imóvel ao CRA será necessariamente ser averbado na matrícula do imóvel, está previsto diretamente no Código Florestal (§ 3º, art. 45), não existindo nesse caso previsão de gratuidade da averbação.

Como consta do caput do art. 66 do Estatuto Florestal, não é necessário o proprietário aderir ao programa de regularização ambiental para resolver o passivo florestal de sua propriedade, poderá diretamente recompor a reserva florestal, permitir a regeneração ou compensar a reserva.

A compensação da reserva florestal ocorrerá assim de forma direta quando o proprietário de determinado imóvel com passivo ambiental decorrente de ausência de reserva florestal legal total ou parcial utiliza o outro imóvel de sua propriedade com excedente florestal, inscrevendo referidas situações no Cadastro Ambiental Rural – CAR.

A compensação pode ainda ser indireta, hipótese em que o proprietário sem a reserva florestal legal pode adquirir Cotas de Reserva Ambiental – CRA, arrendar área sob regime de servidão ambiental ou Reserva Legal voluntária; ou ainda doar ao poder público de área localizada no interior de Unidade de Conservação de domínio público pendente de regularização fundiária (§ 5o do art. 66 do Código Florestal)

O Registrador deverá observar se existe coincidência entre os proprietários dos imóveis, porque caso não ocorra, o caso não é de compensação direta e sim indireta por meio de arrendamento ou aquisição de cotas de reserva florestal.

A averbação da RLF não ocorre somente no imóvel que está servindo de compensação, mas é preciso também proceder à averbação da notícia da compensação no imóvel compensado, completando o procedimento e evitando que no futuro ocorra questionamento sobre a RLF do respectivo imóvel.

Na compensação indireta por arrendamento da servidão florestal de outra propriedade, é importante a publicidade registraria não do arrendamento pela falta de previsão legal (art. 167 da LRP), mas da notícia que a reserva florestal legal do imóvel não está especialidade em razão de compensação aprovada pelo órgão ambiental competente.

O art. 66, § 6o, do Código Florestal disciplina expressamente três formas de compensação de reserva florestal possíveis: I – aquisição de Cota de Reserva Ambiental – CRA, que estudaremos no próximo capítulo; II – arrendamento de área sob regime de servidão ambiental ou Reserva Legal voluntária; ou III – doação ao poder público de área localizada no interior de Unidade de Conservação de domínio público pendente de regularização fundiária.

Uma questão interessante é saber se a compensação segue a regra geral do cadastro ambiental ou deve ser previamente aprovada pela autoridade ambiental respectiva. Entendemos que por falta de regramento específico o sistema deve ser idêntico ao da reserva florestal legal, ou seja, é realizado através de declaração eletrônica e referida informação tem presunção de regularidade até a análise ou validação das informações no CAR. O Oficial de Registro de Imóveis deve ficar atento quando o imóvel com excedente florestal estiver em nome de outro proprietário (compensação indireta), nesse caso é importante que exista um contrato de arrendamento regulando a compensação, não bastando a mera declaração no cadastro ambiental, isso porque fere a continuidade registral referido ato sem um esclarecimento que estabeleça um liame jurídico entre o imóvel e área compensada.  Nessa hipótese também deverá ser comprovado que existe um excedente florestal apto para servir de compensação, ou seja, se na matrícula do imóvel tem servidão ambiental averbada ou reserva florestal voluntária.

A Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo já se posicionou no sentido de que o Oficial de Registro de Imóveis pode utilizar diretamente o cadastro ambiental para proceder as averbações necessárias[142] (Decisão Processo CG nº 2015/21.247).

Um ponto importante com relação à averbação da compensação é preciso ser enfrentado. Uma vez constante a compensação do cadastral ambiental rural – CAR, poderá o Oficial de Registro de Imóveis tão somente aceitar a informação declarado pelo proprietário sem homologação do órgão ambiental? Pensamos que não. A compensação de reserva florestal legal é um ato complexo que envolve além de negociais, mas de verificação de viabilidade ambiental que somente com validação do órgão ambiental poderá ingressar no Registro de Imóveis. São diversos requisitos que devem ser levados em consideração pela autoridade ambiental, um exemplo importante é a de correspondência entre biomas, já que pelo novo estatuto florestal é necessária a coincidência de bioma para ocorrer a compensação (art. 66, § 5º, inciso IV). Não se trata de desprezar o caráter declaratório do cadastro ambiental que foi somente definido por decreto (art. 6º, Decreto n. 7.830/2012), a analogia não pode ser aplicada porque a situação é excepcional, existe um passivo ambiental que para ser sanado necessita de um cumprimento expresso da legislação ambiental.

Imagine a hipótese do Registro de Imóveis conferir publicidade de compensação ambiental que não atenda aos requisitos legais ambientais, não é nenhum absurdo falar em eventual responsabilidade, mesmo porque não é raro as compensações ambientais envolverem altos valores.

Assim, não basta a mera declaração dos proprietários, mas sim a validação do cadastro ambiental pelo órgão ambiental, devendo o registrador observar o status do CAR quando da averbação.

4.3.17 Cota de Reserva Ambiental – CRA.

O Art. 44 do Código Florestal instituiu “a Cota de Reserva Ambiental – CRA, título nominativo representativo de área com vegetação nativa, existente ou em processo de recuperação”. A ideia central “consiste na tentativa de viabilizar a aproveitamento (jurídico e econômico) de áreas de vegetação nativa que excedam as obrigações impostas pela legislação ambiental, criando-se uma espécie de mercado de CRA”[143]. Assim, estão representadas pelas CRAs tão-somente áreas de preservação que excedem a obrigação legal que toda propriedade imobiliária rural deve ter como áreas de preservação permanente e reservas legais florestais.

Configura um aperfeiçoamento da Cota de Reserva Florestal – CRF, emitida nos termos do art. 44-B da Lei no 4.771, de 15 de setembro de 1965, que não foi implementada, mas, juridicamente, agora é convertida em Cota de Reserva Ambiental – CAR (art. 44, § 3o).

Interessante do ponto de vista registrário é que “o vínculo de área à CRA será averbado na matrícula do respectivo imóvel no registro de imóveis competente” (Art. 45, § 3o), bem como na “utilização de CRA para compensação da Reserva Legal será averbada na matrícula do imóvel no qual se situa a área vinculada ao título e na do imóvel beneficiário da compensação”, provando a forte vinculação entre o título e o direito real nele representado. E configura necessariamente um direito real porque, além da publicidade registrária, o art. 49, § 2o, dispõe que a “transmissão inter vivos ou causa mortis do imóvel não elimina nem altera o vínculo de área contida no imóvel à CRA”.

O cancelamento também será averbado nas respectivas matrículas conforme o § 3o do art. 50 da Lei 12.651/2012). O Decreto nº 9.640, de 27 de dezembro de 2019, no § 10º do art. 19, expressamente dispensou a averbação no Cartório de Registro de Imóveis em caso do imóvel possuir Cadastral Ambiental Rural – CAR, no entanto, por razões óbvias, ou seja, falta de competência legislativa, não tem a capacidade de revogar a regra criada por lei federal.

O artigo 44 traz as hipóteses em que a CRA será emitida, são elas áreas sob regime de servidão ambiental, instituída na forma do art. 9o-A da Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981; correspondente à área de Reserva Legal instituída voluntariamente sobre a vegetação que exceder os percentuais exigidos na lei; protegida na forma de Reserva Particular do Patrimônio Natural – RPPN, nos termos do art. 21 da Lei no 9.985, de 18 de julho de 2000; e existente em propriedade rural localizada no interior de Unidade de Conservação de domínio público que ainda não tenha sido desapropriada.

O documento que será apresentado no registro de imóveis é um termo ou certidão assinado pela autoridade ambiental contendo a especialização da área que provavelmente já possua publicidade registral. As cotas de reserva ambientais representam um excedente florestal que deve ser conhecido já que circulará em meio próprio para fins de compensação, de forma que deve o Registrador Imobiliário ter o cuidado de checar se está averbada na respectiva matrícula.

4.4 Servidão AMBIENTAL

A servidão ambiental estava prevista na legislação brasileira, no Código Florestal revogado, conforme art. 44-A, que teve a sua redação apresentada pela Medida Provisória n. 2.166/01-67, de 24 de agosto de 2001, bem como pela Lei n. 11.284, de 2 de março de 2006 (art. 85), que havia introduzido o art. 9º-A na Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente.

O novo Código Florestal revogou expressamente a Lei 4.771/65 e pacificou a questão se o dispositivo havia ou não sido revogado pela Lei n. 11.284, de 2 de março de 2006, o que era defendido por parte da doutrina[144].

Primeiramente, é preciso entender do ponto de vista jurídico que não se trata propriamente de uma servidão. Se a restrição que incide sobre imóvel for em benefício de interesse público genérico e abstrato, como a estética, a proteção do meio ambiente, a tutela do patrimônio histórico e artístico, existe limitação à propriedade, mas não servidão.[145] Na servidão ambiental não existe um beneficiado direto como na servidão civil.

A servidão ambiental agora recebe o caráter de direito real, diferentemente dos diplomas anteriores, em que o tratamento conferido era de espaço territorial protegido, nos mesmos moldes da reserva florestal legal. Entendemos haver características de direito real porque o inciso II, do § 4o, do art. 9º, prevê, expressamente, a averbação do contrato de alienação, cessão ou transferência da servidão ambiental, bem como a possibilidade de que ela seja temporária, com período mínimo de quinze anos, ou perpétua, induzindo a possibilidade de que seja transferida também por mortis causa.

A própria lei agora diz que a servidão ambiental nasce com um contrato, na verdade uma declaração, e tem sua eficácia com a averbação e o proprietário ou possuidor de imóvel, pessoa natural ou jurídica, pode, por instrumento público ou particular, ou por termo administrativo firmado perante órgão integrante do Sisnama, limitar o uso de toda a sua propriedade ou de parte dela para preservar, conservar ou recuperar os recursos ambientais existentes, instituindo servidão ambiental (9-A). O contrato deverá ter as regras de preservação e regime jurídico aplicado e terão que ser, no mínimo, as mesmas conferidas à reserva florestal legal.

Existe uma renúncia de exploração pelo proprietário e a declaração pública ou particular deverá conter referida circunstância de forma expressa, devendo ser observado com critério pelo registrador ou tabelião que elaborou o instrumento a capacidade de quem está instituindo a servidão ambiental.

A servidão ambiental poderá ser onerosa ou gratuita, temporária ou perpétua (Art. 9o-B) sendo que o prazo o prazo mínimo da servidão ambiental temporária será de quinze anos § 1º), podendo ser instituída também imóveis urbanos, a atual redação não restringe a imóveis rurais, criando a possibilidade de afetação de florestas urbanas particulares, uma impossibilidade até então no direito ambiental brasileiro.

O regime legal anterior (Lei nº 11.284/2006) condicionava a instituição da servidão ambiental à anuência do órgão ambiental, a redação conferida pelo Código Florestal de 2012 é silente com relação à aprovação prévia ambiental, apenas é expressamente necessária se a servidão ambiental for utilizada para compensação ambiental. Erika Bechara, comentado o art. 78 do Código Florestal de 2012, entende que “o novo regime já não exige que o órgão ambiental aprecie previamente e muito menos que autorize a constituição da servidão, respeitando, nesse sentido a autonomia da vontade do proprietário […] a instituição da servidão ambiental não depende de um contrato bilateral, por se tratar de ato unilateral do proprietário, e não envolve anuência ou participação de outra parte[146].

Assim, não deve o Oficial de Registro de Imóveis, de acordo com nova legislação, exigir a aprovação do órgão ambiental, mas deve tomar o cuidado necessário para que a servidão não incida sobre área de preservação ambiental ou reserva florestal legal, nos termos do § 2º do art. 9º-A da Lei nº 9.938/81. Para tanto, deverá ser exigido quando da qualificação registral a apresentação de prova de inscrição no Cadastro Ambiental Rural – CAR contendo a necessária identificação e especialização dos espaços protegidos ambientalmente. A averbação da servidão ambiental independe da existência de eventual compensação que é ato distinto e exige a anuência do órgão ambiental porque o Código Florestal traz requisitos técnicos para que ela ocorra. Em que pese ter o cadastro ambiental natureza declaratória, não pode o Oficial de Registro de Imóveis aceitar a inscrição não validada pela autoridade ambiental para realizar a compensação porque colocará em risco a segurança jurídica das informações publicadas na matricula.

A servidão ambiental é instituída para o excedente florestal existente na propriedade imobiliária e deve, necessariamente, ser averbada na matrícula do imóvel cujas regras inerentes à descrição são idênticas às da reserva floresta legal.  O ato a ser praticado no Cartório de Registro de Imóveis é o de averbação em razão de expressa determinação contida no art. 167, inciso II, 23), da Lei nº 6.015/73. Com a averbação é constitutiva, ou seja, nasce com a averbação na matrícula do imóvel, o princípio da especialidade deve ser observado e aplicado com rigor, devendo a parcela (servidão) ter a mesma forma descritiva do que o perímetro do imóvel e se este estiver mal descrito (sem medidas lineares no mínimo, deverá ser promovida a retificação do registro nos termos do art. 213 da Lei nº 6.015/73, assim,  nesse aspecto (especialidade objetiva), as regras da especialidade inerentes à reserva florestal legal não podem ser aplicadas.

O art. 9o-C prevê também que o “o contrato de alienação, cessão ou transferência da servidão ambiental deve ser averbado na matrícula do imóvel”. A hipótese é de compensação, ou seja, o excedente florestal é utilizado para compensar outro imóvel que possui déficit florestal, prevê também a nova legislação a publicidade dessa ocorrência que, nesta hipótese, necessariamente deverá ser acompanhada da aprovação do órgão ambiental competente.

4.5 Unidades de Conservação

A Lei 9.985, de 18 de julho de 2000, conceitua unidade de conservação como:

[…] espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção (art. 2º, I).

São dois os grandes grupos de unidades de conservação: a) unidades de Proteção Integral; e b) unidades de Uso Sustentável. Integram a primeira categoria a Estação Ecológica, a Reserva Biológica, o Parque Nacional, o Monumento Natural e o Refúgio de Vida Silvestre. São áreas que têm por objetivo básico preservar a natureza, livrando-a, quanto possível, da interferência humana. O interesse público é acentuado nesse grupo, sendo a propriedade das áreas também pública ou com rara possibilidade de participação de particulares. Interessa-nos somente o estudo das unidades de conservação em que a propriedade é privada ou ainda em que coexistam propriedades pública e privada; o que afasta o estudo da publicidade no Registro de Imóveis de referido grupo.

O outro grupo – Unidades de Uso Sustentável – é de áreas cujo objetivo é compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável de parcela dos seus recursos naturais. Pertencem a este grupo: Área de Proteção Ambiental, Reserva Particular do Patrimônio Natural, Área de Relevante Interesse Ecológico, Floresta Nacional, Reserva Extrativista, Reserva de Fauna e Reserva de Desenvolvimento Sustentável.

As unidades de uso sustentável fazem parte do zoneamento ambiental que é um dos instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente instituída pela Lei Federal 6.938/81. O zoneamento é um conjunto de procedimentos de natureza geoeconômica, uma vez que se aplica a uma determinada área com vocação múltipla, permitindo-se, assim, o aproveitamento econômico da área.

4.5.1 ÁREAS DE PROTEÇÃO AMBIENTAL (APA)

A APA é uma categoria de unidade de conservação relativamente nova. Sua implementação se iniciou na década de 80, com base na Lei Federal 6.902, de 27 de abril de 1981, que estabelece no art. 8º:

Havendo relevante interesse público, os poderes executivos Federal, Estadual ou Municipal poderão declarar determinadas áreas dos seus territórios de interesse para a proteção ambiental, a fim de assegurar o bem-estar das populações humanas, a proteção, a recuperação e a conservação dos recursos naturais.

Conforme estabelece a Resolução CONAMA de 10 de dezembro de 1988, “as APAs terão sempre um zoneamento ecológico-econômico, o qual estabelecerá normas de uso, de acordo com suas condições”, sendo que todas as APA devem possuir em seu perímetro, uma ZVS. Os diplomas legais, criadores da maioria das APA estaduais, definem como ZVS as áreas abrangidas por remanescentes da flora original e as áreas de preservação permanente definidas pelo Código Florestal.

No território das APA, coexistem áreas urbanas e rurais, com suas atividades socioeconômicas e culturais; as terras permanecem sob o domínio privado, não exigindo desapropriação pelo poder público. Observem que o regime jurídico das APA permite a exploração dos recursos naturais existentes, observados os requisitos legais gerais (União, Estado e Municípios); especial da lei que criou a área, tratando, assim de limitação administrativa.

As Áreas de Proteção Ambiental não são parques ecológicos. O conceito é diverso, podendo, inclusive, abrangê-los. São áreas onde a exploração dos recursos naturais, devido ao forte interesse ambiental, sofre limitações severas, visando à melhoria da qualidade de vida da população local e também objetivando a proteção dos ecossistemas regionais.

A publicidade das APA é útil não só sob aspecto ecológico, mas também sob o urbanístico. Nenhum projeto de urbanização poderá ser implantado numa APA sem a prévia licença especial emitida pela entidade administradora (art. 7º da Resolução CONAMA de 10 de dezembro de 1988). Ocorre que, muitas vezes, a lei declara todas as áreas do município (rurais e urbanas) como de proteção ambiental, como ocorre em São Paulo com os municípios de Jundiaí e Campos do Jordão. Isso afastaria, em princípio, a necessidade de publicidade; assim, entendemos que a publicidade deve ocorrer tão-somente quando as áreas forem geograficamente delimitadas sob pena de constar somente no Registro de Imóveis as restrições à exploração do imóvel, quando existirem.

4.5.2 RESERVA PARTICULAR DO PATRIMÔNIO NATURAL (RPPN)

4.5.2.1 CONCEITO

A Reserva Particular do Patrimônio Natural, conhecida popularmente por RPPN, integra as unidades de conservação[147], é um espaço ambiental protegido (rural ou urbano), instituído em área privada, gravado com perpetuidade, com o objetivo de conservar a diversidade biológica (art. 21 da Lei 9.985/2000).

4.5.2.2 PUBLICIDADE REGISTRAL

O § 1o do art. 21 da Lei 9.985/2000 dispõe que […] o gravame de que trata este artigo constará do termo de compromisso assinado perante o órgão ambiental, que verificará a existência de interesse público, e “será averbado à margem da inscrição no Registro Público de Imóveis”[148].

A Lei de Registros Públicos (6.015/73) não contempla expressamente a averbação da RPPN no art. 167, inciso II. Os atos de averbação não são taxativos já que o art. 246 permite a averbação de qualquer ato que altere o registro, outorgando publicidade para casos não expressamente autorizados pela lei[149].

4.5.2.3 NATUREZA JURÍDICA DA AVERBAÇÃO

O gravame será averbado na matrícula do imóvel, é o que dispõe o § 1o do art. 21 da Lei 9.985/2000. A RPPN é uma afetação de uma área com forte restrição ao direito de propriedade e vinculada à preservação ambiental, principalmente a florestal, não existindo transmissão da propriedade que continua com particulares. O § 1o do art. 21 da Lei 9.985/2000 em momento algum menciona que a descrição (perímetro) da reserva será averbada na matrícula do Registro de Imóveis, mas somente que o gravame receberá publicidade registral.

O assento não é necessariamente constitutivo como era no Código Florestal revogado[150]. A RPPN nasce com a aprovação e aceitação do órgão ambiental competente, no entanto, o gravame de perpetuidade somente recebe publicidade e deve ser respeitado erga omnes após a averbação na matrícula no Cartório de Registro de Imóveis respectivo. O próprio Dec. 5.746, de 5 de abril de 2006, no Parágrafo único do art. 9º dispõe que a “partir da averbação do Termo de Compromisso no Cartório de Registro de Imóveis, ninguém mais poderá alegar o desconhecimento da RPPN”.

O direito de propriedade ficará restrito a duas hipóteses conforme o § 2º do art. 21 da Lei 9.9985/2000: pesquisa científica e visitação com objetivos turísticos, recreativos e educacionais. Uma vez averbado o gravame as restrições tornar-se-ão perpetuas e com publicidade erga omnes, não podendo ser desrespeitados por nenhum sucessor mortis causa ou inter vivos.

4.5.2.4 ESPECIALIDADE OBJETIVA (PROBLEMAS COM A DESCRIÇÃO).

1. RPPN instituída na totalidade de imóvel matriculado.

Possuindo a RPPN matrícula própria, ou seja, o imóvel que se pretende instituir esta individualizado com número de matrícula, bastará o Oficial de Registro de Imóveis averbar o termo de compromisso assinado pelo órgão ambiental e constar da averbação que o imóvel compõe uma RPPN em sua totalidade em caráter perpétuo.

O artigo 3º, § 1º, inciso IX, exige a apresentação para o órgão ambiental de “planta da área total do imóvel indicando os limites; os confrontantes; a área a ser reconhecida, quando parcial; a localização da propriedade no município ou região, e as coordenadas dos vértices definidores dos limites do imóvel rural e da área proposta como RPPN, georreferenciadas de acordo com o Sistema Geodésico Brasileiro, indicando a base cartográfica utilizada e assinada por profissional habilitado, com a devida Anotação de Responsabilidade Técnica – ART” (grifo não constante do texto original).

O georreferenciamento é uma forma descrição baseada em coordenadas geográficas, é uma técnica utilizada no sistema brasileiro (Lei nº 10.267/2001) para se evitar sobreposições, tanto que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA no procedimento certifica que o perímetro do imóvel não se sobrepõe a outro. O fato de uma parcela do imóvel estar descrita dessa forma não resulta na necessidade do imóvel também seguir nesse momento a mesma técnica.  

O termo de compromisso do órgão ambiental deverá conter o número da matrícula do imóvel, bem com a descrição constante do Registro de Imóveis a fim de se respeitar o princípio da especialidade objetiva. O fato de contem descrição georreferenciada nos documentos apresentados por si não basta para o Oficial de Registro de Imóveis exigir o georreferenciamento do perímetro (área total) do imóvel, já que a identificação do imóvel rural, prevista na forma do § 3o do art. 176 e do § 3o do art. 225 da Lei no 6.015, de 1973, deverá observa os prazos constante do art. 9º Decreto nº 4.449, de 30 de outubro de 2002. Não há razão para se confundir a necessidade de uma descrição pormenorizada da Reserva Particular decorre da necessidade cadastral e para facilitar a localização e fiscalização ambiental, tanto que é possível através da internet checar através de imagens de satélite sua existência e preservação.

2. RPPN instituída em parte de imóvel matriculado.

Quando a RPPN for instituída em parte certa e localizada de um imóvel matriculado, o Oficial de Registro de Imóveis deverá primeiramente se certificar que a área da Reserva Particular está inserida dentro do perímetro do imóvel, ou seja, se não está avançando em outra matrícula, o que pode ser obtido se necessário com declaração do profissional que elaborou o projeto da RPPN ou ainda declaração do próprio proprietário.

O gravame da Reserva Particular deverá ser averbado, juntamente com a descrição georreferenciada, mesmo que divergente da descrição do perímetro do imóvel.

Sabemos que várias são as formas como os imóveis foram descritos desde a criação do Registro de Imóveis e, na grande maioria das vezes, nem mesmo a descrição existe ou, ainda, com divisas imprecisas e frágeis, tornando-se difícil localizar ou especializar a reserva. É claro que o advento da Lei 10.267/2001, que criou o georreferenciamento, resolverá paulatinamente o problema das descrições dos imóveis rurais. No entanto, nessa transição deverá a reserva ser especializada na forma do regulamento, devendo o Oficial esforçar-se para estabelecer um ponto de amarração entre reserva (descrição georreferenciada) e descrição registraria (azimutes, latitude e longitude, rumos magnéticos etc.), lembrando que a lei não determina a averbação da Reserva Particular e sim seu gravame, justificando-se uma aparente mitigação do princípio da especialidade objetiva. Nesse sentido a jurisprudência administrativa da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de São Paulo (PROCESSO Nº 2012/77684 – TANABI – Parecer 206/2012-E, publicada em 14.08.2012)[151].

Nenhuma ofensa ou prejuízo ao princípio da especialidade ocorre na hipótese. Além da averbação não ser constitutiva, quando do término dos prazos constante do art. 9º Decreto nº 4.449, de 30 de outubro de 2002, todos os imóveis rurais do Brasil serão necessariamente georreferenciados, bastando quando do procedimento de retificação de registro resultante (art. 213 da Lei nº 6.015/73, o Oficial de Registro de Imóveis exigir a identificação da Reserva Particular na planta apresentada.

Exigir uma coincidência na forma descritiva entre Reserva Particular e perímetro do imóvel com certificação pelo INCRA e respectiva retificação (art. 213 da Lei nº 6.015/73) seria transformar a apregoada rigidez formal do sistema registrário em dogma que redundaria em negação do direito ambiental e do próprio direito real, punindo as deficiências anteriores com soluções inadequadas e exigindo perfeição ainda não atingida. Recordando as palavras do Des. Márcio Martins Bonilha, “a razoabilidade há de pautar a conduta de todos os que atuam na área, principalmente registral”[152].

4.5.2.5 ÓRGÃO AMBIENTAL COMPETENTE

A criação da RPPN é de iniciativa do particular, mas necessita de homologação da autoridade ambiental. O processo de transformação de uma propriedade ou de parte dela numa RPPN é complexo, a criação da reserva foi regulamentada pelo Dec. 5.746, de 5 de abril de 2006.

As RPPNs também poderão ser criadas pelos órgãos integrantes do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC, assim no âmbito estadual ou municipal é preciso saber se o órgão ambiental integra o SNUC através do site do Ministério do Meio Ambiente (http://www.mma.gov.br/).

No âmbito federal o responsável pela análise das RPPNs é o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio, autarquia federal vinculada ao Ministério do Meio Ambiente criada pela Lei nº 11.516, de 28/08/2007.

O proprietário interessado em ter seu imóvel, integral ou parcialmente, transformado em RPPN, deverá acessar o Sistema Informatizado de Monitoria de Reservas Particulares do Patrimônio Natural – SIMRPPN através do sítio eletrônicohttp://sistemas.icmbio.gov.br/simrppn/login e preencher o requerimento disponível no sistema.

Após o proprietário cumprir todas as etapas constantes do sistema eletrônico, receberá o Termo de Compromisso pelo ICMBio e apresentará para averbação no Registro de Imóveis.

Apesar da Reserva Particular não integrar expressamente o rol do art. 8º da Lei 9.985/2000 (grupo das Unidades de Proteção Integral), não se permite qualquer atividade extrativista, somente se permitindo, assim, atividades típicas de preservação[153].

Não configura um direito real ou uma servidão (particular ou administrativa), trata-se de uma limitação ao direito de propriedade semelhante à administrativa, por isso, por exemplo, não é necessária a lavratura de escritura pública e registro (estrito sendo) na matrícula do imóvel, a teor do que dispõe o art. 108 do Código Civil.

4.5.2.6 QUALIFICAÇÃO REGISTRAL

A documentação constante do decreto que regulamentou a RPPN, bem da respectiva instrução normativa, deve ser exigida tão somente pela autoridade ambiental, o destinatário da norma não é o Oficial de Registro de Imóveis que deve exigir o Termo de Compromisso assinado pelo proprietário e órgão ambiental, planta do imóvel e Reserva Particular e memorial descritivo se for o caso.

Por essa razão, por exemplo, não deve o Oficial de Registro de Imóveis conferir nem exigir a publicação da Reserva Particular no diário oficial da união. Referido procedimento ocorre na esfera administrativa no âmbito da autoridade ambiental.

Tanto o Dec. 5.746, de 5 de abril de 2006, como a instrução relacionam uma série de documentos que devem ser apresentados para a autoridade ambiental verificar a viabilidade ou não da instituição da RPPN.

Reconhecida a Reserva Particular, é publicada a respectiva portaria no Diário Oficial. Após isso, deverá o proprietário providenciar a averbação da RPPN no Registro de Imóveis, gravando a área do imóvel com reserva em caráter perpétuo, a fim de que seja emitido o título de reconhecimento.

O Registro de Imóveis na qualificação da documentação apresentada deve exigir o documento principal para que a averbação do gravame da Reserva Particular seja realizada, que é o termo de compromisso assinado por todos os detentores de direito real que figurarem na matrícula. O termo de compromisso deve conter a descrição constante da matrícula e a descrição da Reserva Particular georreferenciada.

Caso não conste do Termo de Compromisso as descrições exigidas, referida providência poderá ser suprida facilmente com a apresentação de memorial descritivo subscrito pelo proprietário e autoridade ambiental competente.

Outro documento imprescindível é a planta do imóvel que deverá conter o perímetro (área total da matrícula) e a Reserva Particular, contendo na hipótese de ser parcial, um ponto de amarração com a descrição constante da matrícula para que o Oficial para ter a certeza de que não está composta em outra propriedade. 

Finalmente, tratando-se de imóvel rural, o artigo 21 da Lei 9293/96,  determina ser obrigatória comprovação do pagamento do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural – ITR referente aos cinco últimos exercícios, para serem praticados os atos previstos no artigo 167 e 168 da Lei de Registros Públicos, bem como o artigo 22, parágrafo 2º da Lei 4947/66, exige a apresentação do último lançamento do Certificado de Cadastro de Imóvel Rural – CCIR, lembrando que a emissão dos mesmos hoje é realizada facilmente pela internet através dos sítios www.receita.fazenda.gov.br e www.incra.gov.br.

4.5.2.7 RESERVA FLORESTAL LEGAL E RESERVA PARTICULAR

A Reserva Particular não se confunde com a Reserva florestal legal, embora possa ambientalmente existir certa coincidência entre as mesmas, o que será analisado pela autoridade ambiental.

A reserva legal floresta, definida no art. 3º, inciso III, do novo Código Florestal (Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012), consiste em área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, com a função de assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais do imóvel rural, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção de fauna silvestre e da flora nativa.

Ela é inscrita no Cadastro Ambiental Rural – CAR e averbada no Registro de Imóveis em razão de previsão constante do dos arts. 167, II, 22) e 169 da Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015/73).

Não deve o Oficial de Registro de Imóveis exigir a prévia averbação da reserva florestal legal como condição para se proceder à averbação da Reserva Particular porque referida obrigação não consta da legislação citada, nem mesmo de seu regulamento.

As firmas constantes do documento emitido pelo órgão ambiental não precisam ser reconhecidas, nem mesmo dos particulares, isso porque os documentos públicos em razão de princípios de direito administrativo possuem presunção de legalidade e veracidade e não podem ser questionados sem justa razão ou suspeita de falsidade.

O mesmo ocorre com a exigência da figura de testemunhas instrumentárias porque não consta da Lei 9.985/2000 (SNUC), nem mesmo da Lei nº 6.015/73, bem como do seu respectivo regulamento. Interessante, ainda, que o Código Civil de 2012no artigo 221 não repetiu a regra do estatuto civil passado (art. 135) e não exige nem mesmo que instrumentos particulares tenham necessariamente testemunhas.

A RPPN poderá ser criada em propriedade hipotecada, desde que o proprietário apresente anuência da instituição credora (art. 10 do Dec. 5.746, de 5 de abril de 2006). Se o imóvel tiver sido alienado fiduciariamente nos termos da Lei nº 9.514, de 20 de novembro de 1997, a instituição da RPPN ficará condicionada à anuência do credor fiduciário.

Consta do artigo 2º, § 1º, inciso VII, da Instrução Normativa nº 07, de 17 de dezembro de 2009, que é necessária a apresentação pelo proprietário de “certidão de matrícula e registro do imóvel no qual se constituirá a RPPN, indicando a cadeia dominial válida e ininterrupta, trintenária ou desde a sua origem”.

Parece-nos que, do ponto de vista do direito civil, bastaria a apresentação de certidão da matrícula do imóvel em que se pretende instituir a RPPN e verificar o atual proprietário e a existência de ônus ou direito real impeditivos. Vejam que o artigo 10 do Dec. 5.746, de 5 de abril de 2006, permite inclusive a instituição de RPPN quando a área estiver hipoteca, bastando no caso, a anuência do respectivo credor.

Não há qualquer relevância ambiental em se relacionar os proprietários do imóvel dos últimos trinta anos ou até a respectiva origem. Referida informação não é necessária para se afetar a área como de preservação ambiental, porque referida atribuição é tão somente do proprietário em razão dos atributos inerentes ao direito de propriedade.

Não obstante, está o Oficial de Registro de Imóveis obrigado a fornecer a certidão na forma requerida no prazo de no máximo cinco dias nos termos do arts. 16 e 19 da Lei nº 6.015/73, servindo referidos argumentos para que a próxima redação da instrução normativa retire referida exigência que apenas prejudica a rapidez da instituição da Reserva Particular.

4.5.3 Zonas de amortecimento

O art. 25 da Lei 9.985, de 18 de julho de 2000, criou um espaço territorial especialmente protegido que tem chamado pouca a atenção da doutrina, mas que vem gerando diversos problemas em áreas próximas a parques florestais. Com efeito, dispõe referido artigo que

[…] as unidades de conservação, exceto Área de Proteção Ambiental e Reserva Particular do Patrimônio Natural, devem possuir uma zona de amortecimento e, quando conveniente, corredores ecológicos […]

Embora a grande maioria das unidades de conservação seja pública, o legislador foi sábio ao estabelecer que as áreas que com elas colidam devam sofrer alguma espécie de restrição para proteger e garantir a finalidade da sua criação. De nada adiantaria a criação de um parque florestal se não houvesse alguma espécie de proteção a seu redor, garantindo, assim, seu equilíbrio ecológico.

Trata-se de fenômeno recente e atual dos grandes centros urbanos brasileiros: as cidades estão crescendo e cada vez mais chegando perto de parques florestais, comprometendo a sustentabilidade ambiental dessas áreas. Acresce-se o crescimento de empreendimentos imobiliários residenciais cada vez mais frequentes em áreas de grande arborização, devido ao inestimável valor ambiental e de qualidade de vida.

As restrições ambientais devem ser sólidas e decorrentes de estudos para a criação das próprias unidades de conservação (federais ou estaduais). É recomendável que constem da própria lei de criação, e devem, indubitavelmente, receber publicidade registral nas respectivas matrículas, porque é importante que adquirentes de áreas próximas a unidades de conservação tenham consciência de que devem obedecer às restrições impostas em lei. A grande maioria das restrições impostas a zonas de amortecimento se refere à necessidade de estudos de impacto ambiental e licenciamento ambiental para desmembramentos e construções.

4.5.4. A Mata Atlântica.

4.6 Terras indígenas

Na área de proteção do meio ambiente e o Registro de Imóveis, não podemos olvidar das terras indígenas que tem como uma de suas finalidades a proteção e preservação dos recursos naturais. O art. 20, XI, da CF dispõe que são bens da União as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios. O art. 231, § 1º, define como tal as terras habitadas pelos índios em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientaisnecessários ao seu bem-estar e as necessárias à sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.

José Afonso da Silva leciona que a expressão terras tradicionalmente ocupadas não revela uma relação temporal

[…] não se trata de posse ou prescrição imemorial, como se a ocupação indígena nesta se legitimasse, e dela se originassem os direitos dos índios sobre as terras por eles ocupadas, porque isso, além do mais, é incompatível com o reconhecimento constitucional dos direitos originários sobre elas.

Para o autor

[…] o tradicionalmente refere-se ao modo tradicional de os índios ocuparem e utilizarem as terras e ao modo tradicional de produção, enfim, ao modo tradicional de como eles se relacionam com a terra, já que há comunidades mais estáveis, outras menos estáveis, e as que têm espaços mais amplos em que se deslocam etc.[154]

A regulamentação do art. 231 da CF ocorreu diretamente pelo Dec. 1.775, de 8 de janeiro de 1996, que estabeleceu um largo procedimento para a demarcação das terras tradicionalmente ocupadas por índios, e pela Portaria 14, de 9 de janeiro de 1996, do Ministério da Justiça, que disciplina as regras sobre a elaboração do relatório circunstanciado de identificação e delimitação de terras indígenas. O procedimento é presidido pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI), por meio da Diretoria de Assuntos Fundiários; órgão do governo brasileiro que estabelece e executa a Política Indígena no Brasil; e consiste em dez etapas:

1. Estudos Antropológicos de Identificação: em que são realizados estudos que apresentarão o modo de ocupação de determinado grupo étnico indígena, de acordo com critérios culturais;

2. Formação de Grupo Técnico especializado: consiste na etapa de estudos complementares de caráter ambiental, histórico, etno-histórico, cartográfico, levantamento de ocupação não indígena e de outra natureza, necessários para demonstrar a ocupação tradicional e apresentação de proposta de delimitação de área. Esse Grupo Técnico será coordenado por antropólogo e ao final apresentará Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação.

3. Aprovação do Relatório Circunstanciado: no prazo de 15 dias após aprovação pela Presidência da FUNAI será publicado resumo dos estudos nos Diários Oficiais da União e Estado;

4. Contraditório: manifestações relativas ao procedimento podem ser apresentadas desde o início dos trabalhos de identificação até 90 dias depois da publicação. A FUNAI responde as eventuais contestações no prazo de 60 dias e encaminha processos de identificação e de contestação para apreciação pelo Ministério da Justiça;

5. Emissão de Portaria Declaratória pelo Ministério da Justiça, declarando, reprovando ou solicitando diligências;

6. Demarcação Física: a materialização dos limites é feita apenas nas linhas secas, por meio de abertura de picadas, implantação de marcos e placas indicativas e medição topográfica e geodésica. Os limites naturais são definidos por conversão digital das cartas topográficas. Em seguida é elaborado o mapa e o memorial descritivo da demarcação, que instrui o decreto de homologação do Presidente da República;

7. Homologação do Presidente da República;

8. Atualização do levantamento fundiário e cadastro pelo Incra;

9. Registro no Cartório de Registro de Imóveis e anotação na Secretaria de Patrimônio da União – SPU;

10. Regularização fundiária: a legislação prevê o pagamento de indenizações relativas a benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé.

Chama-nos a atenção e configura o tema de maior interesse desse breve estudo a utilização do Registro de Imóveis para publicizar um bem público da União afetado ao uso de povos indígenas. É cediço que os bens públicos não necessitam da publicidade registral para garantir os direitos de seus titulares, já que são inalienáveis e, por decorrência, também imprescritíveis e impenhoráveis, no entanto, é notório que cada vez mais o Registro de Imóveis está sendo reconhecido como um importante reforço da publicidade legal.

O art. 6º do Dec. 1.775, de 8 de janeiro de 1996, determina que:

[…] em até 30 dias após a publicação do decreto de homologação, o órgão federal de assistência ao índio promoverá o respectivo registro em cartório imobiliário da comarca correspondente e na Secretaria do Patrimônio da União do Ministério da Fazenda.

O caminho ordinário, então utilizado pela União para proceder à abertura de matrícula no Registro de Imóveis de seus imóveis, é o procedimento discriminatório previsto no Dec.-lei 9.760, de 5 de setembro de 1946, e Lei 6.383, de 7 de dezembro de 1976, complexo e moroso e de competência também do INCRA, podendo ser administrativo ou judicial. O objetivo do processo discriminatório é separar as terras públicas das particulares, mediante verificação da legitimidade dos títulos de domínio particular, apurando, por exclusão, as terras do domínio público. No entanto, a Lei 5.972, de 11 de dezembro de 1973, permite a abertura de matrícula de áreas públicas no Registro de Imóveis, independente do título anterior (§ único do art. 2º) estabelecendo alguns requisitos, e pode ser utilizada perfeitamente para as terras indígenas.

Inicialmente, entendemos que a Lei 5.972/73 não está revogada porque inexiste incompatibilidade direta com a normativa registrária vigente (Lei 6.015/73). Mesmo porque dita lei sofreu alteração expressa pela Lei 9.821, de 23 de agosto de 1999, e foi regulamentada pelo Dec. 3.994, de 31 de outubro de 2001.

Outro instrumento recente que a União possui para demarcar e abrir matrículas de seus imóveis decorrentes de regularização fundiária de interesse social foi criado pela Lei 11.481, de 31 de maio de 2007, que introduziu os arts. 18-A a 18-F no Dec.-lei 9.760, de 5 de setembro de 1946; no entanto, perfeitamente aplicado analogicamente, a meu ver, às regularizações de terras de comunidades remanescentes de quilombo. O procedimento tem sido amplamente discutido desde a publicação da lei; singelamente consiste em procedimento administrativo presidido pelo Registro de Imóveis a requerimento da União pela Secretaria do Patrimônio da União, instruído com planta e memorial descritivo da área a ser regularizada, planta de sobreposição da área demarcada com a sua situação constante do registro de imóveis, entre outros documentos.

O Registro de Imóveis prenotará e autuará o requerimento, procedendo a todas as buscas em seus livros com relação a eventuais direitos e matrículas sobre a área. Inexistindo matrícula ou transcrição anterior, e estando a documentação em ordem, o oficial do registro de imóveis abrirá matrícula do imóvel em nome da União. Havendo registro anterior, o oficial do registro de imóveis deve notificar, pessoalmente, o titular de domínios confrontantes, ocupantes e terceiros interessados.

Não existindo impugnação ao pedido, e decorrido o prazo legal, o oficial do registro de imóveis concluirá o procedimento e procederá à abertura da matrícula. No caso de impugnação, o oficial do registro de imóveis dará ciência de seus termos à União; não existindo acordo, encaminhará o procedimento ao juiz competente.

Observa-se, assim, que a utilização das Leis Federais 5.972/73 e 11.481/2007 é plenamente possível, sendo que a analogia pode e deve ser utilizada para o último diploma legal, porque estaríamos também diante de regularização de área com finalidade social. Reconhecemos novamente que o desenvolvimento dessas duas novas possibilidades de abertura de matrícula de bens públicos deve ser fruto de trabalho e discussão, sempre no sentido de facilitar o acesso da transmissão da propriedade pública para as comunidades remanescentes de quilombo. Isso deve acontecer, no entanto, sem que se perca a finalidade que o Registro de Imóveis deve espelhar a segurança jurídica necessária em seus atos, aliás, o que tem sido um fator decisivo para o prestígio do órgão no direito brasileiro.

Não existe previsão normativa, mas a descrição dessas áreas provavelmente será georreferenciada em virtude da extensão e facilidade de levantamento – sem falar no fato de ser a técnica descritiva mais avançada – o que representa um avanço tecnológico e representa facilidade de controle pelo Registro de Imóveis. Todos os meios de publicidade são válidos e úteis, mas poucos possuem, efetivamente, a capacidade de impedir situações irreversíveis Nesse propósito, não podemos olvidar que o Registro de Imóveis, por meio de sua publicidade, pode afastar a chance de sobreposição de direitos, prevenindo futuros litígios e situações praticamente irreversíveis; por isso foi utilizado no procedimento administrativo de demarcação de terras indígenas.

Salienta-se que levar ao Registro de Imóveis bens públicos não é exclusividade de nosso direito. O regulamento hipotecário espanhol, em seu art. 5º, disciplina que “os bens imóveis de domínio público também poderão ser objeto de inscrição, conforme a sua legislação especial”.

Nesse sentido, o trabalho apresentado por Jorge Requejo Liberal, Registrador espanhol, no 3º Congresso de Registradores da Espanha, realizado em 30 de outubro a 1 de novembro de 2006:

Recentemente (RD 1.867/98, de 4 de setembro – BOE 29.09.1998), parece que o legislador se deu conta do que estava ocorrendo durante muitos anos, principalmente nos bens públicos como vias pecuárias, cuja utilidade inicial foi notadamente desfigurada pelo desuso e foram objeto de apropriação por particulares que agregaram áreas públicas a seu domínio, em outros casos as áreas públicas foram utilizadas por populações carentes que utilizam esses espaços para estabelecer sua residência, principalmente em decorrência dos movimentos migratórios do campo para a cidade como consequência da industrialização e, o que é pior, em muitas ocasiões a própria Administração acaba por incentivar o desaparecimento dessa classe de bens através de procedimentos de regularização fundiária. Nessa linha se produz a reforma do Regulamento Hipotecário através do art. 5º, permitindo que os bens de domínio público possam, também, ser objeto de proteção registrária.[155]

Por derradeiro, para entendermos a importância do tema para o registro imobiliário, segundo a FUNAI, a superfície das 488 terras indígenas, cujos processos de demarcação estão na fase “delimitada”, é de 105.673.003 hectares (quase duas vezes o tamanho da Espanha), perfazendo 12,41% do total do território brasileiro, configurando um número impressionante. O quadro a seguir aponta com detalhes a situação das seiscentos e onze glebas deterras indígenas do País quanto ao seu procedimento administrativo de regularização.

Quadro 1

Situação das Terras Indígenas (Resumo Geral)
Nº de T.I’s % Em revisão
Em estudo 123 0
Delimitada 33 1,66 1.751.576
Declarada 30 7,67 8.101.306
Homologada 27 3,40 3.599.921
Regularizada 398 87,27 92.219.200
Total 611 100 105.672.003

 

Fonte: Disponível em: <www.funai.gov.br>. Acesso em: 15 set. 2008.

4.7 Florestas Públicas

Lei 11.284, de 2 de março de 2006, dispõe sobre a gestão de florestas públicas para produção sustentável, institui o Serviço Florestal Brasileiro (SFB), na estrutura do Ministério do Meio Ambiente, e cria o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal (FNDF). Também foi criado o Cadastro Nacional de Florestas Públicas, interligado ao Sistema Nacional de Cadastro Rural e integrado pelo Cadastro-Geral de Florestas Públicas da União e cadastros de florestas públicas dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (art. 14).

Em 20 de março de 2007, foi publicado o Dec. 6.063 que regulamentou a Lei de Concessão de Florestas Públicas, estabeleceu que o CFPU é composto por três estágios: identificação, delimitação e demarcação (art. 3º). O § 2o do art. 3º do Decreto Regulamentador estabelece que “o estágio de delimitação, os polígonos de florestas públicas federais serão averbados nas matrículas dos imóveis públicos”.

Finalmente, em 9 de julho de 2007, o Ministério do Meio Ambiente publicou a Resolução 02, que regulamenta o Cadastro Nacional de Florestas Públicas e estabelece a comunicação com o Registro de Imóveis, vejamos:

Art. 9º Na fase de delimitação, a floresta pública da União terá seu perímetro averbado junto à matrícula do Registro de Imóveis.

§ 1º Para os fins do disposto no caput, o Serviço Florestal Brasileiro deverá identificar o número da matrícula no Cartório de Registro de Imóveis.

§ 2º Será encaminhado ao respectivo Cartório de Registro de Imóveis o requerimento da averbação do perímetro da floresta pública delimitada, nos termos do art. 13, II, da Lei 6.015, de 31 de dezembro de 1973.

§ 3º No CFPU, constará o número da matrícula do Registro de Imóveis e os dados do respectivo Cartório de Registro de Imóveis, onde foi realizada a averbação da Floresta Pública Federal.

Art. 10 O Serviço Florestal Brasileiro informará a averbação da floresta pública na matrícula do Cartório do Registro de Imóveis ao gestor do imóvel onde se localiza a Floresta Pública Federal.

Art. 11 No estágio de delimitação, a estruturação de dados geoespaciais vetoriais, referentes ao mapeamento das florestas públicas da União seguirão a Norma da Cartografia Nacional, de estruturação de dados geoespaciais vetoriais, referentes ao mapeamento terrestre básico que compõe a Mapoteca Nacional Digital, homologada pela Resolução da Comissão Nacional de Cartografia – Concar 1, de 02 de agosto de 2006.

Art. 12. A delimitação geográfica e o memorial descritivo das florestas públicas da União deverão conter as seguintes informações:

I – a descrição do perímetro, com as coordenadas geográficas, e as confrontações em sentido direito (sentido horário);

II – o azimute e a distância entre os vértices;

III – o Meridiano Central (MC) da região, tendo como referencial planimétrico o Datum SAD69 até a adoção oficial do Sistema de Referência Geocêntrico para as Américas (Sirgas 2000).

§ único. Para fins do disposto no caput, todas as florestas públicas da União deverão ser georreferenciadas com precisão e projeção equivalente ou superior às cartas topográficas de maior escala editoradas pelo Exército Brasileiro ou pelo IBGE, de acordo com o Dec. 89.817, de 20 de junho de 1984.[156]

Os bens públicos não necessitam da publicidade registral para garantir os direitos de seus titulares já que são inalienáveis; por decorrência, também imprescritíveis e impenhoráveis. Contudo, é notório que cada vez mais o Registro de Imóveis está sendo reconhecido como um importante reforço da publicidade legal; e foi justamente isso que ocorreu com as florestas públicas da União.

No entanto, muitas dúvidas irão surgir na aplicação desses preceitos legais e regulamentares, principalmente porque se prevê que o perímetro da floresta pública pertencente à União será averbado no Registro de Imóveis, provavelmente inaugurando a cadeia dominial do imóvel.

A grande maioria das terras públicas, principalmente as que não foram objeto de ação ou procedimento administrativo discriminatório, não possuem acesso ao Registro de Imóveis, mas não se nega a dificuldade do registrador em saber se a área a ser aberta já não possui matrícula ou transcrição, mesmo que lançada em nome de particulares como é comum em algumas regiões do Brasil.

Como salientamos quando do capítulo sobre terras indígenas, é possível a abertura de matrícula de bens públicos por meio das leis 5.972/73 e 11.481/2007. Porém, infelizmente o legislador perdeu a oportunidade de outorgar maior publicidade aos procedimentos de concessão de florestas públicas. Uma vez registrada a concessão das florestas públicas, qualquer interessado poderia solicitar uma certidão para ter pleno conhecimento da situação jurídica do imóvel, o que seria facilitado pela localização dos cartórios de Registro de Imóveis.

A concessão florestal tem como objeto a exploração de produtos e serviços florestais, contratualmente especificados em unidade de manejo de floresta pública, ou seja, existe previsão contratual e indubitavelmente trata-se de direito real sobre coisa alheia, ratificando o destinatário natural das concessões como o Registro de Imóveis. Voltamos à clandestinidade jurídica em que o cidadão, para certificar-se da situação jurídica do imóvel, deve peregrinar pelos órgãos públicos das mais variadas instâncias e escalões sem, contudo, lograr a segurança jurídica necessária.

Enfim, a utilização da estrutura do Registro de Imóveis brasileiro poderia contribuir significativamente para a publicidade e redução de custos para a implantação do cadastro nacional de florestas públicas.

4.8 Limitações administrativas provisórias

A Lei 11.132, de 4 de julho de 2005 – que introduziu o art. 22-A na Lei 9.985/2000 e que dispõe sobre as unidades de conservação – criou o instituto da limitação administrativa provisória para áreas que possuam certa potencialidade de transformação em unidades de conservação. Assim, quando houver risco de dano grave aos recursos naturais de determinada área que está em estudo de viabilidade para criação de unidade de conservação, o órgão ambiental competente poderá decretar limitações administrativas pelo prazo de sete meses, não sendo permitida a prorrogação.

A Lei 9.985/2000 conceitua unidade de conservação como o

[…] espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção (art. 2º, I).

Basicamente, são espécies de unidades de conservação: Área de Proteção Ambiental; Área de Relevante Interesse Ecológico; Floresta Nacional; Reserva Extrativista; Reserva de Fauna; Reserva de Desenvolvimento Sustentável; e Reserva Particular do Patrimônio Natural.

As restrições advindas da limitação administrativa provisória são sérias, repercutindo, inclusive, no direito real de propriedade, já que a exploração do imóvel pode ser interrompida. Defendemos a tese de que referidas restrições transcendem o cadastro dos órgãos públicos e afetam direitos controlados e publicizados pelo Registro de Imóveis, de sorte que necessitam, também, ingressar no fólio real.

A limitação administrativa provisória, a exemplo do que ocorre com as indisponibilidades de bens, deve ingressar no Registro de Imóveis porque interessa ao mundo jurídico. O proprietário e terceiros de boa-fé devem ter conhecimento de que se estão promovendo estudos para a transformação de determinada área em unidade de conservação e somente o Registro de Imóveis pode outorgar essa publicidade de forma satisfatória, porque a ele, e somente a ele, cabe a inscrição de direitos reais de bens imóveis.

A publicidade dessas limitações administrativas deve ocorrer no Registro de Imóveis; porém, devido a seu caráter provisório, o acesso poderia ser efetivado pelo Livro 1º a requerimento da autoridade ambiental competente. Seria cancelada, automaticamente, no final do prazo; como não configura nenhum impedimento de registro de outros atos, a publicidade alcançaria seu objetivo.

4.9 Protocolo de Kyoto e o Registro de Imóveis

O Protocolo de Kyoto (ou Quioto) estabeleceu que os países signatários considerados industrializados (listados no Anexo I do documento) são obrigados a reduzir em 5,2% suas emissões de gás carbônico (CO2) em relação ao nível emitido em 1990, tendo como meta o período entre 2008 e 2012. Infelizmente, os Estados Unidos, um dos maiores poluidores do planeta, não assinaram o protocolo. Para evitar que o cumprimento da meta cause grande impacto no desenvolvimento de tais países, o Protocolo prevê em seu art. 12 um instrumento de compensação do carbono jogado na atmosfera, conhecido como Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), tendo como instrumento os Certificados de Emissões Reduzidas (CER) ou Créditos de Carbono. Assim, para que empresas não entrem em colapso e possam compensar seus altos níveis de emissão de carbono, os países desenvolvidos devem adquirir os chamados créditos de carbono, gerados com projetos que aprisionem ou seqüestrem os gases.

O Protocolo de Kyoto integrou o ordenamento jurídico nacional por meio do Dec. Federal 5.445, de 12 de maio de 2005. No Brasil, a emissão de certificados é realizada sob o controle normativo do Ministério da Ciência e Tecnologia que criou a Comissão Interministerial de Mudança Global do Clima, que é responsável pela emissão de resoluções operativas que introduziram o MDL no País.

Na prática – ou resumindo – os títulos representativos de carbono não possuem nenhuma vinculação com as autoridades ambientais e muito menos diretamente com os espaços territoriais especialmente protegidos, o que afasta, no nosso entendimento, a possibilidade de qualquer correlação com o Registro de Imóveis. Não poderia ser diferente, o Registro de Imóveis atua no direito ambiental como mero ator coadjuvante, reforçando a publicidade legal, bem como cooperando com o cumprimento e garantia das obrigações ambientais. Não podemos olvidar, outrossim, que o número de espaços territoriais especialmente protegidos que, no momento, acessam o fólio real é mínimo comparado à dimensão dos grandes biomas brasileiros.

4.10 O domínio das águas e o Registro de Imóveis

Questão interessante e tem toda a relevância para o direito ambiental e registral é sobre o domínio das águas. Saber da propriedade do leito e das águas é essencial para a atribuição das responsabilidades então inerentes ao respectivo direito. O Registro de Imóveis precisa definir a questão da dominialidade das águas para o procedimento de retificação de registro para que as notificações decorrentes do art. 213 da Lei nº 6.015/73. O Direito ambiental precisa da definição para a demarcação das áreas de proteção permanente e atribuir as responsabilidades.

As águas depois da Constituição Federal e Lei Federal 9.433, de 08/01/1997 (Recursos Hídricos), são públicas[157](Estaduais ou da União), o mesmo se aplicando ao leito (consequência lógica) se o curso em questão (rio, riacho, córrego) tem estabilidade ou melhor, não variável sofrendo influências em decorrência das cheias. Quando existe o fenômeno da variabilidade do leito a doutrina tem entendido de forma distinta sobre a questão da propriedade dos leitos, de sorte que é possível identificar uma afetação pública da propriedade privado enquanto as águas estiverem ocupando as terras[158].

Água é o conteúdo do álveo, seu continente. É a substância líquida depositada perenemente na depressão, seu suporte físico segundo Cretella: “Não é possível conceber curso d’água sem pelo menos dois elementos essenciais, o elemento líquido, a água e o sólido, o álveo, o leito, suporte da corrente hídrica (…) Entende-se por leito ou álveo a porção de terreno que a água cobre sem transbordar para o solo natural, habitualmente enxuto. O curso d’água ou corrente d’água constitui assim uma unidade jurídica formada por elementos físicos assinalados, já que um rio não pode ser uma coisa sem ar (….) O domínio hídrico não compreende apenas as águas, mas também é claro o álveo no qual estão contidas e as margens que o delimitam”[159].

José Ribeiro estuda a transição normativa decorrente do advento da Constituição Federal que não recepcionou o antigo Código de Águas, merecendo a transcrição abaixo:

“Tem-se assim que, com o novo disciplinamento dado às águas pela vigente Constituição Federal e pela mencionada Lei 9.433, o Código de Águas (Dec. 24.643, de 10.07.1934) ficou superado, por incompatibilidade, em vários aspectos, mas sobretudo na parte que conceituava e classificava as águas em águas públicas, águas comuns e águas particulares. Pela nova ordem constitucional, as águas serão sempre públicas e isso vem ratificado, expressamente, no art. 1.º, I, da Lei 9.433, ao preceituar que a água é um bem de domínio público. Já não há, portanto, águas particulares (…) Assim sendo, é evidente que não passaram ao domínio público dos Estados apenas as águas que eram particulares, mas também a parte do solo por elas ocupadas (o leito, o álveo ou a porção de terra que é o suporte físico das águas). Portanto os particulares perderam o domínio ou a propriedade não só das águas, mas também do respectivo solo que lhes serve de suporte físico, já que a água “não fica no ar”, mas forma, com o solo a que adere, uma unidade jurídica. E isso tem, indubitavelmente, reflexo nas matrículas dos imóveis onde tais águas se localizam. Essa nova situação jurídica deverá ficar consignada no Registro de Imóveis”[160].

Referido posicionamento é consagrado por ninguém mais de que José Afonso da Silva:

“Essa posição é, hoje, sem sombra de dúvida, agasalhada pela Constituição Federal de 1988. Esta reparte o domínio das águas entre a União e os Estados, modificando profundamente o Código de Águas, eliminando as antigas águas municipais, as comuns e as particulares”[161].

As águas, assim, sempre serão públicas, ou são estaduais (art. 26, inciso I, CF) ou federais (art. 20, inciso III, CF). A princípio, qualquer curso d´água poderia, em tese, seccionar a propriedade imobiliária, o que poderia causar muitos problemas – principalmente cadastrais – razão pela qual entendo que a matrícula do imóvel nos moldes estabelecidos pela doutrina e jurisprudência administrativa registrária, não atende a necessidade do mercado imobiliário e desenvolvimento do próprio sistema registrário[162].

4.11 A Mata Atlântica, a propriedade e o Registro de Imóveis

“Os arvoredos são muitos e grandes, e de infinitas espécies … entre esse arvoredo que é tanto e tamanho e tão basto e de tanta qualidade de folhagem que não se pode calcular”

Pero Vaz de Caminha (Carta ao Rei D. Manuel).

“No que resta – ainda esplendor – da mata Atlântica 
Apesar do declínio histórico, do massacre 
De formas latejantes de viço e beleza. 
Mostra o que ficou e amanhã – quem sabe? acabará 
Na infinita desolação da terra assassinada. 
E pergunta: “Podemos deixar 
Que uma faixa imensa do Brasil se esterilize, 
Vire deserto, ossuário, tumba da natureza?” 

Carlos Drummond de Andrade (A Câmara Viajante)

INTRODUÇÃO À MATA ATLÂNTICA

A Mata Atlântica é um dos biomas[163] mais importantes encontrados no Brasil, que está presente tanto na região litorânea, como nos planaltos e serras do interior, do Rio Grande do Norte ao Rio Grande do Sul. Ao longo de toda a costa brasileira a sua largura varia entre pequenas faixas a grandes extensões, atingindo em média 200 km de largura.

A Floresta atlântica é uma das áreas mais ricas em biodiversidade e mais ameaçadas do planeta e também decretada Reserva da Biosfera e Patrimônio Nacional pela Unesco.  O explorador alemão Alexander von Humbolt[164] a descrevia como uma “floresta sobre uma floresta”. As copas das altas árvores formam o dossel e chegam a atingir de trinta a sessenta metros de altura. As copas das árvores mais altas tocam-se umas nas outras, formando uma massa de folhas e galhos que barra a passagem do sol. Numa parte mais baixa, nascem e crescem arbustos e pequenas árvores, que são os bambus, as samambaias gigantes, líquens que toleram menos luz, formando os chamados sub-bosques. Tanto nas árvores mais altas como nas mais baixas encontram-se várias outras espécies, com diversos tipos de cipós, bromélias, orquídeas e gavinhas. O piso da floresta é coberto pelas forrações. Esse chão é protegido pelas folhas e outros vegetais que caem das árvores ao longo do ano, que servem de alimento para muitos insetos, outros animais e principalmente aos fungos, que são os principais responsáveis pelo processo de decomposição da floresta. Assim, a floresta se alimenta dela mesma.

Não é novidade para ninguém que as florestas da mata atlântica estão ameaçadas. O resultado atual é a perda quase total das florestas originais intactas e a contínua devastação e fragmentação dos remanescentes florestais existentes, o que coloca a Mata Atlântica em péssima posição de destaque, como um dos conjuntos de ecossistemas mais ameaçados de extinção do mundo. De uma área original superior a 1,3 milhão de km² distribuída ao longo de dezessete estados brasileiros, restam hoje apenas 8,5 % de remanescentes florestais acima de 100 hectares do que existia originalmente e somados todos os fragmentos de floresta nativa acima de 3 hectares, restaria atualmente 12,5%.

PROTEÇÃO JURÍDICA DA MATA ATLÂNTICA

A Constituição Federal, no artigo 225, § 4º, declara que a Mata Atlântica é patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.

O revogado Decreto Federal nº 750, de 10 de fevereiro de 1993, proibiu o corte, a exploração e a supressão de vegetação primária ou nos estágios avançado e médio de regeneração da Mata Atlântica (art. 1º), sendo que a supressão e a exploração de vegetação secundária, em estágio inicial de regeneração, seria regulamentada pelo IBAMA.

Lei Federal nº 11.428, de 22 de dezembro de 2006, dispõe sobre a utilização e proteção da vegetação nativa do Bioma Mata Atlântica e cria como princípio basilar o tratamento diferenciado da floresta atlântica com relação ao corte, supressão e exploração da vegetação primária ou secundária (art. 8º).

A Mata Atlântica, assim, em duas hipóteses merece tratamento diferenciado, quando é primária ou secundária, neste caso em estágios avançado e médio de regeneração (art. 11 da LMA). A definição dessas espécies de vegetação deve ser conferida pelo Conselho Nacional de Meio Ambiente – Conama (art. 4º), sendo que referida classificação não sofrerá qualquer alteração em razão de incêndio, desmatamento ou qualquer outro tipo de intervenção não autorizada ou licenciada (art. 5º).

Resolução Conama nº 388, de 23 de fevereiro de 2007, convalidou as resoluções anteriores que definem as vegetações primária e secundária nos estágios inicial, médio e avançado de regeneração. A resolução Conama nº 10, de 1º de outubro de 1993, traz as definições básicas:

Vegetação Primária: vegetação de máxima expressão local, com grande diversidade biológica, sendo os efeitos das ações antrópicas mínimos, a ponto de não afetar significativamente suas características originais de estrutura e de espécies (art. 2º, I).

Vegetação Secundária ou em Regeneração: vegetação resultante dos processos naturais de sucessão, após supressão total ou parcial da vegetação primária por ações antrópicas (atuação humana) ou causas naturais, podendo ocorrer árvores remanescentes da vegetação primária (art. 2º, II).

O art. 3º da resolução assim define os estágios de regeneração da vegetação secundária:

I – Estágio Inicial: a) fisionomia herbáceo/arbustiva de porte baixo, com cobertura vegetal variando de fechada a aberta; b) espécies lenhosas com distribuição diamétrica de pequena amplitude; c) epífitas, se existentes, são representadas principalmente por líquenes, briófitas e pteridófitas, com baixa diversidade; d) trepadeiras, se presentes, são geralmente herbáceas; e) serapilheira, quando existente, forma uma camada fina pouco decomposta, contínua ou não; f) diversidade biológica variável com poucas espécies arbóreas ou arborescentes, podendo apresentar plântulas de espécies características de outros estágios; g) espécies pioneiras abundantes; h) ausência de sub-bosque.

II – Estágio Médio: a) fisionomia arbórea e/ou arbustiva, predominando sobre a herbácea, podendo constituir estratos diferenciados; b) cobertura arbórea, variando de aberta a fechada, com a ocorrência eventual de indivíduos emergentes; c) distribuição diamétrica apresentando amplitude moderada, com predomínio de pequenos diâmetros; d) epífitas aparecendo com maior número de indivíduos e espécies em relação ao estágio inicial, sendo mais abundantes na floresta ombrófila; e) trepadeiras, quando presentes são predominantemente lenhosas; f) serapilheira presente, variando de espessura de acordo com as estações do ano e a localização; g) diversidade biológica significativa; h) subosque presente.

III – Estágio Avançado: a) fisionomia arbórea, dominante sobre as demais, formando um dossel fechado e relativamente uniforme no porte, podendo apresentar árvores emergentes; b) espécies emergentes, ocorrendo com diferentes graus de intensidade; c) copas superiores, horizontalmente amplas; d) distribuição diamétrica de grande amplitude; e) epífitas, presentes em grande número de espécies e com grande abundância, principalmente na floresta ombrófila; f) trepadeiras, geralmente lenhosas, sendo mais abundantes e ricas em espécies na floresta estacional; g) serapilheira abundante; h) diversidade biológica muito grande devido à complexidade estrutural; i) estratos herbáceo, arbustivo e um notadamente arbóreo; j) florestas neste estágio podem apresentar fisionomia semelhante à vegetação primária; l) subosque normalmente menos expressivo do que no estágio médio; m) dependendo da formação florestal, pode haver espécies dominantes.

Analisados os conceitos legal e normativo de floresta de mata atlântica primária e secundária em estágio avançado e médio, precisamos agora analisar e entender que tipo de restrição vigora para as propriedades que possuam referidas características. De um modo geral, a supressão de vegetação de Mata Atlântica é autorizada excepcionalmente e em apenas alguns casos. O primeiro deles é em casos de utilidade pública relativo à atividades de segurança nacional e proteção sanitária, obras essenciais de infraestrutura de interesse nacional destinada aos serviços públicos de transporte, saneamento e energia; e em casos de interesse social em atividades imprescindíveis à proteção da integridade da vegetação nativa, de manejo agroflorestal sustentável e demais obras, planos atividades ou projetos definidos em resoluções do Conselho Nacional de Meio Ambiente – Conama.

O artigo 11 da Lei da Mata Atlântica traz hipóteses de vedação absoluta do corte e da supressão de vegetação primária e secundária nos estágios avançado e médio, ressaltando a importância da preservação do Bioma, lembrando Paulo Affonso Leme Machado tratar-se de “explicitação de situações referentes ao papel a ser exercido pela vegetação e de situações concernentes aos proprietários ou posseiros”[165]. Alexandre Gaio, por sua vez, entende que a lei no referido dispositivo, “apresenta algumas hipóteses gerais de proibição de corte e supressão dessas espécies de vegetação”, entendendo que existe uma priorização a proteção de remanescentes que detenham situações “que justificam a existência de restrições mais densas” [166]. Assim, com relação à vegetação, deve “a) abrigar espécies da flora e da fauna silvestres ameaçadas de extinção, em território nacional ou em âmbito estadual, assim declaradas pela União ou pelos Estados, e a intervenção ou o parcelamento puserem em risco a sobrevivência dessas espécies; b) exercer a função de proteção de mananciais ou de prevenção e controle de erosão; c) formar corredores entre remanescentes de vegetação primária ou secundária em estágio avançado de regeneração; d) proteger o entorno das unidades de conservação; ou e) possuir excepcional valor paisagístico, reconhecido pelos órgãos executivos competentes do Sistema Nacional do Meio Ambiente – Sisnama (inciso II).

Na parte final do art. 11, mais precisamente em seu inciso II, inovou-se na proteção do Bioma Atlântico ao proibir qualquer tipo de intervenção se o proprietário não estiver cumprindo as obrigações relativas à reserva legal florestal e área de preservação permanente, hoje constantes do Código Florestal de 2012 (Lei nº 12.651).

O artigo 14 da LMA trouxe grande polêmica e problemas de interpretação. Vejamos:

“A supressão de vegetação primária e secundária no estágio avançado de regeneração somente poderá ser autorizada em caso de utilidade pública, sendo que a vegetação secundária em estágio médio de regeneração poderá ser suprimida nos casos de utilidade pública e interesse social, em todos os casos devidamente caracterizados e motivados em procedimento administrativo próprio, quando inexistir alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto, ressalvado o disposto no inciso I do art. 30 e nos §§ 1o e 2o do art. 31 desta Lei” (14).  

A dúvida se restringe em conciliar a possibilidade de supressão em casos de utilidade pública (matas primária e secundária e estágio avançado de regeneração) e utilidade pública e interesse social (secundária em estágio médio de regeneração).

A Procuradoria Geral da União em parecer datado de 07 de março de 2012, em consulta do Ministério do Meio Ambiente – MMA e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, entendeu a nosso ver, estranhamente que “o disposto nos arts. 11, 14 20 24 da Lei n° 11.428, de 2006, no sentido de que regra geral de proteção prevista no art. 11 cede às cláusulas excepcionais autorizadoras de supressão de vegetação definidas pelos arts. 14 20 24”[167]. Para nós, a interpretação que atenderia a finalidade da norma ambiental é que a regra do artigo 11 seja absoluta porque as situações são extremamente sensíveis e colocam em risco um bem muito maior que a utilidade pública ou interesse social, que é um Bioma quase extinto que é a Mata Atlântica.

MATA ATLÂNTICA (REGRAMENTO GERAL)

A limitação à supressão em áreas rurais está explicitada de forma clara nos artigos 20 a 25 da LMA, dividindo as restrições de acordo com a natureza jurídica da floresta atlântica. Assim, sendo a área confirmada como vegetação primária ou secundária em estágio avançado de regeneração, o corte e a supressão da vegetação “somente serão autorizados em caráter excepcional, quando necessários à realização de obras, projetos ou atividades de utilidade pública, pesquisas científicas e práticas preservacionistas” (arts. 20 e 21).

Sendo a vegetação de mata atlântica secundária em estágio médio de regeneração, a proteção será a mesma que as hipóteses anteriores, incluindo a exceção, permitindo-se a supressão “quando necessários ao pequeno produtor rural e populações tradicionais para o exercício de atividades ou usos agrícolas, pecuários ou silviculturais imprescindíveis à sua subsistência e de sua família, ressalvadas as áreas de preservação permanente e, quando for o caso, após averbação da reserva legal”.

A LMA ainda existe, além da respectiva autorização do órgão ambiental competente (Estadual ou Federal, se for o caso) ainda existe o Estudo Prévio de Impacto Ambiental– EIA para todas as hipóteses e Relatório de Impacto Ambiental- RIMA para vegetação em estágio primário (art. 225, § 1º, IV, CF).

Existe também a proteção para a vegetação secundária em estágio inicial de regeneração do Bioma Mata Atlântica, devendo o corte, a supressão e a exploração ser autorizado pelo órgão estadual competente (art. 25), com a observação de que se “a vegetação primária e secundária remanescente do Bioma Mata Atlântica for inferior a 5% (cinco por cento) da área original, submeter-se-ão ao regime jurídico aplicável à vegetação secundária em estágio médio de regeneração, ressalvadas as áreas urbanas e regiões metropolitanas” (parágrafo único, art. 25), permitindo-se ainda a prática agrícola do pousio nos Estados da Federação onde tal procedimento é utilizado tradicionalmente (art. 26). 

2ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente do Tribunal de Justiça de São Paulo entendeu que as restrições administrativas do Bioma Mata Atlântica são as constantes dos artigos 20 a 25, devendo o proprietário provar o enquadramento nas exceções constantes da lei, não necessitando a vinculação às hipóteses previstas no art. 11 da LMA[168].

Finalmente, é importante ressaltar que apenas para os pequenos produtores rurais[169] e para as populações tradicionais[170] é permitida a exploração eventual, sem propósito comercial, de madeira nativa – com exceção das espécies ameaçadas de extinção – para consumo nos seus imóveis rurais. Neste caso não precisa de autorização do órgão ambiental (art. 9º da LMA).

MATA ATLÂNTICA EM ÁREAS URBANAS E REGIÕES METROPOLITANAS

Com relação a imóveis localizados em áreas urbanas ou metropolitanas, existe um regramento especial, sendo que supressão de vegetação no estágio médio de regeneração localizada em área urbana depende de autorização do órgão ambiental municipal, com anuência prévia do órgão estadual, desde que o Município possua conselho de meio ambiente, com caráter deliberativo e plano diretor (art. 14, § 2o).

Com relação a empreendimentos imobiliários em áreas de mata atlântica elaboramos o seguinte quadro que pode melhorar a compreensão:

Estágio da Mata Atlântica Empreendimentos até 26/12/2006 (vigência da LMA) Empreendimentos posteriores a 26/12/2006 (vigência da LMA)
Vegetação primária É vedada a supressão (Art. 30) É vedada a supressão (Art. 30)
Vegetação secundária em estágio avançado de regeneração Dependerá de prévia autorização do órgão estadual competente e somente será admitida, para fins de loteamento ou edificação, no caso de empreendimentos que garantam a preservação de vegetação nativa em estágio avançado de regeneração em no mínimo 50% (cinquenta por cento) da área total coberta por esta vegetação, ressalvado o disposto nos arts. 11, 12 e 17 desta Lei e atendido o disposto no Plano Diretor do Município e demais normas urbanísticas e ambientais aplicáveis (Art. 30, I) É vedada a supressão de vegetação secundária em estágio avançado de regeneração do Bioma Mata Atlântica para fins de loteamento ou edificação (art. 30, II).   
Vegetação secundária, em estágio médio de regeneração.   Devem obedecer ao disposto no Plano Diretor do Município, autorização do órgão estadual competente, ressalvado o disposto nos arts. 11, 12 e 17 da Lei (art. 31, caput) A supressão dependerá de prévia autorização do órgão estadual competente e somente será admitida no caso de empreendimentos que garantam a preservação de vegetação nativa em estágio avançado de regeneração em no mínimo 50% da área total coberta por esta vegetação, ressalvado o disposto nos arts. 11, 12 e 17 da LMA e atendido o disposto no Plano Diretor do Município (Art. 31, § 1o ) Nos perímetros urbanos delimitados após a data de início de vigência desta Lei, a supressão de vegetação secundária em estágio médio de regeneração fica condicionada à manutenção de vegetação em estágio médio de regeneração em no mínimo 50% da área total coberta por esta vegetação (Art. 31,§ 2o ).   
Vegetação secundária em estágio inicial de regeneração O corte, a supressão e a exploração serão autorizados pelo órgão estadual competente (art. 25). Lembrando ainda que o corte, a supressão e a exploração nesta hipótese, quando a vegetação primária e secundária remanescente do Bioma Mata Atlântica for inferior a 5% da área original, submeter-se-ão ao regime jurídico aplicável à vegetação secundária em estágio médio de regeneração, ressalvadas as áreas urbanas e regiões metropolitanas.    Idem

Em todos os casos de supressão de vegetação para fins de loteamento ou edificação, também deve ocorrer a compensação ambiental, com destinação de área equivalente à extensão da área desmatada, com as mesmas características ecológicas, sempre que possível na mesma microbacia hidrográfica, e em áreas localizadas no mesmo Município ou região (art. 17 da LMA).

NATUREZA JURÍDICA DA MATA ATLÂNTICA

A vegetação atlântica é considerada bem imóvel por expressa disposição constante do art. 79 do Código Civil[171], de forma que integra o direito de propriedade. No entanto, como vimos, referida propriedade está afetada fortemente à preservação ambiental quando existir vegetação atlântica primária ou secundária em estágios médio ou avançado. Não podendo o proprietário usufruir regularmente do uso do imóvel, malgrado permaneça como dono.

Os administrativistas foram os primeiros a estudar as limitações do direito de propriedade, utilizamos como referência os critérios e nomenclaturas de Hely Lopes Meirelles, para o saudoso professor, intervenção na propriedade privada é “todo ato do Poder Público que compulsoriamente retira ou restringe direitos dominiais privados ou sujeita o uso de bens particulares a uma destinação de interesse públicos”[172]. Seguindo intervenção na propriedade privada como gênero, teríamos como espécies as desapropriações, as servidões administrativas, as requisições, as ocupações temporárias e as limitações administrativas.

Configura limitação administrativa a afetação de floresta de mata atlântica primária ou secundária em regeneração, não retirando, assim, a perda da propriedade. Existe uma restrição à utilização da propriedade imobiliária em seus atributos plenos. Leciona Maria Sylvia Zanella Di Pietro que “se a restrição que incide sobre imóvel for em benefício de interesse público genérico e abstrato, como a estética, a proteção do meio ambiente, a tutela do patrimônio histórico e artístico, existe limitação à propriedade, mas não servidão”[173]. E como não existe perda do direito de propriedade, mas sim uma restrição, não podemos falar em desapropriação indireta.

A questão já foi debatida inúmeras vezes pelo Superior Tribunal de Justiça, tendo sido pacificada por ocasião do julgamento dos EREsp 901.319⁄SC, Rel. Min. Eliana Calmon, Primeira Seção, DJe 03⁄08⁄2009, cuja ementa é a seguinte:

“ADMINISTRATIVO – LIMITAÇÃO ADMINISTRATIVA OU DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA – PROIBIÇÃO DO CORTE, DA EXPLORAÇÃO E DA SUPRESSÃO DE VEGETAÇÃO PRIMÁRIA OU NOS ESTÁGIOS AVANÇADO E MÉDIO DE REGENERAÇÃO DA MATA ATLÂNTICA – DECRETO ESTADUAL 750⁄93

1. A jurisprudência do STJ é unânime, sem divergências, de que as limitações administrativas à propriedade geral obrigação de não fazer ao proprietário, podendo ensejar direito à indenização, o que não se confunde com a desapropriação.

2. A desapropriação indireta exige, para a sua configuração, o desapossamento da propriedade, de forma direta pela perda da posse ou de forma indireta pelo esvaziamento econômico da propriedade.

3. A proibição do corte, da exploração e da supressão de vegetação primária ou nos estágios avançado e médio de regeneração da mata atlântica (Decreto 750⁄93) não significa esvaziar-se o conteúdo econômico.

4. Discussão quanto aos institutos que se mostra imprescindível quando se discute o prazo prescricional.

5. Na limitação administrativa a prescrição da pretensão indenizatória segue o disposto no art. 1° do Dec. 20.910⁄32, enquanto a desapropriação indireta tem o prazo prescricional de vinte anos.

6. Embargos de divergência não providos”.

Desta forma, os efeitos da Lei nº 11.428, de 22 de dezembro de 2006, caracterizam limitação administrativa, não subtraindo do proprietário os poderes inerentes ao domínio, motivo pelo qual não há que se falar em indenização[174]. Interessante que o art. 35 da LMA expressamente declara que “a conservação, em imóvel rural ou urbano, da vegetação primária ou da vegetação secundária em qualquer estágio de regeneração do Bioma Mata Atlântica cumpre função social e é de interesse público, podendo, a critério do proprietário, as áreas sujeitas à restrição de que trata esta Lei ser computadas para efeito da Reserva Legal e seu excedente utilizado para fins de compensação ambiental ou instituição de Cota de Reserva Ambiental – CRA”.  Dessa forma, a tese da desapropriação indireta fica ainda mais enfraquecida porque o excedente do Bioma da Mata Atlântica ainda poderá ter uma finalidade econômica com compensação ambiental de outras propriedades.

PUBLICIDADE DA AFETAÇÃO DA ÁREA COMO MATA ATLÂNTICA PRIMÁRIA OU SECUNDÁRIA EM RECUPERAÇÃO

Não resta dúvida que a vegetação de mata atlântica nas hipóteses previstas por lei possui a natureza jurídica de limitação administrativa/ambiental, passível de averbação, assim, na matrícula dos imóveis rurais a exemplo do que já ocorre com inúmeros espaços ambientais protegidos como as áreas de proteção e recuperação de mananciais, reserva florestais legais, limitações administrativas provisórias, tombamentos etc.

FUNDAMENTOS PARA A PUBLICIDADE NO REGISTRO DE IMÓVEIS

Os atos registráveis (lato senso) não são taxativos, ou seja, as averbações previstas no art. 167, II, da Lei 6.015/73 não somente as definidas expressamente. O artigo 246 da referida lei, permite a averbação de qualquer ato que altere o registro, outorgando publicidade para casos não expressamente autorizados pela lei, mas é pacífico que podemos interpretar que qualquer ato que, mesmo reflexamente, possam limitar o direito de propriedade ou ainda de grande relevância para o direito inscrito, justifica o ingresso por meio de averbação de institutos decorrentes do direito ambiental, estabelecendo-se uma fusão entre as publicidades ambiental e registral. É o que alguns registradores denominam “princípio da concentração”, mas que nada mais é um efeito ou consequência da própria transformação do direito de propriedade que pelo art 1.228 do CC, explicita integrar ao conceito de propriedade também aspectos ambientais.[175]

Nesse sentido, já se pronunciou a CG do Estado de São Paulo consagrando a não taxatividade do rol do art. 167, II, da Lei 6.015/73, quando analisou a averbação da reserva legal (Processo CG 53873 – decisão proferida em 30 de janeiro de 1980) e áreas contaminadas (Processo CG 167/2005).

COMPROVAÇÃO DOCUMENTAL

A comprovação de que determinada propriedade imobiliária possui vegetação protegida especialmente do Bioma da Mata Atlântica como mata primária ou secundária em estágio secundário de regeneração em níveis médio e avançado pode ser obtida através de certidão do respectivo órgão ambiental, estadual, federal ou municipal, neste último caso, nos municípios que possuam o plano municipal de conservação e recuperação da mata atlântica previsto no art. 38 da Lei nº 11.428/2006.

Outra hipótese de comprovação é aquela apresentada por meio de “laudo técnico com a respectiva ART, de profissional habilitado (art. 7º, inciso VIII, do Decreto nº 6.660, de 21 de novembro de 2008), devendo conter, extraindo de requisitos constantes do próprio regulamento, “inventário fitossociológico[176] da área a ser cortada ou suprimida, com vistas a determinar o estágio de regeneração da vegetação e a indicação da fitofisionomia original (flora típica de determinada região), elaborado com metodologia e suficiência amostral adequadas (art. 20, V).

Os profissionais habilitados para a confecção do laudo que comprova tratar-se de mata atlântica primária ou secundária e estágios médio e avançado de recuperação, são, pela própria natureza da profissão, os biólogos (art. 2º, inciso I, da Lei nº 6.684, de 31 de setembro de 1979) e engenheiros florestais (Lei nº 4.643, de 31 de maio de 1965resolução nº 186, de 14 de novembro de 1969) podem elaborar referidos laudos e inventários, não excluindo, ainda, outros profissionais cujos laudos são comprovadamente aceitos pelas autoridades ambientais

NATUREZA JURÍDICA DA AVERBAÇÃO

A averbação da Mata Atlântica tem particularidades próprias, obviamente tem a natureza de reforçar ou publicar uma informação na matrícula do imóvel para conhecimento de terceiros, às vezes do próprio proprietário. Além disso, ela permite, no âmbito da qualificação do Oficial de Registro de Imóveis, permitir que os licenciamentos especiais criados com a LMA sejam efetivamente fiscalizados e exigidos quando da apresentação de títulos submetidos à análise do cartório.

A função da averbação também é de prevenção de conflitos já que a publicidade constante da matrícula do respectivo imóvel de que existe vegetação protegida por lei facilitará o acesso da informação por eventuais empreendedores e compradores que não poderão alegar desconhecimento face à publicidade registral.

QUEM PODERIA REQUERER A AVERBAÇÃO?

Considerando que o meio ambiente é bem de uso comum do povo e o fato do § 1º do art. 246 da Lei nº 6.015/76 permitir que qualquer[177] averbação seja realizada por qualquer interessado, não vislumbramos qualquer problema de legitimidade para se requerer a averbação de constatação de mata atlântica na respectiva matrícula do imóvel, obviamente munido de documentação comprobatória que referimos. A Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo vem entendendo o mesmo, permitindo que qualquer pessoa possa, por exemplo, averbar áreas contaminadas nas matrículas dos imóveis, conforme item 12.6, Capítulo XX, das Normas de Serviço. Obviamente o Ministério Público, em razão de sua vocação natural e constitucional (art. 129, inciso III), possui muitas ferramentas para tornar pública a averbação da constatação da Mata Atlântica nos respectivos imóveis, dentre eles podemos relacionar o inquérito e ação a civil pública (Lei nº 7.347/1985), ressaltando-se, ainda, a existência de precedente administrativo permitindo a publicidade registral desses instrumentos[178].

CONSIDERAÇÕES FINAIS DA PUBLICIDADE DA MATA ATLÂNTICA

A vegetação decorrente do Bioma da Mata Atlântica em estados primário e secundário (estágios médio e final) de regeneração exercem juridicamente uma influência sensível no direito de propriedade, merecendo em decorrência da importância ambiental e por meio de tratados internacionais e legislação pátria, de uma ampla publicidade que atinjam a todos (erga omnes), o que somente poderá ocorrer com a utilização dos livros do Registro de Imóveis que refletem a situação jurídica do direito de propriedade através de princípios jurídicos sólidos. A jurisprudência administrativa e os estudos acadêmicos são unânimes em admitir publicidade de eventos ambientais no Registro de Imóveis, desde que criados e estruturados legalmente, o que é o caso do Bioma Mata Atlântica que possui legislação e regramento consolidados.

O principal problema para a preservação da Mata Atlântica é o conflito fundiário, já que os remanescentes sofrem grande pressão dos grandes centros urbanos, sendo que a utilização da publicidade registral servirá de importante ferramenta de prevenção de conflitos, utilizando ainda a qualificação registral (análise do Oficial do Registro de Imóveis) para fiscalizar as restrições e licenciamentos exigidos pela legislação em decorrência do regime especial de proteção que o Bioma da Mata Atlântica possui. 

5. Garantia do cumprimento das sanções e obrigações ambientais

5.1 Publicidade dos meios de repressão ao desrespeito à legislação ambiental. Termos de ajustamento de conduta

Os órgãos públicos legitimados para propor a ação civil pública poderão tomar dos interessados o compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, prevendo inclusive cominações no descumprimento, tendo eficácia de título executivo extrajudicial (§ 6° do art. 5º da Lei 7.347/85), garantindo, assim, a elaboração de um título a ser executado no caso de inadimplemento. Cumpre consignar que a CG de São Paulo já autorizou a publicidade pelo Registro de Imóveis de instauração de inquérito civil investigativo e outras peças de informação, sem necessidade de averbação, conforme interpretação constante do art. 18 da Lei 6.015/73. Assim, o Ministério Público pode oficiar ao Registro de Imóveis a existência de peças de informação, inquérito civil e ação civil pública envolvendo questões de desrespeito ao meio ambiente.

Íntegra da decisão:

DOE 28.07.2000 – Protocolado CG-8.505/2000 – Piracicaba – Juízo de Direito da 1ª Vara Cível.

Ementa: Registro de Imóveis. Recepção e arquivamento, pelo Oficial de Registro de Imóveis, de ofício expedido pelo Ministério Público com notícia da instauração de procedimento ou ação que versa sobre irregularidade no parcelamento do solo. Inclusão dessa informação nas certidões imobiliárias referentes aos registros correspondentes. Possibilidade. Medida que não se confunde com ato de averbação, nem impede a prática de atos de registro ou averbação nos registros atingidos.

Excelentíssimo Senhor Corregedor-Geral da Justiça

Trata-se de expediente encaminhado pelo MM. Juiz Corregedor Permanente dos Oficiais de Registro de Imóveis da Comarca de Piracicaba, relativo a consulta formulada pelo Ministério Público, indagando sobre a possibilidade de que fosse anotada pelos registradores a circunstância, noticiada em ofícios, da existência de procedimento investigatório de irregularidade no parcelamento de determinados imóveis, objeto das matrículas que especifica, assim como de que essa informação viesse a constar das futuras certidões.

A consulta foi formulada em face do MM. Juiz Corregedor Permanente, que, em razão da abrangência e extensão das indagações formuladas, encaminhou os autos a esta Corregedoria-Geral da Justiça.

É o relatório, no essencial.

Opino

A resposta à consulta formulada é positiva e encontra amparo em precedentes da 1ª Vara de Registros Públicos da Comarca da Capital (Processos 240/93 e 1.468/94) e desta Egrégia Corregedoria-Geral da Justiça (Processo CG 1.994/95), no sentido de que a todos interessa a publicidade da informação de que houvera sido proposta ação civil pública ou recebida denúncia criminal pertinentes a irregular parcelamento do solo, razão pela qual se mostra correto o recebimento e arquivamento, pelo oficial registrador, de oficio encaminhado pelo Ministério Público noticiando tais fatos e, como consequência, a inclusão dessa circunstância nas certidões expedidas.

Assim, encaminhada pelo Ministério Público ao oficial de registro de imóveis a comunicação oficial da instauração de procedimento ou ação que versa sobre irregularidade no parcelamento do solo, deve esse ofício ser recepcionado e arquivado, informação que constará das certidões dos registros abrangidos pela notícia.

Essa medida viabiliza, sem ofensa às normas regentes dos registros públicos, assegurar a necessária publicidade às informações constantes do registro, encontrando amparo nas disposições do art. 18 da Lei 6.015/73 e no item 136, do Capítulo XX, do Tomo II das Normas de Serviço da Corregedoria-Geral da Justiça.

É importante deixar claro que a providência mencionada não se confunde com a efetivação de ato de averbação, motivo pelo qual não subsiste o óbice apresentado, no caso em estudo, fundado na falta de previsão legal no rol do art. 167, II, da Lei dos Registros Públicos.

Imprescindível, por fim, deixar expresso, de forma a não deixar margem a qualquer dúvida, que a publicidade aqui tratada não impede a prática de qualquer ato de registro ou de averbação referente aos registros abrangidos pela medida.

Portanto, o parecer que me permito, respeitosamente, submeter ao elevado exame de Vossa Excelência é no sentido de responder positivamente à consulta formulada, no sentido da viabilidade da recepção e arquivamento de comunicação oficial do Ministério Público da instauração de procedimento ou ação que verse sobre irregularidade no parcelamento do solo, informação que constará das certidões dos registros abrangidos pela notícia, o que não se confunde com ato de averbação, nem impede a prática de atos de registro ou averbação nos registros atingidos.

Alvitro, ainda, caso venha a ser aprovado o presente parecer, seja sua ementa publicada juntamente com a decisão de Vossa Excelência.

Subcensura.

São Paulo, 16 de junho de 2000.

(a) Luís Paulo Aliende Ribeiro

Juiz Auxiliar da Corregedoria

Decisão: Aprovo, por seus fundamentos, o parecer do MM. Juiz Auxiliar desta Corregedoria. Publique-se, inclusive a ementa. São Paulo, 04.07.2000. (a) Luís de Macedo – Corregedor Geral da Justiça.

5.2 Certidão negativa de débitos decorrentes de infrações ambientais

O Código Florestal revogado previa, expressamente, no art. 37, a exigibilidade da certidão negativa ambiental para os atos de transmissão no Registro de Imóveis. Em razão da precariedade do texto, que mencionava até “trânsito em julgado de atos administrativos”, o dispositivo era muito criticado e de impossível aplicação, também em razão do extenso rol de autoridades ambientais potenciais.

O novo Código Florestal silencia a respeito, mas reforça a natureza jurídica das obrigações ambientais como propter rem, o que justificaria a exigibilidade, uma vez que o terceiro adquirente responderia, necessariamente, pelas obrigações do antecessor. Aliás, em razão do mesmo argumento, de natureza de obrigação real, o Conselho Superior da Magistratura de São Paulo entendeu dispensável a apresentação de certidões negativas de débitos condominiais previstos na Lei n. 4.591/64.

Perdeu-se também a oportunidade do novo disciplinamento prever a possibilidade de averbação de autos de infração ambiental nas matrículas dos imóveis atingidos, facilitando a fiscalização e cumprimento da obrigação ambiental, como defendemos anteriormente[179].

Uma alternativa para a revogação da necessidade de apresentação no Registro de Imóveis da certidão negativa ambienta seria a adoção da publicidade dos autos de infração administrativa no Registro de Imóveis, medida mais justa porque puniria tão-somente o responsável pelo dano ambiental e não todos os demais proprietários que deveriam diligenciar em vários órgãos ambientais em busca das certidões.

5.3 Publicidade dos autos de infração ambiental

A Lei 10.650, de 16 de abril de 2003, determina que a lavratura de termos de compromisso de ajustamento de conduta e autos de infração e respectivas penalidades impostas pelos órgãos ambientais sejam publicados no Diário Oficial (art. 4º, III e IV).

No entanto, a publicidade decorrente de publicação em órgãos oficiais da Administração é medida totalmente desprovida de eficácia real. Deveria o legislador utilizar a estrutura do Registro de Imóveis para dar publicidade aos autos de infrações ambientais e respectivas multas ambientais. A grande maioria das autuações ocorre diretamente por desrespeito a algum espaço territorial especial protegido como intervenções em reservas legais florestais, desmatamento, incêndios voluntários ou não, estes ainda com a obrigação de reflorestamento, etc.

Conforme estudos prévios do Ministério do Meio Ambiente, menos de dois por cento das multas ambientais são satisfeitas, o que não deixa de ser um absurdo jurídico e social, já que demonstra total desrespeito à legislação ambiental. Inegável que, malgrado tenha conteúdo pecuniário, a infração ambiental possui natureza jurídica de obrigação que acompanha o imóvel nestas hipóteses. A Lei 9.605/98 utilizou a competência constitucional da União para elaborar uma norma geral sobre as infrações administrativas, sendo norma geral que deve ser suplementada pelos Estados e municípios, a fim de atender as peculiaridades locais.

Considera-se infração administrativa ambiental toda ação ou omissão que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação do meio ambiente (art. 70). As infrações administrativas são apuradas em processo administrativo próprio, conforme o critério de ampla defesa e contraditório como também garante a CF (art. 5º, LV).

Conforme o art. 72 da Lei 9.605/98, as infrações administrativas serão punidas por meio de advertência, multa simples, multa diária, apreensão dos animais, produtos e subprodutos da fauna e flora, instrumentos, petrechos, equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração; destruição ou inutilização do produto; suspensão de venda e fabricação do produto; embargo de obra ou atividade; demolição de obra; suspensão parcial ou total de atividades; e restrição de direitos.

Entendemos que as infrações administrativas ambientais que forem punidas com multa e que possuam relação direta com a propriedade imobiliária podem acessar a matrícula respectiva no Registro de Imóveis, em razão do efeito da concentração e art. 246 da Lei 6.015/73. A publicidade registral existiria depois de outorga do prazo para o proprietário se defender, outorgando maior segurança ao ato.

Joaquín Delgado Ramos, registrador espanhol, analisa a utilização do Registro de Imóveis para conferir maior publicidade de obrigações ambientais:

El legislador, además de restringir las facultades dominicales, puede también imponer determinadas oblicaciones legales activas que tengan por causa o finalidad la protección del médio ambiente, y haber que tales obligaciones Sean inherentes a la titularidad de la finca afectada, de modo que, en caso de transmisíon, el nuevo adquirente se subrogue en las obligaciones del anterior. O dicho con otras palabras, afectar legalmente la finca al cumplimiento de tales obligaciones.

Si dichas obligaciones derivan directamente de la ley, sin necesidad de acto aplicativo, tendrían en la propia ley suficiente publicidad, por lo que no precisarian de constancia registral.

[…]

Pero se derivan de un acto concreto, esto es, de un acto administrativo singular que resuelva imponer tal o cual obligación, o de un convenio por el cual el particular asuma determinadas obligaciones de dar, hacer o no hacer, si se haría precisa sua constancia registral para la afectación real o ‘afección’ de la finca y sus futuros titulares.[180]

Não podemos olvidar que, para o acesso do auto de infração ambiental no Registro de Imóveis, seria necessária, a princípio, a criação legislativa respectiva ou orientação normativa do órgão judicial encarregado da fiscalização do Registro de Imóveis. Tal exigência se dá porque se trata de medida inédita no direito registral brasileiro e deve ser precedida de estudos, a exemplo do que ocorreu com as áreas contaminadas que, seguindo estudo nosso de 2004, acabou sendo autorizada a publicidade pela CG do Estado de São Paulo.

Semelhantemente do que ocorre no Estado de São Paulo nas penhoras decorrentes de execuções fiscais (Lei 11.331, de 26 de dezembro de 2002), em que os emolumentos são satisfeitos no final do processo. Visando à implantação sem onerosidade para a Administração, os atos registrários poderiam ser praticados diretamente sem qualquer previsão de emolumentos que seriam satisfeitos quando do cancelamento diretamente pelo interessado.

Com absoluta certeza, a averbação das infrações ambientais no Registro de Imóveis aumentaria o adimplemento das respectivas multas porque se estaria conferindo publicidade erga omnes do ato que, automaticamente, alertaria propensos adquirentes do imóvel e instituições financeiras para a concessão de crédito, que exigiria a satisfação da obrigação.

Por derradeiro, importante ressaltar que a responsabilidade administrativa ambiental é pessoal, não podendo o órgão administrativo punir uma pessoa pelo evento danoso causado por outra. No entanto, no aspecto civil, indubitável que o proprietário poderá ser compelido a reparar o dano a eventual espaço protegido como RLF ou área de preservação permanente, razão que corrobora na necessidade da publicidade de referidas infrações por meio de simples averbação-notícia no Registro de Imóveis.

5.4 FISCALIZAÇÃO DO LICENCIAMENTO AMBIENTAL

O Registro de Imóveis também exerce importante papel na fiscalização do cumprimento do prévio licenciamento ambiental. Isso ocorre de forma mais efetiva quando da análise de projeto de desmembramentos e loteamentos (Lei 6.766/79), onde existe a necessidade do empreendimento ser submetido aos licenciamentos ambientais municipais, estaduais e dependendo do interesse público, também federal. Nas incorporações imobiliárias e condomínios edilícios (Lei 4.591/64) ocorre o mesmo.

Muitas vezes as autoridades ambientais fixam algumas obrigações ao empreendedor que constam do próprio licenciamento como condicionante da própria aprovação, como exemplo, podemos mencionar na necessidade de assinatura de termos de compromisso de arborização pelo proprietário. O registrador quando da qualificação registral, deve solicitar a apresentação de todos os documentos assinalados, além, é óbvio, da análise formalidade do mesmo como órgão ou repartição competente, se o documento é idôneo etc.

5.4.1 Fontes de poluição.

O licenciamento ambiental deve ocorrer sempre que o ato a ser praticado no Registro de Imóveis é uma fonte de poluição, lembrando que a concorrência é estadual na fiscalização e criação legislativa. No Estado de São Paulo a Lei n. 997, de 31 de maio de 1976, criou o “Sistema de Prevenção e Controle da Poluição do Meio Ambiente” (art. 1º), na forma prevista nesta Lei. No § 1º do art. 5º da referida, considera-se “fonte de poluição” qualquer atividade, sistema, processo, operação, maquinaria, equipamento ou dispositivo, móvel ou não, previsto no Regulamento desta lei, que cause ou possa causar poluição ambiental através da emissão de poluentes. Dessa forma, as atividades poluentes devem ser submetidas ao prévio licenciamento perante a CETESB – Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental[181]. A lei foi regulamentada pelo Decreto n. 8.468, de 08 de setembro de 1976, que no artigo 57, inciso X, declara como fonte de poluição “todo e qualquer loteamento ou desmembramento de imóveis, condomínios horizontais ou verticais e conjuntos habitacionais, independentemente do fim a que se destinam”. O § 1º exclui expressamente do licenciamento “os condomínios verticais localizados fora dos municípios litorâneos, cuja implantação não implique a abertura de vias internas de circulação”.

O parágrafo único do artigo 3º da Lei 898/75 exige a manifestação favorável da Secretaria do Meio Ambiente, mediante parecer da Companhia Estadual de Tecnologia de Saneamento Básico e de Defesa do Meio Ambiente para os projetos e a execução de arruamentos, loteamentos, edificações e obras, bem assim a prática de atividades agropecuárias, comerciais, industriais e recreativas, em relação aos imóveis que fazem parte das áreas de proteção de mananciais.

Com relação aos condomínios residenciais, no Estado de São Paulo o Decreto nº 52.053, de 13 de agosto de 2007, criou (reestruturou) o Grupo de Análise e Aprovação de Projetos Habitacionais – GRAPROHAB que analisará e deliberará sobre os seguintes projetos de parcelamento do solo e de núcleos habitacionais urbanos a serem implantados (art. 5º):

I – projetos de loteamentos para fins habitacionais; II – projetos de conjuntos habitacionais com abertura ou prolongamento de vias públicas existentes; III – projetos de desmembramentos para fins habitacionais que resultem em mais de 10 (dez) lotes não servidos por redes de água e de coleta de esgotos, guias e sarjetas, energia e iluminação pública; IV – projetos de condomínios residenciais que se enquadrem em uma das seguintes situações: a) condomínios horizontais e mistos (horizontais e verticais), com mais de 200 unidades ou com área de terreno superior a 50.000,00m²; b) condomínios verticais, com mais de 200 unidades ou com área de terreno superior a 50.000,00m², que não sejam servidos por redes de água e de coleta de esgotos, guias e sarjetas, energia e iluminação pública; c) condomínios horizontais, verticais ou mistos (horizontais e verticais) localizados em área especialmente protegidas pela legislação ambiental com área de terreno igual ou superior a 10.000,00m².

O art. 3º, III, da Lei 6.766/79 não permite o parcelamento “em áreas de preservação ecológica”. É preciso consignar que a expressão “área de preservação ecológica” se refere a todos os espaços territoriais especialmente protegidos pelas legislações federal e estaduais, neles incluídas as áreas de preservação permanente. Mas a regra não deve ser interpretada com rigor absoluto; não se pode admitir que um lote seja projetado quase que totalmente em APP porque a finalidade do mesmo é a construção e estaria incompatível com a preservação, mas será possível o parcelamento da área (loteamento, desmembramento ou desdobro) em imóvel que possua APP se o lote for atingido em pequena extensão pela limitação administrativa. Caso contrário, bastaria um córrego, lago ou outro curso d’água na área a ser loteada para inviabilizar o empreendimento. 

6 Experiência internacional

Como foi consignado na introdução do presente trabalho, a Comunidade Européia por meio da Agencia Europea de Médio Ambiente solicitou do Colegio de Registradores de La Propriedade y Mercantiles de España a elaboração de estudo sobre a relação entre os sistemas registrários e meio ambiente. De tal estudo, resultou Experts córner report intitulado El Registro de la Propriedad y Mercantil como instrumento al servicio de la sostenibilidad. Trata-se de trabalho de alto nível técnico-registrário e ambiental e que poderá servir de paradigma para todos os sistemas de registro imobiliário com características semelhantes ao da Espanha, onde se enquadra o Brasil.

O estudo é dividido na área imobiliária em três temas: o registro da propriedade imobiliária como meio de prevenção ao desrespeito ao meio ambiente; o registro da propriedade imobiliária como meio de garantia do cumprimento das sanções ambientais; e o registro imobiliário e a informação ambiental.

O Colégio de Registradores da Espanha tem desenvolvido o estudo do Registro de Imóveis como órgão destinatário de informações ambientais de forma muito eficiente não somente na Espanha, mas em toda União Européia, nos últimos anos, os registradores Francisco de Asís Palacios Criado e Joaquín Delgado Ramos possuíram atuação destacada nesse sentido, abaixo relacionamos as principais atividades.

a) Congresso Internacional de Direito Registral em Fortaleza, Brasil (2005);

b) Congresso Nacional de Registradores da Espanha em Granada, Espanha (2006);

c) Seminário sobre os Princípios organizativos da Oficina Registral da Antigua, Guatemala (2006);

d) Participação no Congresso Nacional de Direito Ambiental, CONAMA 8 em Madri, Espanha;

e) Participação da Diretiva Inspire da União Européia (25 de abril de 2007);

f) Ingresso no IDEE;

g) Designação Decano Presidente como membro do Comitê Consultivo do Pleno do Conselho Superior Geográfico;

h) Participação no projeto VANE;

i) Colaborador na preparação do Regulamento de Responsabilidade Ambiental;

j) Reconhecimento Estatal para os Registros de Imóveis em Matéria ambiental.

O Brasil caminha no mesmo sentido, após o Congresso Nacional de Registradores realizado em 2004 pelo IRIB: o meio ambiente chamou a atenção de registradores; o Registro de Imóveis, por sua vez, despertou interesse aos operadores do direito ambiental. Muitas idéias apresentadas em Maceió já foram incorporadas ao direito registral brasileiro; outras estão em estudo, ou já foram abandonadas, mas o importante é que este papel de guardião da função socioambiental da propriedade, até então desconhecido do Registro de Imóveis, está se desenvolvendo e se consolidando. Isso se dá assim como outras características desse órgão que a cada ano se torna mais importante no direito brasileiro, conferindo segurança jurídica aos negócios envolvendo bens de raiz e corroborando na formação de um juízo preventivo de litígios.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A CF e o CC de 2002 atribuíram ao direito de propriedade – e por consequência ao Registro de Imóveis – a necessidade de incorporação do conceito de função socioambiental da propriedade. O legislador brasileiro, por seu lado, elegeu o Registro de Imóveis para facilitar o acesso à informação ambiental, conferindo maior publicidade e cumprimento das obrigações ambientais em virtude de sua estrutura e confiabilidade.

Somente a União pode legislar sobre registros públicos; não obstante, Estados e Municípios, além de também serem responsáveis pela proteção do meio ambiente, poderem legislar sobre a matéria, surgindo a dificuldade de publicidade no Registro de Imóveis. O rol de atos registráveis constante do art. 167 da Lei 6.015/73 não pode ser taxativo para institutos do direito ambiental, porque estaria a União invadindo a competência material de Estados e Municípios.

O Registro de Imóveis evoluiu juntamente com o direito de propriedade que agora deve obedecer a um contorno socioambiental e urbanístico. O efeito da concentração nada mais é do que o reflexo desse fenômeno e deve ser aplicado para interpretar o art. 246 da Lei 6.015/73 que permite a averbação de qualquer ato que altere o registro, outorgando publicidade para casos não expressamente autorizados pela Lei 6.015/73; mas que de qualquer forma, mesmo reflexamente, possam limitar o direito de propriedade ou ainda de grande relevância para o direito inscrito.

A CF criou os espaços territoriais especialmente protegidos (CF, art. 225), que são espaços geográficos, públicos ou privados, dotados de atributos ambientais relevantes. Os espaços territoriais especialmente protegidossão divididos em quatro grupos: APE, APP, RLF e UC.

É possível a especialização ou consignação de restrições no Registro de Imóveis de quase todos os espaços especialmente protegidos, destacando-se as AC, APRM, APP, RL, APA e RPPN, bem como de inquéritos civis, ações civis públicas, termos de ajustamento de conduta e autos de infração.

É preciso que as informações disponibilizadas ao público em geral sejam confiáveis e de relevância jurídica, além de claras e precisas para facilitar a publicidade, devendo o registrador imobiliário na qualificação de títulos que representem restrição ao direito de propriedade observar e se ater à segurança jurídica. O Código Florestal de 2012 (Lei 12.561) criou o Cadastro Ambiental Rural – CAR, no entanto, não conferiu a publicidade necessária para que a informação ambiental fosse disponibilizada para se facilitar a fiscalização por qualquer pessoal do povo e autoridade ambientais. O Registro de Imóveis opera como um espelho jurídico das informações ambientais e urbanística, sendo que pela flagrante diferença entre cadastro e registro, não deve controlar aspectos inerente ao cadastro, mas somente reforçar sua publicidade. A publicidade ambiental potencializada no Registro de Imóveis garante a publicidade constitucional das informações ambientais porque somente a estrutura registral possui os instrumentos necessários para se chegar à informação como índices para as buscas, facilidade de acesso físico e virtual. 

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1.1 MODELOS

Av.___ em [data]

ÁREA CONTAMINADA

Por termo de área contaminada de [data], da CETESB — COMPANHIA DE TECNOLOGIA DE SANEAMENTO AMBIENTAL, CNPJ nº 43.776.491/0001-70, com sede nesta Capital, na Avenida Professor Frederico Hermann Júnior nº 345, Alto de Pinheiros, subscrito pelo Gerente do Setor de Planejamento de Ações Especiais – CIPE, [nome], e em consonância com a Decisão normativa da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de São Paulo, publicada em 12 de junho de 2006 (processo CG 167/2005), procede-se à presente para constar, a teor do Procedimento CETESB n° [n. procedimento], que foi constatado que o imóvel matriculado, de propriedade de [proprietário], encontra-se contaminado [total ou em parte], com substâncias nocivas à saúde humana [e/ ou substância contaminante]. Consta do referido termo que o proprietário foi notificado no referido procedimento (Prenotação nº , de ). AVERBADO POR:  ___________ Marcelo Augusto Santana de Melo, Oficial.

Av.___ em [data]

RESERVA PARTICULAR DO PATRIMÔNIO PARTICULAR (RPPN)

Foi instituída no imóvel matriculado uma Reserva Particular do Patrimônio Natural nos termos do § 1o do art. 21 da Lei nº 9.985/2000, assim descrita [DESCRIÇÃO DA ÁREA DA RESERVA], estando gravada em caráter perpétuo com o objetivo de conservar a diversidade biológica, permitindo-se somente a pesquisa científica e visitação com objetivos turísticos, recreativos e educacionais, conforme Termo de Compromisso de (data), subscrito pelo proprietário e pelo Diretor do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio (nome).  (Prenotação nº ________ de _____________). AVERBADO POR:  ___________ Marcelo Augusto Santana de Melo, Oficial.

Av.___ em [data]

RESERVA PARTICULAR DO PATRIMÔNIO PARTICULAR (RPPN)

O imóvel matriculado foi instituído como Reserva Particular do Patrimônio Natural nos termos do § 1o do art. 21 da Lei nº 9.985/2000, estando gravado em caráter perpétuo com o objetivo de conservar a diversidade biológica, permitindo-se somente a pesquisa científica e visitação com objetivos turísticos, recreativos e educacionais, conforme Termo de Compromisso de (data), subscrito pelo proprietário e pelo Diretor do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio (nome).  (Prenotação nº ________ de _____________). AVERBADO POR:  ___________ Marcelo Augusto Santana de Melo, Oficial.

Av.___ em [data]

RESERVA FLORESTAL LEGAL

De acordo com a informação eletrônica contida na inscrição no CAR – Cadastro Ambiental Rural, foi especializada a Reserva Florestal Legal que incide sobre parte do imóvel matriculado, com [área]ha, assim descrita: ……….. . A presente é feita nos termos da Lei n. 12.651, de 25 de maio de 2002 e art. 167, inciso II, alínea 22, da Lei n. 6.015/73. (Prenotação nº , de ). AVERBADO POR:  ___________ Marcelo Augusto Santana de Melo, Oficial.

Av.___ em [data]

SICAR – CADASTRO AMBIENTAL RURAL – SP

O imóvel desta matrícula encontra-se inscrito no SICAR – Cadastro Ambiental Rural – SP, sob nº [número_do_cadastro_no_SICAR], emitido em [data], em nome de [Nome_e_CPF], nos termos do requerimento datado de 03 de maio de 2016. Existe Reserva Legal especializada, indicada no Cadastro Ambiental, não tendo sido aprovada ou homologada pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente. (Protocolo n° <protocolo> de <dataprotocolo>). AVERBADO POR: <nomeusuario>, Escrevente. Eu, _____________ (Marcelo Augusto Santana de Melo), Oficial, subscrevi.

Av.___ em [data]

COMPENSAÇÃO DE RESERVA FLORESTAL LEGAL (imóvel beneficiado)

É feita a presente para constar que a reserva florestal do imóvel matriculado é composta através de compensação de excedente florestal do imóvel da matrícula n. [NÚMERO] do Registro de Imóveis da comarca de Araçatuba, Estado de São Paulo, conforme informação eletrônica contida no Cadastro Ambiental Rural – CAR, nos termos do artigo 66, inciso III, do Código Florestal (Lei 12.651/2012) (Prenotação nº , de ). AVERBADO POR:  ___________ Marcelo Augusto Santana de Melo, Oficial.

Av.___ em [data]

COMPENSAÇÃO DE RESERVA FLORESTAL LEGAL (imóvel objeto da compensação)

De acordo com os documentos e planta apresentados,  especialmente o Termo de Compromisso; ou informação constante do Cadastro Ambiental Rural Eletrônico nº [NÚMERO] foi especializada a Reserva Legal, nos termos do art. 12 do Código Florestal (Lei 12.651/2012), que incide sobre  parte(s) do imóvel matriculado, com [ÁREA DA RESERVA] [observar se a compensação foi total] da área total:  [DESCRIÇÃO_DA_ÁREA]. A reserva florestal objeto da presente é decorrente de compensação da reserva devida pelo imóvel da matrícula n. [NÚMERO] do Registro de Imóveis da comarca de Lins, Estado de São Paulo, (Prenotação nº , de ). AVERBADO POR:  ___________ Marcelo Augusto Santana de Melo, Oficial.

Av.___ em [data]

SERVIDÃO AMBIENTAL

Por instrumento [ou Termo de Instituição] datada de [data], com a anuência do (órgão ambiental estadual), o proprietário renúncia o direito de exploração ou exploração da vegetação nativa excedente no imóvel matriculado de forma vitalícia [se temporário constar o período],  nos termos do art. 9-A da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, sobre parte(s) do imóvel matriculado, ssim descrita(s):  [DESCRIÇÃO_DA_ÁREA]. (Prenotação nº , de ). AVERBADO POR:  ___________ Marcelo Augusto Santana de Melo, Oficial.

Av.___ em [data]

EMISSÃO DE COTA DE RESERVA AMBIENTAL – CRA

Foi emitida a Cota de Reserva Ambiental – CRA para a servidão florestal averbada sob n. [MATRÍCULA] da presente matrícula [também pode ser para reserva legal excedente ao legal e voluntária  ou Reserva Particular do Patrimônio Natural – RPPN], nos termos do artigo 44 do Código Florestal (Lei 12.651/2012, , nos termos do certificado de CRA datado de 00/00/000, emitido pelo [órgão responsável no regulamento] (Prenotação nº , de ). AVERBADO POR:  ___________ Marcelo Augusto Santana de Melo, Oficial.


[1] O presente estudo originou-se através do desenvolvimento e inspiração de artigo de minha autoria publicado pela Editora Saraiva em 2010 em que também fui coordenador juntamente com os doutores Francisco de Asis Palácios Criado e Sérgio Jacomino, configurando, no entanto, de obra independente, atualizada inclusive com novo Código Florestal.

[2] Registrador imobiliário em Araçatuba, São Paulo. Mestre em Direito Civil pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUCSP. Especialista em Direito Imobiliário pela Universidade de Córdoba, Espanha e Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais-PUCMINAS. Diretor de Meio Ambiente da Associação dos Registradores Imobiliários de São Paulo – ARISP e Instituto de Registro Imobiliário do Brasil – IRIB.

[3] Os Experts Córner não refletem a opinião da Agência Européia do Meio Ambiente, são estudos realizados a seu pedido no sentido de aumentar a discussão e debate sobre determinadas matérias.

[4] Direito Ambiental: Uma Necessidade. Imprensa da Universidade Federal de Santa Catarina, s/d, p. 15.

[5] AARHUS, 25 jun.1998. A Convenção foi preparada pelo Comitê de Políticas de Meio Ambiente da Comissão Econômica para a Europa das Nações Unidas. Entrou em vigor em 30 out. 2001.

[6] TEIXIDÓ, Marta Valls; SATONJA, Mercedes Tormo. El Registro de la Propriedad y Mercantil como instrumento al servicio de la sostenibilidad. Expert córner report [on line], Colégio de Registradores da Espanha para a Agência Européia de Meio Ambiente. Disponível em: <www.registradores.org> Acesso em: 15 set. 2008.

[7] Direito à Informação ambiental. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 92.

[8] Ob. Cit, p. 92.

[9] Ob. Cit. p. 93.

[10] FEDERAÇÃO BRASILEIRA DE BANCO (FEBRABAN). Balanço Social de 2002 [on line]. Disponível em: <www.febraban.org.br> Acesso em: 15 set. 2008

[11] Prieur, Michel. Princípio da proibição de retrocesso ambiental. Senado Federal: Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle. Colóquio Internacional sobre o Princípio da Proibição de Retrocesso Ambiental, em 29 de março de 2012, coordenado pelo Ministro e Professor Antonio Herman Benjamin, p. 11, disponível em http://www2.senado.gov.br/bdsf/item/id/242559, acesso em 13 de abril de 2013.

[12] Prieur, Michel. Ob. Cit, p. 11.

[13] MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 256.

[14] Prieur, Michel. Ob. Cit, Princípio da proibição de retrocesso ambiental. p. 31.

[15] Benjamin, Herman Benjaminº Princípio da proibição de retrocesso ambiental. Ob. Cit, p. 55.

[16] Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, julgamento de 18 de dezembro de 2008, processo nº 7002162254; Tribunal de Justiça de São Paulo, julgamento de 25 de agosto de 2009, processo nº  5878524400.

[17] Apelação nº 0008915-05.2013.8.26.0577, da Comarca de São José dos Campos, 10 de dezembro de 2015, Relator TORRES CARVALHO, disponível em: https://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getArquivo.do?cdAcordao=9064416&cdForo=0&vlCaptcha=UskNc

[18] SINGER, Joseph William. Introduction to Property, 2nd, Ed., New York: Aspen Publishers, 2005, p. 2.

[19] Duas teorias fundamentais analisam a essência do direito de propriedade: teoria da pertença de cunho qualitativo e a teoria do senhorio ou do domínio que apresenta feição quantitativa. A primeira consubstancia uma situação de pertença de certa coisa a uma pessoa, criando-se assim uma relação de subordinação da coisa ao titular do direito; já a teoria do senhorio ou do domínio, diz-se quantitativa porque identifica o direito de propriedade como o mais vasto direito sobre uma coisa, que assim fica sujeita inteiramente ao titular do direito.

[20] PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. 1ª Ed. Rio de Janeiro / São Paulo: Companhia Editora Forense, 1970, p. 76.

[21] CARVALHO FERNANDES, Luís A. Lições de direitos reais. 6ª edição. Lisboa: Quide Juris, 2009,  p. 334.

[22] PINTO DUARTE, Rui. Curso de Direitos Reais. 2ª edição. Lisboa: Princípia, 2002, p. 47.

[23] Direitos Reais. Coimbra: Editora Coimbra, 2007,  p. 215-216

[24] CORRÊA, Alexandre, SCIASCIA, Gaetano. Manual de Direito Romano. 6ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1988, p. 124.

[25] Curso Elementar de Direito Romano. São Paulo: José Bushatsky, 1971, p. 85.

[26] Op. Cit, p. 49.

[27] ALVIM, Arruda. Comentários ao Código Civil Brasileiro. Vol. XI – Tomo I. Rio de Janeiro: Forense, 2009 P.185-186.

[28] ANTONCICH, Ricardo; CLASEN, Jaime; MUNARRIZ SANS, José Miguel. Ensino social da Igreja. Petrópolis: Vozes, 1986, p. 142-143.

[29] Segundo Tratado sobre o Governo. 2ª Ed, São Paulo: Abril Cultural, 1978, p.45.

[30] DUGUIT, Leon. Las transformaciones del derecho publico y privado. Buenos Aires: Heliasta, 1975. p. 171.

[31] FIGUEIREDO, Guilherme José Purvin de.. A Propriedade no Direito Ambiental. 1ª Ed. Rio de Janeiro: Esplanada, 2004, p. 70.

[32] COMTE, Augusto. Discurso sobre o Espírito Positivo. São Paulo: Abril Cultural, 1978, p. 266.

[33] FERNANDES, Edésio. A nova ordem jurídico-urbanística do Brasil. Minas Gerais: Del Rey, 2006, p. 15.

[34] MILARÉ, Edis. Direito do ambiente. 3. ed. São Paulo: RT, 2004. p. 146-147.

[35] MARÉS, Carlos Frederico. A função social da terra. Porto Alegre: Fabris, 2003. p. 134.

[36] PINEDO, Ignacio Pereña. La función social del derecho de propiedad. In: Propiedad y derecho constitucional. Coord. Francisco J. Bastida. Madrid: Colegio de Registradores da España, 2005. p 179-80.

[37] GRAU, Eros Roberto. Direito urbano. São Paulo: RT, 1983. p. 66-67.

[38] VIEGAS DE LIMA, Frederico Henrique. O Meio Ambiente e o Registro de Imóveis. Coord. Marcelo Augusto Santana de Melo. São Paulo: Saraiva, 2009, no prelo.

[39] PERLINGIERI, Pietro. O Direito Civil na Legalidade Constitucional. Edição Brasileira organizada por Maria Cristina de Cicco. São Paulo: Renovar, 2008, p. 942.

[40] Op. cit, p. 953.

[41] Ética a Nicômaco. 2ª edição 2007. Tradução e notas Edson Bini. Bauru: Edipro, 384-322 a.C, p. 76.

[42] NORONHA, Fernando. Direito das Obrigações. 3a. Edição. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 317.

[43] ApCív 402 646 5/7-00-São Carlos, de 29 jun. 2006.

[44] APELAÇÃO CÍVEL N° 0019751-81.2011.8.26.0100 – São Paulo, de 14 de junho de 2012.

[45] Trechos de terras incultas que os donatários podiam dar aos moradores da capitania, gratuitamente, para que as cultivassem. PORTO, B. Costa. Estudo sobre o sistema sesmarial. Recife: Imprensa Universitária, 1965. p. 68.

[46] CARVALHO, Afrânio de. Registro de imóveis. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1976. Registro de imóveis. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1976. p. 14.

[47] Maria Helena Leonel Gandolfo leciona que matrícula: “É um ato de registro, no sentido lato, que dá origem à individualidade do imóvel na sistemática registral brasileira, possuindo um atributo dominial derivado da transcrição da qual se originou”. Reflexões sobre a matrícula 17 anos depois. Revista de Direito Imobiliário. São Paulo: Revista dos Tribunais, jan.-jun. 1994. v. 33.

[48]MELO, Marcelo A. S. de. Breves anotações sobre o Registro de Imóveis. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 429, 09 set. 2004. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=5669&gt;. Acesso em: 15 set. 2008

[49] VA AGUAVIVA, Mariano. El Registro de la Propriedad y Mercantil como instrumento al servicio de la sostenibilidad . cit., p. 10.

[50] ALVAREZ CAPEROCHIPI, José Antonio. Direito imobiliário registral. Madrid: Civitas, 1986. p. 56.

[51] BALBINO FILHO, Nicolau. Registro de Imóveis. 9 ed. São Paulo. Saraiva, 1999. p. 09.

[52] Justificativa do projeto que deu origem à legislação, assinado por Ruy Barbosa, Manoel F. de Campos Salles e Francisco Glicerio, acompanhado do decreto de regulamentação, publicação sem página de rosto. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1890. p. 49.

[53] PICAZO, Luis Diéz; GULLON, Antonio. Sistema de Derecho Civil. Volumen III. Derecho de cosas y Derecho Inmobiliario Registral. 7 ed. Madrid: Ed. Tecnos, 2004. p. 222.

[54]O fornecimento da certidão não pode ser retardado por mais de 5 (cinco) dias (art. 19 da Lei 6.015/73).

[55] GARCIA, Jose Manuel Garcia. Derecho Inmobiliario Registral o Hipotecário. Tomo I. Madrid: Editorial Civitas, s.d. p. 41.

[56] Sobre o presente tópico Cf. o capítulo sobre a função preventiva de conflitos do registro.

[57] ALMEIDA, Carlos Ferreira de. Publicidade e teoria dos registros. Coimbra: Almedina, 1966. p. 163.

[58] CARVALHO, Afrânio. Registro de Imóveis. 2ֺ ed. Rio de Janeiro: Forense, 1977. p. 29.

[59] OLIVEIRA, Marcelo Salaroli. Publicidade Registral Imobiliária. Sério Direito Registral e Notarial, Coordenador Sergio Jacomino.São Paulo: Saraiva, 2010.

[60][60] ALMEIDA, Carlos Ferreira de. Publicidade e teoria dos registros. Coimbra: Almedina, 1966. p. 163.

[61] Op. cit., p. 219.

[62] Idem, p. 224.

[63] Se a restrição que incide sobre imóvel for em benefício de interesse público genérico e abstrato, como a estética, a proteção do meio ambiente, a tutela do patrimônio histórico e artístico, existe limitação à propriedade, mas não servidão (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 144)

[64] REGISTRO DE IMÓVEIS – Averbação – Reserva legal encravada no bem imóvel rural – Incompatibilidade entre as descrições constantes do título e da matrícula – Princípio da especialidade – Flexibilização – Especialização suficiente para a localização do espaço territorial ambientalmente protegido – Preponderância dos princípios da segurança jurídica e da publicidade – Função socioambiental do Registro de Imóveis – Desqualificação registrária afastada – Recurso provido.

[65] Conselho Superior da Magistratura do Estado de São Paulo. Apel. Cível 29.175-0/0 – São Paulo, D.O.E. de 13.06.1996.

[66] GARCÍA, José Francisco Fernández. Revista Aranzadi de Urbanismo y Edificación. Madrid, n. 9, 2002, p. 62.

[67] Sobre a taxatividade dos atos registrários, pelo brilhantismo das ideias, oportuno transcrever a lição de Dr. Ricardo Henry Marques Dip: No que concerne à terceira proposição – os mesmos direitos reais, sabidamente, são elencados no direito brasileiro em numerus clausus –, concede-se juxta modum. É certo que se adotou no direito pátrio o critério da taxatividade dos direitos reais, mas cabe ao intérprete dizer quais dos direitos alinhados são reais e quais não o são, o que, de conseguinte, afasta um critério de oficialidade literal (a direta doutrina do sens clair normative). A proposta de conclusão sub examine – os fatos suscetíveis de registro estão igualmente previstos de modo taxativo na Lei de Registros Públicos – não se infere das premissas. Desde o plano estritamente lógico-formal não se pode extrair da taxatividade dos direitos reais uma correlata enumeração exaustiva dos atos suscetíveis de registração predial. Apropositam-se a isso alguns tantos fundamentos. Primeiro, o de que o registro imobiliário, como visto, destina-se a acolher títulos não-referentes a direitos reais. Segundo, o de que a taxatividade dos direitos reais não implica restrição consequente dos títulos relativos a esses direitos: ter-se-á notado acaso que, na mescla de uma terminologia criticável, o art. 167 da vigente Lei de Registros Públicos, tratando do registro em sentido estrito, não se refere expressamente à propriedade? Mais além: não se diz que espécie de título permitiria o registro – por sinal, declarativo – de aquisição imobiliária por aluvião (arts. 530, II, 536, III, e 538 do CC). Isso não é nenhuma defectividade da normativa registral, mas próprio de um sistema processual lato sensu, que, por seu caráter fundamentalmente instrumentário, se proporciona mediante uma formulação de subsídio à realização do direito material. Negar que se possa registrar um título no ofício imobiliário porque não o prevê expressamente inscritível a regulativa específica ou lei extravagante é, em síntese, desprezar o caráter instrumental do registro e, no fim e ao cabo, denegar a realização de um direito que, recognoscível na ordem substantiva, não poderia já efetuar-se. Seria, guardadas as distinções, o mesmo que dizer que o locador tem direito a reaver o imóvel de um locatário inadimplente e negar-lhe toda possibilidade de manejar uma ação de despejo (DIP, Ricardo Henry Marques. São taxativos os atos registráveis? Revista de Direito Imobiliário, v.47, jul-ez. 1999).

[68] PAIVA, João Pedro Lamana. Revista de Direito Imobiliário, v. 49, jul.-dez. 2000.

[69] ERPEN, Décio Antonio; PAIVA, João Pedro Lamana. A autonomia registral e o princípio da concentração. Revista de Direito Imobiliário, v. 49, jul-dez. 2000. Disponível em <www.irib.org.br> Acesso em 15 set. 2008.

[70] TEIXIDÓ, Marta Valls; SATONJA, Mercedes Tormo. El Registro de la Propriedad y Mercantil como instrumento al servicio de la sostenibilidad. Expert córner report [on line], Colégio de Registradores da Espanha para a Agência Européia de Meio Ambiente. p. 33.

[71]Item 1, b, 19, do Capítulo XX das Normas de Serviço de São Paulo.

[72] CRETELLA JÚNIOR, José. Comentários à Constituição brasileira de 1988. Rio de Janeiro: Forense Universitária. 1989. v. 1, p. 129.

[73] DIP, Ricardo Henry Marques. São taxativos os atos registráveis? Revista de Direito Imobiliário. São Paulo, jul.-dez. 1999. v. 47.

. Disponível em <www.irib.org.br> Acesso em: 15 set. 2008.

[74]JACOMINO, SérgioBoletim Eletrônico do IRIB n. 509, de 29 jun. 2002. Disponível em: <www.irib.org.br> Acesso em: 15 set. 2008.

[75] Item 1, b, 19, do Capítulo XX das Normas de Serviço de São Paulo.

[76] Recurso Administrativo n° 100164S-9L2017.S.26.0037, 7 de julho de 2017, acesso em 14 de maio de 2018.

[77] É com base no princípio da concentração que a Egrégia CG do Rio Grande do Sul autorizou a averbação de florestas no Registro de Imóveis.

[78] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 1992. P. 505.

[79] MILARÉ, Edis. Os espaços territoriais especialmente protegidos aproximam-se dos espaços naturais sensíveis (Espaces naturels sensibles) do sistema francês (Cf. PRIEUS, Michel. Droit de l’environnment. 2. ed. Paris: Dalloz, 1991. p. 381).

[80] Op. cit., p. 233.

[81] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 29. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p.568.

[82] SILVA, José Afonso. Direito ambiental constitucional. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 160-161.

[83] SIMÉON, Jose. El Registro de la Propriedad y Mercantil como instrumento al servicio de la sostenibilidad cit., p. 57.

[84] É um lençol d’água subterrâneo que se encontra em pressão normal e que se formou em profundidade relativamente pequena.

[85] Registro de Imóveis. Dúvida. Recusa de registro de escritura pública de divisão de imóvel rural situado em área de proteção de mananciais. Necessidade de manifestação favorável da Secretaria do Meio Ambiente. Inteligência das Leis Estaduais 898/1975 e 1.172/1976. Sentença de procedência mantida. Recurso não provido.

[86] Conselho Superior da Magistratura de São Paulo, ApCív 849-0.

[87] Conselho Superior da Magistratura de São Paulo. APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.182-6/9,REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida procedente – Escritura pública de venda e compra de lote, em que se promove, também sua divisão em duas partes – Desdobro que deve ser aprovado pelo órgão ambiental estadual – Imóvel situado em área de proteção aos mananciais – Existência de aprovação da Prefeitura Municipal que não elide a necessidade de anuência do referido órgão estadual – Precedentes deste Conselho Superior e da Corregedoria Geral da Justiça – Recurso não provido. Des. REIS KUNTZ,Corregedor Geral da Justiça e Relator (D.J.E. de 03.12.2009)

[88] Fonte: http://www.cetesb.sp.gov.br/areas-contaminadas, acesso em 02 de setembro de 2014.

[89] http://cetesb.sp.gov.br/areas-contaminadas/wp-content/uploads/sites/17/2018/01/Totaliza%C3%A7%C3%A3o-por-Departamento.pdf, acesso em 19 de abril 2018.

[90] Revista IstoÉ , n. 1.822, de 08 set. 2004, p. 95.

[91] LEME MACHADO, Paulo Affonso. Direito Ambiental Brasileiro. 22ª edição. São Paulo: Malheiros editores, 2014, p. 714.

[92] Registro de Imóveis. Cadastramento de áreas contaminadas sob a responsabilidade da Cetesb, qualificado com presunção de veracidade e legalidade, própria dos atos da Administração Pública. Interesse público que envolve a referida matéria ambiental e que impõe amplitude de informação. Segurança jurídico-registral, estática e dinâmica, que reclama concentração da notícia de contaminação, oficialmente declarada, no fólio real. Integração do Registro Predial na esfera da tutela ambiental. Admissibilidade da publicidade registral de áreas contaminadas por substâncias tóxicas e perigosas, por averbação enunciativa de ‘declaração’ ou ‘termo’ emitido pela CETESB. Inteligência do art. 246 da Lei de Registros Públicos. Consulta conhecida, com resposta positiva.

[93] Alínea 39, item 11, subitem 39 a 41 das Normas de Serviço de São Paulo.

[94] 12.6.1. A averbação prevista na alínea 39 do item 11, b, deve conter a informação da contaminação identificada. 12.6.2. A averbação prevista na alínea 40 do item 11, b, deve conter a informação sobre os riscos identificados na Avaliação de Risco. 12.6.3. A averbação prevista na alínea 41 do item 11, b, deve indicar o conteúdo do Termo de Reabilitação para o Uso Declarado, com menção expressa ao uso para o qual a AR foi reabilitada, além da localização e tempo de vigência das medidas de controle institucional e de engenharia implantadas. 12.6.4 As averbações referidas nas alíneas 39, 40 e 41 do item 11, b,6 serão feitas de ofício pelo Oficial do Registro de Imóveis, sem cobrança de emolumentos, quando do primeiro registro e por meio do Serviço de Registro Eletrônico de Imóveis (SREI), assim que implantados os mecanismos de fluxo de informações entre a Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo (SMA), a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) e a Associação dos Registradores Imobiliários de São Paulo (Arisp), definidos no Acordo de Cooperação Técnica que entre si celebraram (Capítulo XX das Normas de Serviço de São Paulo).

[95] alínea 12.6, Cap. XX, das Normas de Serviço de São Paulo.

[96]  O Supremo Tribunal Federal por maioria, deu interpretação conforme ao art. 4º, IV, do Código Florestal, para fixar a interpretação de que os entornos das nascentes e dos olhos d’água intermitentes configuram área de preservação ambiental (ADC 42, julgamento de 28 de fevereiro de 2018).

[97]   votos, deu interpretação conforme ao art. 3º, VIII e IX, do Código Florestal, do Código Florestal, de modo a se condicionar a intervenção excepcional em APP, por interesse social ou utilidade pública, à inexistência de alternativa técnica e/ou locacional à atividade proposta.

[98] MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 709.

[99] http://www.cesp.com.br/portalCesp/portal.nsf/V03.02/Empresa_Usina3Irmaos_Dados?OpenDocument, acesso em 01 de agosto de 2012.

[100] O Registro de Imóveis, assim, deve exigir a prévia licença ambiental do órgão estadual em caso de atos registrários que estejam em referida área, isso porque a Resolução 237/97 do CONAMA, prevê no art. 5º que: Compete ao órgão ambiental estadual ou do Distrito Federal o licenciamento ambiental dos empreendimentos e atividades:  […] II – localizados ou desenvolvidos nas florestas e demais formas de vegetação natural de preservação permanente relacionadas no art. 2º da Lei 4.771, de 15 de setembro de 1965, e em todas as que assim forem consideradas por normas federais, estaduais ou municipais (Decisão CG 4.607/2007 da CG do Estado de São Paulo).

[101] § 8º do art. 16 do Código Florestal, redação dada pela MedProv 2.166-67/2001.

[102] O autor português Carlos Ferreira de Almeida qualifica “os registros públicos como os meios mais perfeitos e evoluídos da publicidade, igualando-os mesmo ao conceito técnico-jurídico de publicidade”. ALMEIDA, Carlos Ferreira de. Publicidade e teoria dos registros. Coimbra: Almedina, 1966. p. 163).

[103] Estão expressamente previstos no art. 225, § 1º, inciso III, da Constituição Federal e consistem em  “áreas geográficas públicas ou privadas (porção do território nacional) dotadas de atributos ambientais que requeiram sua sujeição, pela lei, a um regime jurídico de interesse público que implique sua relativa imodificabilidade e sua utilização sustentada, tendo em vista a preservação e proteção da integridade de amostras de todas as diversidades de ecossistemas, a proteção ao processo evolutivo das espécies, a preservação e proteção dos recursos naturais” (SILVA, José Afonso. Direito ambiental constitucional. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 160-161).

[104] Nesse sentido, importante relatar o Expert córner report publicado em 1º de outubro de 2002, denominado El Registro de la Propriedad y Mercantil como instrumento al servicio de la sostenibilidad, realizado pelo Colégio de Registradores da Espanha para a Agência Europeia de Meio Ambiente”; a obra Meio ambiente e o Registro de Imóveis elaborada em conjunto com registradores brasileiros e espanhóis. Coord. Sérgio Jacomino, Marcelo Augusto Santana de Melo e Francisco de Asis Palácios Criado. São Paulo. Ed. Saraiva: 2010. p. 29; III Foro Internacional sobre ordenação do território e desenvolvimento sustentável da agricultura, ocorrido em Lisboa, em 2009, na Pontifícia Universidade Católica; e mais recentemente, a Revista Registral Del Território do Colégio de Registradores de Catalunya, Barcelona, 07 de julho de 2011, na série Cadernos Ambientales de La propiedad, editada em fevereiro de 2012.

[105] MILARÉ, Edis. Direito do ambiente. 9ª edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 1.307.

[106] DINIZ, Maria Helena. Lei de introdução ao Código Civil brasileiro interpretada. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 66.

[107] DINIZ, Maria Helena. Ob. Cit, p. 66.

[108][108] MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 292.

[109] LAMANA PAIVA, João Pedro. Revista de direito imobiliário nº 49. Julho a dezembro, 2000, p. 46.

[110] É com base no princípio da concentração que a Egrégia CG do Rio Grande do Sul autorizou a averbação de florestas no Registro de Imóveis.

[111] MELO, MARCELO. Registro de Imóveis e Meio Ambiente. 1. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2010, p. 39.

[112] MILARÉ, Edis. Direito do ambiente. 9ª edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 1.313.

[113]  A Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de Minas Gerais entendeu ser facultativa a averbação da reserva legal, entendo não existir “amparo legal qualquer exigência de prévia averbação da reserva legal como condição para todo e qualquer registro” (Decisão proferida nos autos nº 59.512/2012, em 12 de novembro de 2012, pelo Corregedor-Geral da Justiça Des. Luiz Audebert Delage Filho). Importante também consignar o Acórdão passado nos autos da Apelação Cível nº 1.0702.09.566738-3/001, Relator De. Hilda Teixeira da Costa, publicado em 08 de fevereiro de 2013, com a seguinte ementa: “O novo Código Florestal, instituído pela Lei nº 12.651/2012, previu a obrigatoriedade do registro de todos os imóveis rurais no Cadastro Ambiental Rural e, consequentemente, a dispensa da inscrição no Cartório de Registro de Imóveis”. Referida decisão foi suspensa e posteriormente revista pelo Conselho Nacional de Justiça, entendendo se aplicar a legislação florestal anterior até a implantação do Cadastro Ambiental Rural – CAR (PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO 0002118-22.2013.2.00.0000). Paraná: No Estado do Paraná, face o novo Código Florestal, a Corregedoria-Geral da Justiça manteve a suspensão da exigibilidade da averbação, conforme decisão proferida nos autos nº 2010.222675-9/0, publicada no diário oficial do estado em 13/06/2012, pelo Des. Lauro Augusto Fabrício de Melo. Em Santa Catarina o Tribunal de Justiça através do Agravo de Instrumento nº 2011.079146-6, da comarca de Braço do Norte (2ª Vara Cível), através da Quarta Câmara de Direito Civil, Relator Des. Luiz Fernando Boller, decidiu que a “averbação no Registro de Imóveis agora é facultativo”, apesar de criticar fortemente a opção legislativa: in verbis: “Esse dispositivo vai ao revesso da eficiência e da segurança jurídica que se teria caso se mantivesse a obrigatoriedade de averbar a reserva. A sistemática registral no Brasil, a exemplo de outros ramos do direito, também é regida por princípios norteadores. Figura dentre eles um de grande importância, que tem o justo condão de trazer a eficiência e segurança, trata-se do princípio da concentração. O princípio da concentração consiste na convergência de todas as relevantes informações sobre o imóvel em um único lugar, que no caso seria a sua matrícula, o que facilitaria a vida dos usuários, uma vez que teriam como uma única certidão, o conhecimento preciso da situação jurídica da propriedade. Não nos olvidamos que os Registros Públicos visam justamente conceder essa publicidade e conhecimento geral da transcrição, portanto, é importante concentrar na matrícula todas as informações atinentes à propriedade”. Existe também no Estado a Comunicação nº 211/2012 do Fatma – Fundação do Meio Ambiente, entendendo ser obrigatória a averbação da reserva legal nos cartórios de Registro de Imóveis enquanto não implantado o cadastro ambiental rural. Em Goiás os atos de registro estavam condicionados à prévia reserva florestal legal, no entanto, através do Processo nº 4315456-4408781, a Corregedora-Geral da Justiça, NELMA BRANC0 FERREIRA PERILO, em 02 de abril de 2013, autorizou os cartórios de registro de imóveis a praticar atos de transmissão de domínio de imóveis rurais mediante a apresentação de cópia do protocolo do pedido de inscrição no Cadastro Ambiental Rural. A Corregedoria Geral da Justiça do Estado do Espírito Santo entendeu que os oficiais dos Registros de Imóveis deverão exigir a averbação da reserva legal para transmissão, desmembramento, retificação ou alteração de domínio que ainda não possui comprovante junto ao Cadastro Ambiental Rural (CAR), conforme Ofício Circular nº 63/2012, publicado no Diário da Justiça (DJ) de 29 de agosto de 2012. No Rio de Janeiro, em decorrência da alteração do artigo 18, § 4° da Lei 12.651/12 por intermédio da Lei 12.727/2012, a averbação da reserva legal, ainda que antes da implantação do Cadastro Ambiental Rural – CAR, tornou-se facultativa. Processo nº 2012.0221690. Corregedoria-Geral da Justiça do Rio de Janeiro. Publicada no diário oficial em 16 de abril de 2013. Sérgio Ricardo de Arruda Fernandes, Juiz Auxiliar da CGJ.

[114] Art. 29. (…)

§ 1.º A inscrição do imóvel rural no CAR deverá ser feita, preferencialmente, no órgão ambiental municipal ou estadual, que, nos termos do regulamento, exigirá do possuidor ou proprietário: (…)

III – identificação do imóvel por meio de planta e memorial descritivo, contendo a indicação das coordenadas geográficas com pelo menos um ponto de amarração do perímetro do imóvel, informando a localização dos remanescentes de vegetação nativa, das Áreas de Preservação Permanente, das Áreas de Uso Restrito, das áreas consolidadas e, caso existente, também da localização da Reserva Legal.

[115] Art. 53. Para o registro no CAR da Reserva Legal, nos imóveis a que se refere o inciso V do art. 3o, o proprietário ou possuidor apresentará os dados identificando a área proposta de Reserva Legal, cabendo aos órgãos competentes integrantes do Sisnama, ou instituição por ele habilitada, realizar a captação das respectivas coordenadas geográficas.

Parágrafo único. O registro da Reserva Legal nos imóveis a que se refere o inciso V do art. 3o é gratuito, devendo o poder público prestar apoio técnico e jurídico.

[116] Leciona Paulo Affonso Leme Machado que “na Constituição Federal de 1988 há uma manifesta opção pelo princípio do livre acesso à informação e pelo princípio da publicidade. É impossível proteger bem o que é de todos através do segredo. A proteção do meio ambiente só se torna efetiva em todo o Planeta quando dois direitos caminharem juntos: o direito à informação e o direito à participação” (LEME MACHADO, Paulo Affonso. Direito à Informação ambiental. São Paulo: Malheiros, 2006) 

[117] “O QUE É O CAR: O CADASTRO AMBIENTAL RURAL – CAR É UM REGISTRO ELETRÔNICO, OBRIGATÓRIO PARA TODOS OS IMÓVEIS RURAIS”, WWW.CAR.GOV.BR, ACESSO EM 05 DE NOVEMBRO DE 2014.

[118] Leciona Paulo Affonso Leme Machado que “na Constituição Federal de 1988 há uma manifesta opção pelo princípio do livre acesso à informação e pelo princípio da publicidade. É impossível proteger bem o que é de todos através do segredo. A proteção do meio ambiente só se torna efetiva em todo o Planeta quando dois direitos caminharem juntos: o direito à informação e o direito à participação” (LEME MACHADO, Paulo Affonso. Direito à Informação ambiental. São Paulo: Malheiros, 2006) 

[119] LEME MACHADO, Paulo Affonso. Direito Ambiental Brasileiro. 22ª edição. São Paulo: Malheiros editores, 2014, p. 916.

[120] Já havíamos alertado para a falha constante do projeto de lei que resultou na aprovação do Código Florestal de 2012,   http://www.irib.org.br/html/biblioteca/biblioteca-detalhe.php?obr=3984, acesso em 05 de setembro de 2014.

[121] Superior Tribunal de Justiça, Recurso Especial nº 218.781 (2002/0146843-9), j. 09.12.2009.

[122] Decisão proferida nos autos nº 44347/2012, em 04 de setembro de 2012, e Processo CG 2012/13790, em 25/10/2012.

[123] 125.2.1. Nas retificações de registro, a reserva legal florestal será identificada na planta e no memorial descritivo, acompanhados de declaração do profissional responsável de que corresponde à descrição inscrita no SICAR/CAR, e averbada gratuitamente na respectiva matrícula do bem imóvel.

125.2.2. A identificação da reserva legal florestal também poderá ser obtida eletronicamente por meio do site da SMA ou mediante certidão do órgão ambiental, constando da averbação, quando disponível na base de dados do SICAR/CAR, a informação se a reserva ou parte dela está em processo de regeneração.

125.3. A averbação referida na alínea d do item 125 será realizada mediante provocação de qualquer pessoa ou por iniciativa da Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo.

[124]  PROCESSO Nº 2013/100877 – SÃO PAULO – CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO DECISÃO: Parecer (441/2015-E), São Paulo, 02 de dezembro de 2015 (a) JOSÉ CARLOS GONÇALVES XAVIER DE AQUINO Corregedor Geral da Justiça.

[125] Capítulo XX, 125.1.4. O conceito de imóvel para fins de Cadastro Ambiental Rural (CAR/SICAR-SP), obedece ao disposto na Instrução Normativa 2, de 5 de maio de 2014, do Ministério de Meio Ambiente; e Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993, inciso I, art. 4º, não sendo obrigatória a coincidência e total identidade entre a matrícula imobiliária e o Cadastro Ambiental Rural (SICAR-SP).

[126] A decisão foi confirmada pela CGJSP em 25/10/2012 (Processo CG 2012/137903).

[127] De origem doutrinária, esse princípio foi emprestado dos direitos reais de garantia na referência à especialização da hipoteca e está ligado diretamente na necessidade de clareza que devem conter todos os atos que recebem publicidade registral. Afrânio de Carvalho afirma que “significa que toda inscrição deve recair sobre um objeto precisamente individuado” (CARVALHO, Afrânio. Registro de Imóveis. 2ֺ ed. Rio de Janeiro: Forense, 1977, p. 219).

[128] CSMSP, Apelação nº 1000891-63.2015.8.26.0362, da Comarca de Mogi-Guaçu, 28/06/2016.

[129] Disponível em http://www.irib.org.br/notas_noti/boletimel1282.asp#3, acessado em 08 de dezembro de 2009.

[130] Atos de registro. Condição. Impossibilidade. Decisão administrativa CG 421, de 16 de junho de 2000 – Jaboticabal. Registro de Imóveis. Reserva Florestal legal. Indeferimento de requerimento formulado pelo Ministério Público visando à edição de portaria condicionando o ingresso de ato translativo da propriedade imobiliária rural e de desmembramento de tais imóveis no registro imobiliário à averbação da reserva florestal legal. Indeferimento. Recurso não provido.

[131] REsp n.º 1.356.207/SP, rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, j. 28.4.2015

[132]  Apelação nº 1000891-63.2015.8.26.0362, da Comarca de Mogi-Guaçu, 28/06/2016: REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida registral – Sentença de usucapião – Não especialização da reserva legal no CAR – Mera inscrição no CAR sem identificação da reserva legal é insuficiente para desobrigar a averbação na serventia predial – A regra do art. 67 da Lei n.º 12.651/2012 não exclui a obrigação de localização da reserva legal – Suavização da obrigação de recuperação da área de reserva legal que não se confunde com a isenção afirmada pelos recorrentes/interessados – Desqualificação registral e sentença confirmadas – Recurso desprovido.

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[133] ORLANDI NETO, Narciso. Reservas florestais. Revista de Direito Imobiliário. São Paulo, jul.-dez. 1997. v. 42.

[134] ORLANDI NETO, Narciso. Reservas florestais. Revista de Direito Imobiliário. São Paulo, jul.-dez. 1997, v. 42.

[135] REGISTRO DE IMÓVEIS – Averbação – Reserva legal encravada no bem imóvel rural – Incompatibilidade entre as descrições constantes do título e da matrícula – Princípio da especialidade – Flexibilização – Especialização suficiente para a localização do espaço territorial ambientalmente protegido – Preponderância dos princípios da segurança jurídica e da publicidade – Função socioambiental do Registro de Imóveis – Desqualificação registrária afastada – Recurso provido.

[136] Recurso Administrativo n° 1014691-32.2016.8.26.0037, São Paulo, 28 de agosto de 2017. PEREIRA CALÇAS Corregedor Geral da Justiça

[138] Fazendeiros do interior paulista já tentam burlar a lei florestal. Folha de S. Paulo. Jornalista responsável: Claudio Angelo. Cadernos de ciência. Folha de S. Paulo, edição de 4 de julho de 2010, disponível em http://www1.folha.uol.com.br/ambiente/761644-fazendeiros-do-interior-paulista-ja-tentam-burlar-lei-florestal.shtml, acesso em 28 de junho de 2012.

[139] NOTA TÉCNICA CONJUNTA ARISP / SMA / CETESB. Ementa: Averbação da Reserva Legal, consoante previsão contida na Lei Federal nº 12.651/2012 e regulamento. A ASSOCIAÇÃO DOS REGISTRADORES IMOBILIÁRIOS DE SÃO PAULO (ARISP), a Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São Paulo – SMA e a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo – CETESB, em cumprimento ao Termo de Cooperação Técnica assinado em 07 de novembro de 2013, com a anuência da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo e considerando a publicação do Provimento CGJSP nº 09/2016, em 09 de março de 2016, resolve, em vista da necessidade de alguns esclarecimentos pontuais, emitir a presente nota técnica, a saber: O item 125.2.1 do Capítulo XX das Normas de Serviço dispõe que “Nas retificações de registro, bem como nas demais hipóteses previstas no item 125.2, o Oficial deverá, à vista do número de Inscrição no CAR/SICAR, verificar se foi feita a especialização da reserva legal florestal, qualificando negativamente o título em caso contrário. A reserva legal florestal será averbada, gratuitamente, na respectiva matrícula do bem imóvel, em momento posterior, quando homologada pela autoridade ambiental através do Sistema Paulista de Cadastro Ambiental Rural – SICAR-SP.”. Assim, existindo uma das hipóteses de modificação da figura geodésica dos imóveis como, por exemplo, retificações, desmembramentos, unificações, o Oficial de Registro de Imóveis deve exigir a inscrição no SICAR e analisar, diretamente através de acesso eletrônico (SIGAM – Consulta SiCAR-SP – Instituições Parceiras), se existe proposta de instituição ou de compensação da Reserva Legal inserida no cadastro. Existindo, promoverá a averbação se a inscrição tiver sido homologada pelo órgão competente. Não existindo proposta de Reserva Legal, o Oficial, excepcionalmente, deverá exigir do proprietário que declare a motivação da ausência de Reserva Legal. Se referida declaração motivar-se nas hipóteses de exceção definidas nos artigos 67[139] e 68[139] da Lei Federal nº 12.651/2012, o Oficial deverá qualificar o título positivamente. Em caso contrário, qualificará negativamente. Importante ressaltar que a normativa da Corregedoria Geral da Justiça não exige a apresentação de qualquer outro documento pelo Registro de Imóveis, de forma que a exigência de declaração de ausência da Reserva Legal é excepcional e encontra-se pautada nas exceções estabelecidas pelo novo Código Florestal. Por fim, cabe lembrar que as informações prestadas pelo proprietário serão analisadas pelo órgão competente, oportunamente, no âmbito do Cadastro Ambiental Rural. São Paulo, maio de 2016.

[140] No Estado de São Paulo o Programa de Regularização Ambiental – PRA está disciplinado pela Lei Estadual n. 15.684, de 14 de janeiro de 2015.

[141] Veja que no Estado de São Paulo existe previsão específica de inscrição do termo de compromisso de PRA no CAR: “Realizadas as adequações requeridas pelo proprietário ou possuidor, o termo de compromisso revisto deverá ser inscrito no SICAR” (§ 2º, art. 10, da Lei n. 15.684, de 14 de janeiro de 2015).

[142] Decisão Processo CG nº 2015/21.247, comarca de Guará, datada de 13 de abril de 2015, Parecer da Juíza Assessora Ana Luiza Villa Nova.

[143] PAPP, Leonardo. Comentários ao novo Código Florestal Brasileiro (Lei 12.651/12). Campinas: Millennium, 2012, p. 210.

[144] Sônia Letícia de Méllo Cardoso. MELO, MARCELO. Registro de Imóveis e Meio Ambiente. 1. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2010, p. 128.

[145] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 144.

[146] BECHARA, Erika. Novo Código Florestal. Coordenadores: Édis Milaré e Paulo Affonso Leme Machado. Revista dos Tribunais: São Paulo, 2013, p. 506.

[147] Unidade de conservação é o espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção (Art. 2º, inciso I, da Lei nº 9.985/2000)

[148] É preciso corrigir a falha técnico-registral contida na legislação já que a matrícula de imóvel não possui margem, o que ocorria antes da Lei nº 6.015/73 com as transcrições das transmissões.

[149] MELO, MARCELO. Registro de Imóveis e Meio Ambiente. 1. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2010, p. 39

[150] ORLANDI NETO, Narciso. Reservas florestais. Revista de Direito Imobiliário. São Paulo, jul.-dez. 1997. v. 42.

[151] REGISTRO DE IMÓVEIS – Averbação – Reserva legal encravada no bem imóvel rural – Incompatibilidade entre as descrições constantes do título e da matrícula – Princípio da especialidade – Flexibilização – Especialização suficiente para a localização do espaço territorial ambientalmente protegido – Preponderância dos princípios da segurança jurídica e da publicidade – Função socioambiental do Registro de Imóveis – Desqualificação registrária afastada – Recurso provido.

[152] Conselho Superior da Magistratura do Estado de São Paulo. Apel. Cível 29.175-0/0 – São Paulo, D.O.E. de 13.06.1996.

[153] MILARÉ, Edis. Direito do ambiente. 3ª edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 259.

[154] SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 30. ed. São Paulo: Malheiros, 2008.

 p. 823.

[155] LIBERAL, Jorge Requejo CONGRESSO DE REGISTRADORES DA ESPANHA. 3.  2006

[156] MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Cadastro Nacional de Florestas Públicas. Resolução 02. 9 jul. 2007.

[157] GUILHERME JOSÉ PURVIN DE FIGUEIREDO: “Conclui-se que, com o advento da nova ordem constitucional, já não há mais que se falar em águas particulares, não obstante não seja o indivíduo impedido de apropriar-se de parcela de água” (A propriedade no Direito Ambiental, p. 237, Tese de doutora da USP)

[158] PAULO AFFONSO LEME MACHADO: “A água é um dos elementos do meio ambiente. Isto faz com que se aplique à água o enunciado do caput da CF: Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo… Utilizando a locução ‘a água é um bem de domínio público, a Lei 9.433/97 abrange todo tipo de água, diante da generalidade empregada. Não especificando que a água a ser considerada, a água de superfície e água subterrânea, a água fluente e a água emergente passaram a ser de domínio público” (Direito Ambiental Brasileiro, Malheiros, p. 422/423).

[159] CRETELLA JÚNIOR, José.Vladimir Passos de Freitas, coordenador. Águas – Aspectos Jurídicos e Ambientais. Rio de Janeiro: Juruá, 2002, p. 45.

[160] RIBEIRO, José. Revista de Direito Imobiliário. Direito de propriedade sobre as águas e o registro de imóveis. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 156.

[161] AFONSO DA SILVA, José. Direito Ambiental Constitucional, 5ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 121).

[162] A própria Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo, no entanto, entendeu que o córrego não secciona o imóvel, tratando-se de acidente geográfico: “A inclusão do acidente geográfico na descrição imobiliária, não implicando em alteração de metragens, deformação da figura geométrica ou reposicionamento físico do prédio, pode ser deferida em retificação unilateral, desde que haja perfeito controle de especialidade” (Processo CG n. 260/96 – Comarca da Capital – 21/2/1996). Posteriormente, reconhecendo a força da doutrina e jurisprudência, manteve o mesmo entendimento até que a questão fosse pacificada nos tribunais: REGISTRO DE IMÓVEIS – Registro de loteamento – Exigência consistente em unificação dos imóveis a serem loteados, que são separados por um córrego, formulada com a concomitante indicação de que a unificação é impossível porque, por força do artigo 26, inciso I, da Constituição Federal todas as águas são de propriedade do Estado, excetuadas aquelas previstas no artigo 20, inciso III, da referida Constituição como sendo de propriedade da União – Procedimento destinado a afastar recusa manifestada para o registro do loteamento, com pedido de autorização para que o loteamento seja registrado em imóveis distintos, dispensada a fusão das matrículas – Dissensão que envolve prática de ato de registro em sentido estrito – Necessidade de impugnação por meio de dúvida (artigo 202 da Lei nº 6.015/73), com recurso cujo julgamento compete ao Colendo Conselho Superior da Magistratura – Procedimento, ademais, não instruído com o título apresentado para registro, o que impede seu processamento como dúvida – Inadequação que torna prejudicado o procedimento e implica no não conhecimento do recurso – Recurso não conhecido, com observações. CGJSP – PROCESSO: 102.503/2008 CGJSP –  PROCESSOLOCALIDADE:Jundiaí DATA JULGAMENTO:30/03/2009 DATA DJ:15/04/2009 Relator:Ruy Pereira Camilo.

[163] Bioma é uma unidade biológica ou espaço geográfico cujas características específicas são definidas pelo macroclima, solo, a altitude, dentre outros critérios, possuindo características biológicas próprias.

[164] Site da Fundação SOS Mata Atlântica: www.sosmatatlantica.org.br, acesso em 27/10/2016.

[165] LEME MACHADO, Paulo Affonso. Direito Ambiental Brasileiro. 22ª edição, 2014, p. 930.

[166] GAIO, Alexandre. Lei da Mata Atlântica Comentada. São Paulo: Almedina, 2014, p. 79.

[167] PARECER N. PGF/MS 01/2012 PROCESSO: 02001.003688/2011-66, subscrito pelo Procurador-Geral Federal MARCELO DE SIQUEIRA FREITAS, disponível em www.agu.gov.br/page/download/index/id/25049683, acesso em 01/11/2016.

[168] 2ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente. Apelação Cível nº 0002530-15-2010.8.26.0361, Mogi das Cruzes, Relator Paulo Alcides, São Paulo, 26 de novembro de 2015.

[169] pequeno produtor rural: aquele que, residindo na zona rural, detenha a posse de gleba rural não superior a 50 (cinqüenta) hectares, explorando-a mediante o trabalho pessoal e de sua família, admitida a ajuda eventual de terceiros, bem como as posses coletivas de terra considerando-se a fração individual não superior a 50 (cinqüenta) hectares, cuja renda bruta seja proveniente de atividades ou usos agrícolas, pecuários ou silviculturais ou do extrativismo rural em 80% (oitenta por cento) no mínimo (Art. 3º, I) 

[170] população tradicional: população vivendo em estreita relação com o ambiente natural, dependendo de seus recursos naturais para a sua reprodução sociocultural, por meio de atividades de baixo impacto ambiental (Art. 3º, II). 

[171] Art. 79. São bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente.

[172] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 1992. P. 505.

[173] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 18. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 144.

[174] Administrativo e processual civil. Embargos de divergência em recurso especial. Decreto n. 750⁄93. Preservação da mata atlântica. Limitação administrativa. Inexistência de esvaziamento do conteúdo econômico da propriedade. Precedentes de ambas as turmas e da própria seção de direito público do STJ.

1. A desapropriação indireta pressupõe três situações, quais sejam: (i) apossamento do bem pelo Estado sem prévia observância do devido processo legal; (ii) afetação do bem, ou seja, destina-lo à utilização pública; e (iii) irreversibilidade da situação fática a tornar ineficaz a tutela judicial específica.

2. A edição do Decreto Federal n. 750⁄93, que os embargantes reputam ter encerrado desapropriação indireta em sua propriedade, deveras, tão somente vedou o corte, a exploração e a supressão de vegetação primária ou em estados avançado e médio de regeneração da Mata Atlântica, sendo certo que eles mantiveram a posse do imóvel. Logo, o que se tem é mera limitação administrativa. Precedentes: REsp 922.786⁄SC, Relator Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, DJ de 18 de agosto de 2008; REsp 191.656⁄SP, Relator Ministro João Otávio de Noronha, Segunda Turma, DJ de 27 de fevereiro de 2009; e EREsp 901.319⁄SC, Relatora Ministra  Eliana Calmon, Primeira Seção, DJ de 3 de agosto de 2009. 3. As vedações contidas no Decreto Federal n. 750⁄93 não são capazes de esvaziar o conteúdo econômico da área ao ponto de ser decretada a sua perda econômica. 4. Recurso de embargos de divergência conhecido e não provido (EREsp 922.786⁄SC, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Seção, DJe 15⁄09⁄2009).

[175] PAIVA, João Pedro Lamana. Revista de Direito Imobiliário, v. 49, jul.-dez. 2000.

[176] Fitossociologia é o estudo das características, classificação, relações e distribuição de comunidades vegetais naturais. Os sistemas utilizados para classificar estas comunidades denominam-se sistemas fitossociológicos. A fitossociologia visa obter variáveis quantitativas sobre as vegetações do planeta (Moro & Martins, Marcelo Freire & Fernando Roberto (2011). Métodos de levantamento do componente arbóreo-arbustivo (Viçosa: Editora da Universidade Federal de Viçosa). p. 174-212)

[177] “Independentemente de ser ou não proprietário da propriedade rural, qualquer pessoa e, portanto, o Ministério Público e as associações poderão promover o registro e a averbação, incumbindo-lhes as despesas respectivas, e desde que ofereçam elementos fáticos e documentais” (LEMES MACHADO, Paulo Affonso. Direito Ambiental Brasileiro. 22ª edição, 2014, p. 723).

[178] DOE 28.07.2000 – Protocolado CG-8.505/2000 – Piracicaba – Juízo de Direito da 1ª Vara Cível.

Ementa: Registro de Imóveis. Recepção e arquivamento, pelo Oficial de Registro de Imóveis, de ofício expedido pelo Ministério Público com notícia da instauração de procedimento ou ação que versa sobre irregularidade no parcelamento do solo. Inclusão dessa informação nas certidões imobiliárias referentes aos registros correspondentes. Possibilidade. Medida que não se confunde com ato de averbação, nem impede a prática de atos de registro ou averbação nos registros atingidos.

[179] MELO, Marcelo Augusto Santana. Ob. Cit, Meio ambiente e o Registro de Imóveis elaborada em conjunto com  registradores brasileiros e espanhóis. Coord. Sérgio Jacomino, Marcelo Augusto Santana de Melo e Francisco de Asis Palácios Criado. São Paulo. Ed. Saraiva: 2010.

[180] RAMOS, Joaquín Delgado. La protección registral del medio ambiente. Cuadernos de Derecho Registral. Madrid: Colégio de Registradores de la Propiedad y Mercantiles de España, 2007. p. 102.

[181] – Lei Estadual nº 118, de 29 de junho de 1973 – Autoriza a Constituição de uma sociedade por ações, sob denominação de CETESB – Companhia de Tecnologia de Saneamento Básico e de Controle da Poluição das Águas, e dá providências correlatas:

“Art. 2º – A sociedade, na qualidade de órgão delegado ao Governo do Estado de São Paulo, no campo de controle de poluição das águas e de tecnologia de engenharia sanitária”. – Decreto nº 8.468, de 8 de setembro de 1976 – Aprova o Regulamento da Lei nº 997, de 31 de maio de 1976, que dispõe sobre a Prevenção e o Controle da Poluição do Meio Ambiente: “Art. 5º – Compete à Companhia Estadual de Tecnologia de Saneamento Básico e de Defesa do Meio Ambiente – CETESB, na qualidade de órgão delegado do Governo do Estado de São Paulo, a aplicação da Lei nº 997, de 31 de maio de 1976, deste Regulamento e das normas dele decorrentes”.

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Sobre bbraga

Atuo como professor de química, em colégios e cursinhos pré-vestibulares. Ministro aulas de Processos Químicos Industrial, Química Ambiental, Corrosão, Química Geral, Matemática e Física. Escolaridade; Pós Graduação, FUNESP. Licenciatura Plena em Química, UMC. Técnico em Química, Liceu Brás Cubas. Cursos Extracurriculares; Curso Rotativo de química, SENAI. Operador de Processo Químico, SENAI. Curso de Proteção Radiológica, SENAI. Busco ministrar aulas dinâmicas e interativas com a utilização de Experimentos, Tecnologias de informação e Comunicação estreitando cada vez mais a relação do aluno com o cotidiano.

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